terça-feira, 31 de março de 2009

A Assembléia de Westminster

Laurence M. Vance - O Outro Lado do Calvinismo
A Assembléia de Westminster
Após o Sínodo de Dort, a controvérsia sobre o Calvinismo mudou do Continente para a Inglaterra. E embora seja dos Cânones de Dort que obtemos os Cinco Pontos do Calvinismo, é uma confissão de fé inglesa que veio a ser considerada como “a afirmação mais sistematicamente completa do Calvinismo já imaginada.”[1] Que a Confissão de Fé de Westminster, composta pela Assembléia de Westminster (1643-1649), alcançou esta importância é um tributo ao triunfo temporário da Fé Reformada sobre o Anglicanismo. Devido à estreita relação entre a Igreja e o Estado que existia na época, a aceitação do Calvinismo na Inglaterra, culminando na Assembléia de Westminster, está profundamente entrelaçada com a história civil e religiosa da Inglaterra. E embora a Assembléia de Westminster esteja um tanto distante do início da Reforma Inglesa, as causas e intenções da Assembléia não podem ser propriamente entendidas sem recorrermos à Reforma.

A Reforma na Inglaterra prosseguiu de forma diferente da Reforma em qualquer lugar no Continente. Não tinha somente mais causas subjacentes, mas também progredia mais devagar, durou mais tempo, e sofreu mais mudanças do que qualquer movimento de reforma continental. Há muito mais à Reforma na Inglaterra do que a história familiar de como o rei Henrique VIII (1491-1547), porque ele queria o divórcio, separou a Igreja da Inglaterra de Roma e declarou-se o chefe da Igreja. É a história de como um país solidamente católico romano tornou-se a maior nação protestante sobre a face da terra. Mas diferente do Continente, onde os nomes de Lutero, Melanchthon, Calvino, e Zwínglio eram associados com a Reforma, a Reforma na Inglaterra está intimamente ligada ao desenvolvimento da Bíblia Inglesa.[2] Como a Reforma na Inglaterra é paralela ao período Tudor-Stuart da história inglesa, é necessário começar pelo início deste período.

O ano 1485 marca o início do reinado do primeiro Tudor, Henrique VII (1457-1509). Seu reinado começou como seus predecessores tinham começado, com a Inglaterra completamente sob a hegemonia da Igreja Católica Romana. Poucos anos antes, o rei Eduardo IV (1442-1483) dirigia-se ao papa como o “pai bendito,” o “Pai mais Santo,” e “sua Santidade.”[3] A Igreja possuía tremenda riqueza e terras enquanto preenchia o governo com seus bispos. Opiniões contrárias à doutrina estabelecida da Igreja Romana eram consideradas como heréticas e eram suprimidas pelo estado. As afirmações de John Wycliffe (c. 1320-1384), que considerava a Missa como “uma autêntica abominação da desolação no lugar santo,”[4] foram condenadas pela Assembléia de Canterbury em 1382.[5] O papa Inocente VIII (1432-1492), em uma Bula Papal em 1486, reconheceu Henrique VII como o novo governante da Inglaterra com as palavras: “Sua Santidade confirma, estabelece, e aprova o direito à coroa da Inglaterra do citado nosso soberano senhor Henrique VII.”[6]

A Bíblia oficial nesta época era a Vulgata Latina; a não oficial era a tradução inglesa de Wycliffe, completada em 1382. A atitude em relação à Bíblia em inglês pode ser vista pela infame Constituição adotada pelo Conselho Provincial em Oxford em 1408: “Nós, por essa razão, decretamos e ordenamos que ninguém, daqui em diante, por sua própria autoridade, traduza qualquer texto da Sagrada Escritura para o inglês ou outro língua, por meio de livro, panfleto ou tratado, e que nenhum livro, panfleto ou tratado deste tipo seja lido, seja os que já foram recentemente escritos no tempo do mencionado John Wyclif, ou desde então.”[7] Mas visto que a impressão não foi introduzida na Inglaterra até 1476, a circulação de qualquer Bíblia era muito limitada.

Quando Henrique VIII assumiu o trono da Inglaterra em 1509, ele foi um filho leal da Igreja Católica assim como foi seu pai. Os lolardos e outros “heréticos” ainda estavam sendo queimados na estaca. De fato, Andreas Ammonius (1477-1517), o secretário de Henrique VIII, escreveu de Londres em 1511 para Erasmo que “muitos heréticos fornecem um holocausto diário.”[8] Mas embora a Inglaterra era oficialmente católica, tudo não estava bem com o povo em matéria de religião. Havia controvérsias sobre investidura [Nota: ato ou cerimônia formal para conferir autoridade e símbolos de um alto cargo], praemunire [Nota: ofensa prevista na lei inglesa de apelar ou obedecer a uma corte ou autoridade estrangeira, assim desafiando a supremacia da Coroa], anata [Nota: os primeiros lucros do ano de um cargo eclesiástico honorífico, antigamente pago pelo clero ao papa], e bulas papais, mas isto não foi resultado de discórdia doutrinária. Da mesma forma, o estado da igreja era considerado como corrupto, não doutrinariamente, mas moralmente. O anti-clericalismo estava difundido. A diferença entre o reinado de Henrique VIII e seus predecessores era que agora a invenção da impressão e o renascimento da aprendizagem tinham se associado para produzir livros e panfletos contra a autoridade e a depravação de Roma.

Três diferentes obras tiveram um papel na Reforma inglesa antes do celebrado divórcio de Henrique. Primeiro foi o Novo Tetamento grego de Erasmo, publicado em 1516. Erasmo tinha anteriormente passado algum tempo na Inglaterra, assim, ainda que sua obra foi publicada no Continente, foi bem recebida na Inglaterra por muitos em Oxford e Cambridge.[9] Em segundo lugar, os escritos de Lutero foram logo levados para a Inglaterra e circularam largamente.[10] Entretanto, a resposta oficial a Lutero na Inglaterra foi queimar seus livros em público.[11] O livro de Lutero contra Roma, The Babylonian Captivity of the Church, foi respondida pelo próprio Henrique VIII em sua The Defence of the Seven Sacraments. Por isto Henrique recebeu do papa Leão X (1475-1521) o título “Defensor da Fé,” mas de Lutero o apelido “um asno coroado.”[12] Foi também durante este período que William Tyndale (1494-1536) deu ao mundo o primeiro Novo Testamento em inglês traduzido diretamente do grego. A resposta na Inglaterra à Bíblia de Tyndale foi a mesma que o próprio Tyndale sofreria mais tarde – ser queimado. Em dois manifestos em 1530, Henrique VIII tentou suprimir a obra de Tyndale. O primeiro proibia alguém de “pregar, ensinar ou informar qualquer coisa, aberta ou secretamente, ou compilar e escrever qualquer livro, ou presidir, treinar, ou manter quaisquer assembléias ou escolas, de qualquer maneira, contrária à fé católica.”[13] Até continha um índice de livros proibidos incluindo a recente tradução de Tyndale de partes do Velho Testamento.[14] Em seu segundo manifesto, Henrique insistia que “não é necessário que a citada Escritura esteja na língua inglesa e nas mãos do povo.”[15] Foi então proibido “comprar, receber, guardar ou ter o Novo Testamento ou o Velho na língua inglesa.”[16] Em 1535, Tyndale foi preso, julgado como herético, e condenado à morte. Antes de ser queimado, entretanto, ouviram-no clamar: “Senhor, abra os olhos do rei da Inglaterra.”[17]

Entretanto, Henrique VIII, sendo incapaz de obter o divórcio para se casar com Ana Bolena (1507-1536), teve seu casamento com Catarina de Aragão anulado e depois secretamente se casou com Ana em janeiro de 1533. O Ato de Supremacia em 1534 estabeleceu Henrique como “o único chefe supremo na terra da Igreja da Inglaterra.”[18] Dessa forma, o rompimento com Roma foi político e não doutrinário. E embora seja certamente verdadeiro que o papa Paulo III condenou Henrique e comandou, “sob pena de excomunhão,” que seus súditos “afastem-se total e inteiramente da obediência ao citado rei Henrique,”[19] e que Henrique dissolveu os monastérios porque eles continham “uma vida de pecado manifesto, corrupta, lasciva e abominável,”[20] a Igreja da Inglaterra era ainda católica na doutrina. Em 1536, Henrique formulou o que veio a ser chamado Os Dez Artigos. Esta confissão de fé para a igreja inglesa conserva as práticas católicas da regeneração batismal, da invocação de santos, e da transubstanciação.[21] Em 1539, Os Seis Artigos foram editados pelo rei. O primeiro destes artigos fortemente defendia a transubstanciação, a negação da qual resultava em “dores de morte pela fogueira.”[22] Assim, embora Henrique viveu e morreu católico em doutrina, o rompimento com Roma oficialmente sancionado abriu caminho para uma real reforma da Igreja da Inglaterra.

Após o esforço de Tyndale, várias outras Bíblias inglesas foram produzidas. Encorajado por Thomas Cromwell (1485-1540), Myles Coverdale (1488-1569) produziu a primeira tradução completa da Bíblia para a língua inglesa em 1535. Em junho de 1536, Cromwell escreveu a seus bispos determinando que eles “fizessem com que a Bíblia em inglês fosse colocada abertamente em suas próprias casas e que o mesmo fosse feito em cada paróquia.”[23] O companheiro de Coverdale, John Rogers (1500-1555), reuniu as obras completadas de Tyndale em uma Bíblia com a tradução de Coverdale para o restante do Velho Testamento. A obra inteira foi então levemente revisada e editada em 1537 sob o pseudônimo de Thomas Matthew. Como a Bíblia de Coverdale, a Bíblia de Matthew foi dedicada ao rei Henrique VIII. O arcebispo de Canterbury, Thomas Cranmer (1489-1556), solicitou a Cromwell que a Bíblia de Matthew fosse autorizada pelo rei para que ela “pudesse ser vendida e lida por qualquer pessoa, sem risco de qualquer decreto, proclamação, ou ordenação antigamente outorgado em contrário, até o tempo em que nós bispos anunciamos uma melhor tradução.”[24] A autorização foi dada, não somente para a Bíblia de Matthew, mas também para uma edição revisada da Bíblia de Coverdale. Assim, pelo final de 1537, havia duas Bíblias circulando na Inglaterra “propostas com a mais graciosa aprovação do rei.” A oração de William Tyndale foi respondida.

Em 1538, as Determinações Reais Secundárias de Henrique VIII foram escritas por Thomas Cromwell. A segunda destas determinações requeria “um livro da Bíblia toda, do mais largo volume, em inglês, e o mesmo colocado no alto de algum local conveniente dentro da citada igreja da qual você está encarregado.”[25] Coverdale foi recrutado para revisar tanto o texto quanto as notas da Bíblia de Matthew para proporcionar uma Bíblia para cumprir a determinação de Cromwell. Por causa de seu largo volume, a nova Bíblia, que apareceu em 1536, foi popularmente denominada a Grande Bíblia. A página do título, acreditada ser obra do famoso pintor Hans Holbein (1497-1543), mostra um corpulento Henrique VIII distribuindo cópias da Bíblia a Cranmer e Cromwell, que por sua vez distribuía a Bíblia ao povo. Em 1541, foi ordenado por Henrique que a Grande Bíblia “fosse fixada e colocada em um local elevado em todas as citadas paróquias.”[26] Entretanto, após 1541, nenhuma outra Bíblia inglesa foi impressa durante o reinado de Henrique VIII. Os anos finais do reinado de Henrique foi marcado por um retorno ao Catolicismo. Em 1546, o ano antes dele morrer, Henrique proclamou que “o Novo Testamento da tradução de Tyndale ou Coverdale” fosse proibido.[27] Mas logo depois, como que para interromper o retorno a Roma, Henrique morreu. Mas embora repudiava o papa, todavia ele mantinha a doutrina católica e perseguia “heréticos.” Seu legado permanente, os resultados dos quais ele nunca pretendeu, foi aprovar o uso da Bíblia inglesa nas igrejas e para o povo.

A morte de Henrique trouxe seu jovem filho Eduardo VI (1537-1553) ao trono. Eduardo foi decididamente a favor da Reforma e se opôs à “idolatria e superstição”[28] romana. Edward Seymour (1505-1552), seu tio protestante, foi proclamado Lorde Protetor. Durante o reinado de Eduardo os Seis Artigos de seu pai foram revogados, as dotações foram anuladas, e a comunhão foi permitida em ambas as espécies.[29] O casamento dos sacerdotes foi também legalizado.[30] Em uma determinação decretada logo após sua ascenção ao trono, instruiu que “um livro da Bíblia toda, do mais largo volume, em inglês” fosse “colocado no alto de algum local conveniente” na igreja onde o povo pudesse “dirigir-se ao mesmo e lê-lo.”[31] Em dois Atos de Uniformidade, o Livro da Oração Comum foi estabelecido.[32] Embora o primeiro Livro de Oração representou um certo compromisso entre Roma e os princípios da Reforma, a segunda edição de 1552 foi o documento mais protestante até então na história inglesa. Todavia, os presbiterianos mais tarde condenaram o livro como “um livro imperfeito, separado e escolhido daquele monte de estrume papista, o livro da Missa, repleto de todas as abominações.”[33] Durante o breve reinado de Eduardo, os Quarenta e Dois Artigos da Religião foram escritos por Cranmer e publicados no ano da morte de Eduardo.[34] Esta foi a primeira confissão de fé protestante na Inglaterra. As medidas de reforma que foram gradualmente acontecendo na Inglaterra chegaram a um fim com a morte prematura de Eduardo em 6 de julho de 1553. Ele tinha a melhor das intenções, e “meu Senhor e Deus, salve este reino do papismo, e o mantenha na verdadeira religião,” foi sua última oração na hora de sua morte.[35] Mas no começo do tempo de Eduardo, levantou um partido na Inglaterra que desejava uma reforma mais completa, embora não foi até mais tarde que eles foram chamados de puritanos.

A morte de Eduardo VI trouxe sua irmã Maria (1516-1558) ao trono. Sendo católica romana, suas concepções sobre a Bíblia eram diametralmente opostas às de seu irmão Eduardo. A primeira proclamação de Maria sobre religião proibia “todos e cada um de seus súditos” a pregar, ler, interpretar, ou ensinar “quaisquer Escrituras ou pontos de doutrinas de conduta relativos à religião.”[36] Isto foi seguido pelos decretos anulando aqueles estatutos sancionados sob os reinados de Eduardo e Henrique que eram contra a fé católica.[37] Após seu casamento com o católico zeloso Filipe II da Espanha, Maria proibiu por proclamação a leitura ou posse de quaisquer livros ou escritos de Lutero, Calvino, Coverdale, Tyndale e Cranmer, assim como o Livro da Oração Comum “ou qualquer outro livro semelhante” que contivesse “falsa doutrina contrária e contra a fé católica e a doutrina da Igreja Católica.”[38] A pena de morte foi ordenada aos infratores.[39] Depois que Maria restaurou vários estatutos contra heresia,[40] várias centenas se tornaram mártires incluindo Thomas Cranmer, John Rogers, e os bispos eduardianos Nicholas Ridley (c. 1500-1555) e Hugh Latimer (c. 1485-1555).[41] Foi Latimer que observou a Ridley na estaca: “Iremos neste dia, pela graça de Deus, acender uma vela na Inglaterra, que eu confio que nunca será apagada.”[42] Por sua crueldade, Maria “Sangrenta” foi considerada como “aquele horrível monstro Jezebel da Inglaterra” por John Knox.[43] O resultado desta perseguição foi que aproximadamente oitocentos protestantes deixaram a Inglaterra para o Continente.[44] Alguns destes “exilados marianos” se instalaram em Genebra, onde, sob orientação de William Whittingham (1524-1579), o Novo Testamento foi novamente traduzido para o inglês. Esta tradução é mais notável por suas notas fortemente anti-católicas como as de Ap 9.11 onde o papa é identificado como o “anticristo, rei dos hipócritas, e embaixador de Satanás.” Com a morte de Maria em 1558, o Velho Testamento do que veio a ser chamado a Bíblia de Genebra foi traduzido e a Bíblia concluída foi dedicada à nova rainha, Elizabete I.

O reino de Elizabete trouxe uma completa anulação das políticas opressivas em favor do Catolicismo e contra a Bíblia. Por um Ato de Supremacia, a autoridade do papa foi mais uma vez abolida, a comunhão sob duas espécies foi restaurada, e as leis de heresia revitalizadas por Maria foram revogadas.[45] Por um Ato de Uniformidade, o uso do Livro da Oração Comum foi reestabelecido.[46] Vários atos foram também aprovados durante o reinado de Elizabete contra os católicos romanos, incluindo a ordem dos jesuítas para “irem embora deste reino da Inglaterra.”[47] Em suas Determinações pela Religião, o comando familiar para “um livro da Bíblia toda, do mais largo volume, em inglês” a ser colocado no alto de algum lugar nas igrejas foi ressurgido.[48] Todas as “pessoas eclesiásticas” foram comandadas a “não impedir ninguém da leitura de qualquer parte da Bíblia,” porque ela é “a própria palavra viva de Deus.”[49] E ao invés de proibir opiniões contrárias à “fé católica e à doutrina da Igreja Católica” como fez sua irmã Maria, Elizabete ordenou que “ninguém, teimosa e obstinadamente, defenda ou mantenha quaisquer heresias, erros, ou falsa doutrina contrária à fé de Cristo e sua santa Escritura.”[50] Durante o reinado de Elizabete, o arcebispo Matthew Parker (1504-1575) organizou um grupo de bispos para revisar a Grande Bíblia. Chamada a Bíblia dos Bispos, a Convocação de Canterbury em 1571 decretou que “todo arcebispo e bispo tivesse em sua casa uma cópia da sagrada Bíblia do mais largo volume conforme recentemente impressa em Londres.”[51] Para opor ao fluxo de Bíblias protestantes, os papistas ingleses que deixaram a Inglaterra para o Continente editaram sua própria Bíblia inglesa. O Novo Testamento foi publicado em 1582 em Rheims, França, com um prefácio que afirmava que esta versão “seguia o grego com muito mais exatidão do que as traduções protestantes.”[52] O Velho Testamento foi traduzido em Douay mas não foi publicado até 1609-1610. Por isso, esta versão veio a ser chamada de Bíblia Douay-Rheims. Foi também durante o reinado de Elizabete que os Trinta e Nove Artigos da Igreja da Inglaterra foram formulados. Após aparecer em latim em 1563, eles foram revisados e publicados em inglês em 1571.[53] Por um decreto do parlamento em 1571, foi tornado obrigatório que todas as pessoas eclesiásticas assentissem aos Trinta e Nove Artigos.[54] Estes artigos permaneceram o credo doutrinário da Igreja da Inglaterra até o dia de hoje. Mas assim como durante o reinado de Eduardo VI, houve um partido que desejava uma reforma mais completa na Igreja da Inglaterra. Os puritanos (como eles eram agora chamados), liderados por Thomas Cartwright (1535-1603), um professor em Cambridge, objetou às práticas papistas no livro de orações e preferiu uma forma de governo eclesiástico presbiteriano ao invés de episcopal.[55] Quando o parlamento se reuniu em 1572, os puritanos publicaram An Admonition to the Parliament, na qual mais reformas foram buscadas.[56] Isto foi contrariado por John Whitgift (1544-1600) em sua Answer to a Certain Libel Entitled An Admonition to the Parliament, dessa forma intensificando o conflito entre os puritanos e a igreja estabelecida.[57] Assim, embora o reinado de Elizabete terminou o conflito externo com Roma, foi seguido pelo conflito interno entre a Prelatura e o Puritanismo.

Quando Elizabete morreu em 1604, o trono passou ao rei da Escócia, Tiago VI (1566-1625), que então se tornou Tiago I da Inglaterra. Diferente do que aconteceu na Inglaterra, a Reforma na Escócia avançou rapidamente. Através dos esforços de John Knox, o parlamento escocês em 1560 rejeitou a jurisdição do papa e adotou os trinta e cinco artigos da Confissão de Fé Escocesa.[58] Em 1567, quando o menino Tiago VI foi coroado rei, o Parlamento escocês oficialmente estabeleceu a igreja reformada.[59] Sob o sucessor de Knox, Andrew Melville (1545-1622), a forma de governo eclesiástico presbiteriano foi firmemente estabelecida.[60] Dessa forma, como na Inglaterra, por causa do censurável conceito Igreja-Estado, controvérsia desnecessária sucedeu entre os defensores do Episcopado e do Presbiterianismo. Quando Tiago deixou sua terra natal e foi para a Inglaterra, ele foi apresentado pelos puritanos com a Petição Milenar, assim chamada porque “eles, ao número de mais de mil ministros, vergaram sob o peso das cerimônias e ritos humanos, e lançaram-se aos pés desta majestade em busca de alívio.”[61] Isto deu origem à famosa Conferência da Corte de Hampton no ano seguinte, onde os puritanos, liderados pelo Dr. John Reynolds (1549-1607), foram permitidos relatar seu caso. Mas como o rei era averso ao Presbiterianismo, os puritanos foram ordenados que se conformassem.[62] Entretanto, há um resultado permanente desta conferência que ainda está conosco hoje. O rei Tiago concordou com a sugestão de John Reynolds de que “a Bíblia fosse novamente traduzida, visto que as existentes não correspondem ao original.”[63] E assim nasceu a King James Bible. A Inglaterra era agora firmemente protestante, mas a controvérsia puritana persistiu, e por causa de sua influência no Parlamento, houve conflito contínuo tanto no governo como na igreja.

Carlos I (1600-1649), filho do rei Tiago, veio ao trono com a morte de seu pai em 1625. Foi durante seu reinado que a Assembléia de Westminster foi convocada, embora ele estivesse empenhado em uma guerra civil com o Parlamento na época. O conflito com os puritanos que ele herdou intensificou conforme Carlos tentava governar sem o Parlamento e, através dos esforços determinados do arcebispo William Laud (1573-1645), impor o Episcopado.[64] E porque o Parlamento se tornou cada vez mais identificado com os puritanos, a Reforma na Inglaterra, que começou como uma disputa entre rei e papa, agora se tornou uma disputa entre rei e parlamento.[65] Em 1638, após Carlos ter tentado impor a liturgia anglicana na Igreja da Escócia, os escoceses se rebelaram e adotaram o “Pacto Nacional,” se empenhando contra as ações do rei que “perceptivelmente tendem ao restabelecimento da religião e tirania católica, e à subversão e ruína da verdadeira religião reformada, e de nossas liberdades, leis, e propriedades.”[66] A guerra seguiu, e em 1640 Carlos foi obrigado a convocar um Parlamento, o primeiro em doze anos, para financiar seu exército.[67] Mas como este “Breve Parlamento” (se reunindo menos de um mês) resistiu ao rei, ele foi forçado a convocar outro. Este “Grande Parlamento” (assim chamado porque foi reunido até 1660) não apenas travou uma guerra civil contra o rei, mas aboliu o episcopado, depôs dois mil ministros monarquistas, entrou na “Aliança e Pacto Solenes” com os escoceses contra o Prelatura, convocou a Assembléia de Westminster, executou o arcebispo Laud, e eventualmente executou o próprio rei em 1649.[68]

Há um fator importante na ascensão dos puritanos que até então não foi mencionado: o Calvinismo. Embora derivados do nome de Calvino tenham aparecido primeiro em inglês em 1566,[69] a influência de Calvino pode ser traçada ao reinado de Eduardo VI. Calvino tinha interesse pelos negócios ingleses. Ele escreveu cartas tanto ao jovem rei quanto ao protetor Somerset (c. 1506-1552), como também ao arcebispo Cranmer.[70] Cranmer até solicitou a Calvino para vir para a Inglaterra.[71] Calvino dedicou seu comentário sobre Primeiro Timóteo a Somerset e seu comentário sobre Isaías a Eduardo. John Knox era um dos capelães de Eduardo.[72] Durante o reinado de Eduardo, teólogos reformados do continente eram bem vindos na Inglaterra. Martin Bucer lecionava em Cambridge e passou seus últimos anos na Inglaterra.[73] Quando Maria se tornou rainha, os exilados ingleses que estabeleceram em Genebra e traduziram a Bíblia de Genebra certamente foram influenciados por Calvino. E durante o reinado de Elizabete, as Institutas de Calvino foram traduzidas para o inglês em 1561.[74] As Institutas foram usadas como um manual sobre teologia tanto em Oxford quanto em Cambridge.[75] Outras obras de Calvino foram também traduzidas para o inglês.[76] Calvino foi até requisitado para mandar um ministro à congregação francesa em Londres.[77] Os Trinta e Nove Artigos eram moderadamente calvinistas, rejeitando a Expiação Limitada. No final do século dezesseis, a Universidade de Cambridge se tornou um baluarte do Calvinismo. O professor de Cambridge William Perkins, que tem sido chamado “o maior dos teólogos puritanos do século dezesseis,”[78] foi um calvinista muito influente, e produziu escritos volumosos.[79] Seu julgamento por Arminius já foi mencionado. Nem todos em Cambridge, entretanto, aceitava o Calvinismo. O francês Peter Baro (1534-1599), professor de teologia de Margaret, se opôs a Perkins e defendia “o livre-arbítrio e a salvação possível a todos os homens.”[80] Os calvinistas alegam que ele foi “a primeira pessoa que ensinou o Arminianismo na Igreja da Inglaterra.”[81] Em 1595 uma controvérsia sobre o Calvinismo estourou em Cambridge e resultou na adoção de novo artigos calvinistas que doutrinavam como um Cânones de Dort inglês. Os Artigos de Lambeth (assim chamados porque eles foram aprovados por teólogos do Lambeth Palace, Londres), o texto completo do qual pode ser encontrado no apêndice 5,[82] nunca foram aprovados por Elizabete.[83] No final do período Tudor na história inglesa, os calvinistas deviam ser achados entre os clérigos e os puritanos. O Calvinismo inglês não era ainda equivalente ao Puritanismo.[84]

A controvérsia sobre o Calvinismo igualmente manifestou-se durante o reinado do primeiro rei Stuart. Na Hampton Court Conference, o Dr. John Reynolds pediu ao rei Tiago, mas inutilmente, que “as nove afirmações ortodoxas concluídas em Lambeth pudessem ser inseridas no Livro dos Artigos.”[85] O nome de Arminius se tornou conhecido na Inglaterra após o rei tomar parte em uma campanha contra Conrad Vorstius (1569-1622) como uma substituição a Arminius em Leiden. Sobre Arminius, a declaração do rei no caso Vorstius mencionava que “foi nossa miserável sorte não ouvir deste Arminius antes que ele estivesse morto.”[86] Já foi mencionado que o rei Tiago enviou representantes ao Sínodo de Dort. Ele era descendente do Calvinismo escocês mas acreditava que sua concepção da monarquia dependia da preservação do Episcopado.[87] E embora Tiago publicamente apoiava os calvinistas,[88] a questão da predestinação era para ele de importância secundária.[89] Dessa forma, os tradutores da King James Bible incluía tanto calvinistas como anti-calvinistas,[90] e Tiago instruiu os representantes ingleses em Dort a “mitigar o calor em ambos os lados,” e recomendar aos holandeses “não entregarem no púlpito às pessoas aquelas coisas no lugar de doutrinas ordinárias que são os pontos mais difíceis das escolas e não adequados à capacidade comum, mas disputáveis em ambos os lados.”[91] Os Cânones de Dort foram publicados em inglês em 1619,[92] mas quando a controvérsia calvinista se intensificou após o Sínodo de Dort, Tiago começou a favorecer os arminianos por causa da insistência dos calvinistas de que nenhum governante temporal poderia ser o chefe da Igreja.[93] Os pregadores foram instruídos por ordem do rei a não pregarem as doutrinas do Calvinismo:

Que nenhum pregador, de qualquer título sob o grau de bispo ou deão pelo menos, daqui em diante ouse pregar em qualquer auditório popular pontos profundos da Predestinação, Eleição, Reprovação, ou da Universalidade, Eficácia, Resistibilidade ou Irresistibilidade da Graça de Deus, mas, antes, deixe esses temas ser tratados por homens instruídos, e isso moderada e modestamente por uso e aplicação, antes que por doutrinas positivas, sendo mais adequado às escolas do que aos auditórios isolados.[94]

O rótulo arminiano era agora usado pelos puritanos para impugnar aqueles que rejeitavam o Calvinismo.[95] O Arminianismo (oposição ao Calvinismo) foi chamado de Pelagianismo.[96] Mas como de costume, alguns não concordam com o inventado debate calvinista-arminiano. O célebre anti-calvinista Richard Montagu (1577-1641) afirmou que “ele não era nem arminiano, nem calvinista, nem luterano, mas cristão.”[97] Embora os calvinistas podiam ainda ser encontrados tanto entre os puritanos como entre os anglicanos, uma notável mudança ocorreu durante o reinado de Carlos I. O Arminianismo foi redefinido como não apenas sendo em oposição ao Calvinismo, mas em oposição a “tudo o que os puritanos objetavam na Igreja.”[98] O arcebispo Laud promoveu membros da igreja que eram anti-calvinistas.[99] Em nome da “paz e tranquilidade”[100] da Igreja, Carlos proibiu que pregassem sobre a predestinação. Depois disso, devido em parte às obras de Montagu, o Calvinismo se tornou cada vez mais identificado com o Puritanismo.[101] Houve debates no Parlamento sobre o Calvinismo durante todo 1620-1630.[102] Foram os calvinistas, entretanto, que eventualmente prevaleceram. Dessa forma, o Longo Parlamento, em 1642, ordenou a impressão de um livro de John Owen (1616-1683) intitulado A Display of Arminianism, que atacava o Arminianismo e defendia a doutrina da Expiação Limitada.[103]

É dentro desta carregada atmosfera que a Assembléia de Westminster foi convocada. McNeil chama a Assembléia de “o último grande esforço para estabelecer um sistema calvinista na Inglaterra.”[104] Em 12 de junho de 1643, uma ordem de convocação para uma assembléia de teólogos foi emitida:

Uma Ordem dos Lordes e Comuns no Parlamento, para a convocação de uma Assembléia de Teólogos cultos e religiosos, e outros, para ser consultada pelo Parlamento, para a solidificação do Governo e da Liturgia da Igreja da Inglaterra, e para vindicar e inocentar a Doutrina da mencionada Igreja contra falsas calúnias e interpretações.[105]

Embora até mesmo os calvinistas admitem que muito do que tem sido escrito sobre os membros da Assembléia “tem sido mais do que um pouco hagiográfico em natureza,”[106] da Assembléia tem sido dito:

Um dos mais instruídos grupos já reunido nesta terra para a formulação e promulgação da verdade cristã.[107]

Um grupo mais zeloso, inteligente, e culto de teólogos raramente reunido na Cristandade.[108]

Impressiona a piedade e erudição incomuns que foram representados por aqueles que foram reunidos por Deus para esta Assembléia.[109]

Os membros da Assembléia de Westminster têm também sido comparados com os do Sínodo de Dort: “O mundo cristão, desde os dias dos apóstolos, nunca teve um Sínodo de mais excelentes teólogos (tomando uma coisa com outra), do que este e do que o Sínodo de Dort.”[110] Não há dúvida de que os representantes da Assembléia eram tanto piedosos quanto eruditos. A maioria deles possuia títulos de bacharel e mestre e servia em um cargo pastoral.[111] Cada membro da Assembléia fez o seguinte juramento:

Eu, _________, sinceramente prometo e juro, na presença do Deus Todo-Poderoso, que nesta Assembléia, da qual sou membro, não manterei nada a respeito de doutrina mas o que creio estar mais em conformidade com a Palavra de Deus; nem a respeito de disciplina, mas o que julgar tender mais para a glória de Deus, e para o bem e a paz de sua Igreja.[112]

E embora a Assembléia foi composta de um grupo diverso de homens, os calvinistas são rápidos em informar que “devemos lembrar que todos os teólogos de Westminster eram calvinistas.”[113]

A Assembléia de Westminster consistia de 151 membros: 121 teólogos ingleses, 10 membros da Câmara dos Lordes, e 20 da Câmara dos Comuns. Entre esses convidados estavam o arcebispo James Ussher (1581-1656) e o famoso erudito rabínico John Lightfoot (1602-1675). Ussher recusou seu convite, e outros, por várias razões, nunca apareceram também.[114] A freqüência média diária era aproximadamente a mesma da do primeiro dia: sessenta e nove.[115] O presidente da Assembléia era William Twisse (c. 1578-1646), que tinha anteriormente escrito uma resposta à crítica de Perkins de Arminius.[116] Um de seus assistentes era John White (1575-1648), o bisavô de John Wesley.[117] O grupo diverso de homens que compunha a Assembléia pertencia a quatro partidos, e pode ser distinguido pela forma de governo da igreja que preferia. Ainda que alguns membros da igreja anglicana foram convidados, todos eles, ou recusaram o convite ou caíram fora, exceto um que foi expulso.[118] Os presbiterianos estavam na maioria, visto que muitos dos puritanos favoreciam essa forma de governo.[119] O próximo partido era dos Independentes, que favorecia um governo eclesiástico congregacional e por isso estava em conflito com os presbiterianos.[120] Finalmente, havia os erastianos. Chamados assim por causa de Thomas Erastus (1524-1583), eles mantinham a autoridade do Estado sobre a Igreja. Embora muito pouco em número, eles tinham o apoio do Parlamento,[121] o que é evidenciado pelo fato de que foi o Parlamento que convocou a Assembléia em primeiro lugar. Estava ausente qualquer teólogo que não fosse ordenado na Igreja da Inglaterra, exceto dois pastores franceses reformados que serviam em Londres.[122] Depois que a Liga e Aliança Solenes foi adotada em setembro pelo Parlamento e pelos membros da Assembléia para “a reforma e defesa da religião, a honra e felicidade do Rei, e a paz e segurança dos três reinos da Escócia, Inglaterra, e Irlanda,”[123] uma delegação da Escócia composta de dois delegados e quatro teólogos se uniu à Assembléia.[124] Mas como o Sínodo de Dort, a presença de oficiais do governo em uma assembléia ostensivamente religiosa levanta algumas dúvidas sobre sua legitimidade.

O propósito da Assembléia de Westminster, de acordo com o decreto que a convocou, era “consultar e tomar conselhos de tais questões e assuntos, acerca dos textos, conforme serão propostos por ambas ou uma das Casas do Parlamento, e dar sua recomendação e conselho nesse ponto a ambas ou uma das citadas Casas, quando, e tão freqüentemente quanto, forem ali exigidos.”[125] Especificamente, o Parlamento buscou conselho “para ajuste do Governo e Liturgia da Igreja da Inglaterra.”[126] Como o Sínodo de Dort, as custas dos membros da Assembléia foram arcadas pelo Estado.[127] Em razão do censurável conceito Igreja-Estado ser claramente manifesto na história da Assembléia de Westminster, os calvinistas são forçados a admitir os resultados desta união:

A Assembléia foi produto do Parlamento, e nunca foi capaz de livrar-se da supervisão parlamentar.[128]

Nunca devemos, em qualquer consideração do trabalho da Assembléia, nos esquecer de que aquele grupo de pessoas era clara e completamente subserviente à autoridade política do Parlamento.[129]

Em termos mundados e políticos ela era responsiva, não ao Rei dos Reis, mas aos Lordes e Comuns do Parlamento Inglês.[130]

Robert Baillie (1602-1662), um dos teólogos escoceses na Assembléia, afirmou durante o tempo em questão: “Os senhores sabem que esta não é uma Assembléia adequada, mas uma reunião convocada pelo parlamento para aconselhá-los nas questões que são indagados.”[131] A Assembléia foi proibida de divulgar quaisquer dos resultados de suas deliberações sem a expressa permissão do Parlamento.[132] Assim, como Schaff conclui: “A principal falha da Assembléia era que ela se apegou à idéia de uma Igreja-Estado nacional, com um sistema uniforme de doutrina, adoração e disciplina, ao qual todo homem, mulher e criança nos três reinos deviam conformar-se.”[133]

Apesar do rei ter proibido a reunião da Assembléia, mesmo assim ela foi formada em 1º de julho de 1643, na Abadia de Westminster (daí o nome) e encerrada em 22 de fevereiro de 1649, após contadas 1163 sessões.[134] Certamente é irônico que a Guerra dos Trinta Anos começou com o Sínodo de Dort e terminou com a Assembléia de Westminster. A Assembléia continuou como uma delegação para exame de ministros até 1652.[135] Depois que os Teólogos de Westminster foram divididos em delegações, sessões diárias foram realizadas de nove às duas com reuniões da delegação nas tardes, embora esta programação posteriormente foi reduzida para sessões semanais apenas.[136] A primeira tarefa seguida pela Assembléia foi uma modificação dos Trinta e Nove Artigos da Igreja da Inglaterra para torná-los mais calvinistas.[137] Mas após encerrar a revisão dos primeiros quinze artigos, a Liga e Aliança Solenes foi adotada e o foco da Assembléia mudou para trazer “as Igrejas de Deus nos três reinos à mais próxima união e uniformidade na religião, Confissão de Fé, Forma de Governo Eclesiástico, Diretório para Adoração e Catequização.”[138] Conseqüentemente, o restante da Assembléia foi ocupada com a preparação das assim chamadas “quatro partes de uniformidade.”[139]

De outubro de 1643 a abril de 1645, por ordem do Parlamento, a Assembléia trabalhou em documentos relativos ao governo e adoração da igreja:

A partir de séria consideração do presente estado e conjuntura dos negócios deste reino, os Lordes e Comuns reunidos no Parlamento resolvem, que a Assembléia de Teólogos e outros imediatamente deliberam e discutam entre si, da disciplina e governo que possa estar mais em conformidade com a Santa Palavra de Deus, e mais apto a obter e preservar a paz da Igreja em nosso país, e acordo mais próximo com a Igreja da Escócia, e outras Igrejas Reformadas no exterior, a ser estabelecido na Igreja em lugar do presente governo eclesiástico de arcebispos, bispos, seus chanceleres, delegados, deãos, deãos e cabidos de cônegos, arquidiáconos e outros ministros eclesiásticos, dependendo da hierarquia, que é resolvido ser eliminado; e concernente ao Diretório de Adoração, ou Liturgia, daqui em diante será na Igreja: e proferirá suas opiniões e conselhos das e sobre as mesmas a ambas ou uma das Casas do Parlamento com toda a rapidez conveniente que puderem.[140]

Depois que isto foi feito, a Assembléia prosseguiu com uma confissão de fé. Embora o trabalho preliminar em uma confissão começou em 1644, não foi até 1645 que o Parlamento ordenou que a Assembléia preparasse uma confissão de fé.[141] Isto ocupou a Assembléia até dezembro de 1646. Trabalho em um catecismo foi iniciado em setembro de 1646, mas iniciando em janeiro de 1647, foi decidido que “duas formas de catecismo podem ser preparadas, uma mais minuciosa e abrangente, outra mais fácil e breve por causa dos novos iniciantes.”[142] Por essa razão, o restante do tempo foi gasto na formulação de dois catecismos, dessa forma completando as “quatro partes de uniformidade.”

Antes da Assembléia de Westminster haver terminado, um sistema de governo eclesiástico presbiteriano foi estabelecido na Inglaterra. Dessa forma, uma tentativa foi feita para forçar a uniformidade absoluta na religião por toda Inglaterra – exatamente como os anglicanos tinham feito – mas foi de curta duração. Porque era produto do Parlamento, qualquer mudança naquele grupo estava sujeito a afetar a Assembléia. Dessa forma, quando o exército, que agora era controlado pelos Independentes, obteve o poder, a importância da Assembléia decresceu junto com o próprio Parlamento. O resultado do conflito entre o Parlamento e o exército foi a purgação do Parlamento (chamada a Purgação do Orgulho [Pride], por causa do Cel. Thomas Pride [m. 1658]), em dezembro de 1648, dos presbiterianos.[143] Após esta substancial redução do Parlamento (demoninado Rump Parliament), o rei foi executado e a Inglaterra foi declarada um estado democrático, assim tendo início o Interregno (o período entre reinos). Em 1653 o próprio Rump Parliament foi despedido e Oliver Cromwell (1599-1658) assumiu o poder como Lorde Protetor. Durante o Protetorado de Cromwell, a tolerância religiosa foi extendida a todos os protestantes (com exceção dos anglicanos).[144] Muitos batistas estavam até mesmo em seu exército.[145] Apos a morte de Cromwell, e a derrota de seu filho Ricardo (1626-1712), que o sucedeu, o Protetorado abriu caminho para o reconvocado Rump Parliament. Em 1660, a monarquia foi restaurada na pessoa de Carlos II (1630-1685). Entretanto, com a monarquia veio a restauração do Episcopado e o repúdio ao Presbiterianismo e ao Puritanismo. Mas embora o Episcopado permanece até hoje a igreja estabelecida na Inglaterra, a Assembléia de Westminster ainda subsiste. Trezentos e cinquenta anos após a convocação da Assembléia, em 1993, calvinistas (principalmente da América) se reuniram na Abadia de Westminster para comemorar a Assembléia e realizar uma conferência realçando sua história e importância.[146] Os produtos literários da Assembléia, entretanto, têm sido continuamente usados pelos calvinistas desde seu início.

[1] M. Howard Rienstra, “The History and Development of Calvinism in Scotland and England,” em Bratt, ed., The Rise and Development of Calvinism, p. 110.
[2] Para uma leitura mais detalhada sobre o desenvolvimento da Bíblia Inglesa veja do autor A Brief History of English Bible Translations.
[3] A. R. Myers, ed. English Historical Documents (1327-1515), vol. 4 do English Historical Documents, ed. David C. Douglas (New York: Oxford University Press, 1969), p. 696.
[4] John Wycliffe, citado em J. H. Merle d’Aubigne, The Reformation in England, ed. S. M. Houghton, trad. H. White (Edinburgh: Banner of Truth Trust, 1962), vol. 1, p. 92.
[5] Henry Gee e William John Hardy, eds. Documents Illustrative of English Church History (Londres: Macmillan and Co., 1910), p. 108.
[6] Paul L. Hughes e James F. Larkin, eds., Tudor Royal Proclamations, Vol. I: The Early Tudors (1485-1553) (New Have e Londres: Yale University Press, 1964), p. 6.
[7] Alfred W. Pollard, ed., Records of the English Bible (Londres: Oxford University Press, 1911), p. 1.
[8] Andréas Ammonius, citado em H. Maynard Smith, Pre-Reformation England (New York: Russell & Russell, 1963), p. 289.
[9] d'Aubigne, Reformation in England, vol. 1, pp. 157-158.
[10] Ibid., p. 177.
[11] G. R. Elton, Reform and Reformation, England 1509-1598 (Cambridge: Harvard University Press, 1977), p. 75.
[12] Newman, vol. 2, p. 66.
[13] Hughes e Larkin, vol. 1, p. 183.
[14] Ibid., p. 185.
[15] Ibid., p. 196.
[16] Ibid.
[17] William Tyndale, citado em David Daniell, William Tyndale: A Biography (New Haven & Londres: Yale University Press, 1994), p. 383.
[18] G. R. Elton, ed., The Tudor Constitution: Documents and Commentary (Cambridge: Cambridge University Press, 1960), p. 335.
[19] Henry Bettenson, ed., Documents of the Christian Church, 2a ed. (Londres: Oxford University Press, 1963), p. 229.
[20] Gee e Hardy, p. 257.
[21] Lindsay, vol. 2, pp. 333-334.
[22] Gee e Hardy, p. 307.
[23] C. H. Williams, ed., English Historical Documents (1485-1558), vol. 5 de English Historical Documents, ed. David C. Douglas (New York: Oxford University Press, 1971), p. 824.
[24] Thomas Cranmer, citado em C. H. Williams, p. 825.
[25] Gee e Hardy, p. 275.
[26] Hughes e Larkin, vol. 1, p. 297.
[27] Ibid., p. 374.
[28] Ibid., p. 393.
[29] Thompson, p. 594.
[30] Gee e Hardy, p. 366.
[31] Hughes e Larkin, vol. 1, p. 395.
[32] Gee e Hardy, pp. 358, 369.
[33] Citado em E. N. Williams, A Documentary History of England, Vol. 2: (1559-1931) (Baltimore: Penguin Books, 1965), p. 20.
[34] Schaff, Creeds, vol. 1, p. 614.
[35] Eduardo VI, citado em Thompson, p. 609.
[36] Paul L. Hughes e James F. Larkin, eds., Tudor Royal Proclamations, Vol. II: The Later Tudors (1553-1587) (New Haven e Londres: Yale University Press, 1969), p. 6.
[37] C. H. Williams, pp. 860, 862.
[38] Hughes e Larkin, vol. 2, p. 59.
[39] Ibid., p. 91.
[40] Gee e Hardy, p. 384.
[41] Thompson, p. 617.
[42] Hugh Latimer, citado em Thompson, p. 617.
[43] John Knox, The First Blast of the Trumpet Against the Monstruous Regiment of Women (Dallas: Presbyterian Heritage Publications, 1993), p. 87.
[44] Charles D. Cremeans, The Reception of Calvinistic Thought in England (Urbana: University of Illinois Press, 1949), p. 35.
[45] Gee e Hardy, p. 442.
[46] Ibid., p. 458.
[47] Elton, The Tudor Constitution, p. 424.
[48] Hughes e Larkin, vol. 2, p. 119.
[49] Ibid.
[50] Ibid., p. 126.
[51] Citado em Brooke F. Westcott, A General View of the History of the English Bible, 3a ed. rev. William A. Wright (Londres: Macmillan and Co., 1905), p. 101.
[52] Polland, p. 303.
[53] Schaff, Creeds, vol. 1, p. 616.
[54] Gee e Hardy, p. 477.
[55] Everett H. Emerson, English Puritanism from John Hooper to John Milton (Durham: Duke University Press, 1968), p. 15.
[56] Ibid., p. 17.
[57] William Haller, Elizabeth I and the Puritans (Charlottesville: The University Press of Virginia, 1972), p. 31.
[58] Douglas Kelly, Liberty, p. 57.
[59] Ibid., p. 63.
[60] James H. Smylie, A Brief History of the Presbyterians (Louisville: Geneva Press, 1996), p. 31.
[61] Citado em William M. Hetherington, History of the Westminster Assembly of Divines, 3a ed. (Edmonton: Still Waters Revival Books, 1993), p. 61.
[62] Emerson, p. 31.
[63] John Reynolds, citado em Schaff, Creeds, vol. 1, p. 709.
[64] Schaff, Creeds, vol. 1, pp. 710-712.
[65] Benjamin B. Warfield, The Westminster Assembly and its Work (Edmonton: Still Waters Revival Book, 1991), pp. 4-5.
[66] Citado em Schaff, Creeds, vol. 1, pp. 687-688.
[67] Douglas Kelly, Liberty, p. 67.
[68] Schaff, Creeds, vol. 1, pp. 689, 718-719.
[69] McNeil, p. 309.
[70] Calvino, Letters, pp. 87, 113, 119, 125, 130, 138, 140, 145, 147.
[71] Cremeans, p. 28.
[72] Schaff, Creeds, vol. 1, p. 602.
[73] McNeil, p. 311.
[74] Ibid., p. 314.
[75] Schaff, Creeds, vol. 1, p. 603.
[76] R. T. Kendall, Calvin and English Calvinism (Oxford: Oxford University Press, 1979), p. 52.
[77] McNeil, p. 313.
[78] Horton Davies, Worship and Theology in England, Vol. 1: From Cranmer to Hooker (Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1996), p. 424.
[79] Kendall, pp. 52-53.
[80] Curtiss, p. 132.
[81] Cunningham, Reformers, p. 426.
[82] Schaff, Creeds, vol. 3, pp. 523-524.
[83] Ibid., vol. 1, p. 661.
[84] Patrick Collinson, “England and International Calvinism, 1558-1640,” em Menna Prestwich, International Calvinism (Oxford: Oxford University Press, 1985), pp. 213, 220.
[85] John Reynolds, citado em Schaff, Creeds, vol. 1, p. 661.
[86] Citado em Harrison, Beginnings of Arminianism, p. 181.
[87] Emerson, p. 31.
[88] Kenneth Fincham e Peter Lake, “The Ecclesiastical Policies of James I and Charles I,” em Kenneth Fincham, ed., The Early Stuart Church, 1603-1642 (Stanford: Stanford University Press, 1993), p. 32.
[89] Peter White, “The via media in the early Stuart Church,” em Fincham, ed., The Early Stuart Church, 1603-1642, pp. 218, 225; Fincham e Lake, p. 31-32.
[90] Fincham e Lake, p. 32.
[91] Citado em Schaff, Creeds, vol. 1, p. 513.
[92] Tyacke, Anti-Calvinists, p. 102.
[93] Neve, vol. 2, p. 29.
[94] Citado em Harrison, Arminianism, p. 133.
[95] Harrison, Arminianism, p. 128; Collinson, pp. 218, 220; Tyacke, Anti-Calvinists, p. 127.
[96] Harrison, Arminianism, p. 133.
[97] Robert Montagu, citado em Harrison, Arminianism, p. 131.
[98] Emerson, p. 37.
[99] Neve, vol. 2, p. 30.
[100] Citado em Nicholas Tyacke, “Archibishop Laud,” em Fincham, ed., The Early Stuart Church, 1603-1642, p. 65.
[101] Tyacke, Anti-Calvinists, pp. 47, 49, 57, 126, 137, 138, 167, 186.
[102] Ibid., pp. 127-139.
[103] John Owen, The Death of Christ, volume 10 de The Works of John Owen, ed. William H. Goold (Edinburgh: The Banner of Truth Trust, 1967), pp. 1, 4.
[104] McNeil, p. 322.
[105] Citado em Hetherington, p. 97.
[106] John R. de Witt, “The Form of Church Government,” em John L. Carson e David W. Hall, eds., To Glorify and Enjoy God: A Commemoration of the 350th Anniversary of the Westminster Assembly (Edinburgh: The Banner of Truth Trust, 1994), p. 150.
[107] Clark, Presbyterians, p. xi.
[108] Schaff, Creeds, vol. 1, p. 730.
[109] William S. Barker, “The Men and Parties of the Assembly,” em Carson e Hall, eds., To Glorify and Enjoy God: A Commemoration of the 350th Anniversary of the Westminster Assembly, p. 52.
[110] Richard Baxter, citado em Schaff, Creeds, vol. 1, p. 729.
[111] Samuel T. Logan, “The Context and Work of the Assembly,” em Carson e Hall, eds., To Glorify and Enjoy God: A Commemoration of the 350th Anniversary of the Westminster Assembly, p. 34.
[112] Citado em Hetherington, p. 117.
[113] Barker, p. 52.
[114] Schaff, Creeds, vol. 1, p. 733.
[115] Warfield, Westminster Assembly, p. 17.
[116] Works of Arminius, vol. 1, p. 649.
[117] Sell, p. 63.
[118] Schaff, Creeds, vol. 1, p. 733.
[119] Hetherington, p. 136.
[120] Schaff, Creeds, vol. 1, pp. 737-738.
[121] Ibid., p. 739.
[122] Ibid., p. 736.
[123] Citado em Hetherington, p. 129.
[124] Schaff, Creeds, vol. 1, pp. 745-747.
[125] Citado em Hetherington, p. 97.
[126] Ibid.
[127] Hetherington, p. 98.
[128] McNeil, p. 324.
[129] Logan, p. 36.
[130] de Witt, Church Government, p. 148.
[131] Citado em de Witt, Church Government, p. 147.
[132] Logan, p. 35.
[133] Schaff, Creeds, vol. 1, p. 730.
[134] Warfield, Westminster Assembly, pp. 3, 17.
[135] Ibid., p. 3.
[136] Logan, p. 37.
[137] Schaff, Creeds, vol. 1, p. 754.
[138] Citado em Hetherington, p. 130.
[139] Warfield, Westminster Assembly, p. 36.
[140] Citado em Hetherington, p. 158.
[141] Warfield, Westminster Assembly, pp. 82-86.
[142] Citado em Warfield, Westminster Assembly, p. 63.
[143] Hetherington, p. 310.
[144] Henry O. Wakeman, An Introduction to the History of the Church of England, 7th ed. (Londres: Rivingtons, 1912), p. 377.
[145] William L. Lumpkin, Baptist Confessions of Faith, ed. rev. (Valley Forge: Judson Press, 1969), p. 150.
[146] Para os detalhes veja o prefácio e introdução a Carson e Hall, eds., To Glorify and Enjoy God: A Commemoration of the 350th Anniversary of the Westminster Assembly.

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