quinta-feira, 29 de março de 2012

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Por que o movimento evangélico naufragou?




Quando o RMS Titanic esbarrou seu casco no Iceberg o seu capitão já vislumbrava o tamanho da tragédia, embora, possivelmente, não conseguisse admiti-la conscientemente, graças à imensa e positiva expectativa daquele empreendimento – o Titanic era um navio “inaufragável”!


Muitos barcos navegam hoje pelo mar religioso sob a bandeira cristã, desde o Catolicismo Romano, até Testemunhas de Jeová, passando pelas igrejas Protestantes, Ortodoxas e tantas outras menores independentes. Todos eles possuem seu valor histórico institucional e se dispõem a ser a resposta para a identidade coletiva proposta pelo fundador do cristianismo.


De fato muitos alegam que Cristo não tenha fundado o cristianismo. Porém ao confrontar as lideranças judaicas de sua época, e ao reunir grupos separadamente daqueles que vinham às sinagogas e templo, Jesus começou a fazer aquilo que de seus próprios lábios ficou chamando “edificar sua igreja”. Sua vida, morte e ressurreição foi uma mudança radical naquilo que se conhecia como judaísmo. Uma nova religião estava fundada – quer gostemos da ideia ou não, quer gostemos do termo ou não.


Passaram-se quase dois milênios até que desse projeto original surgisse aquilo que hoje, no Brasil, chamamos de evangélico (do qual já cheguei alguma vez a fazer parte).


A exemplo da tragédia do Titanic pode-se hoje vislumbrar o rasgo no casco do movimento. No fundo muitos já deram seu jeito de deixar o navio (que foi o conselho sábio de Tuco). Até mesmo quem já esteve no comando em nível nacional da coisa, já pulou fora. A tragédia é inevitável, muitos passageiros a bordo só não conseguem admiti-la conscientemente, graças à imensa e positiva expectativa.


Nessa expetativa fundou-se a Aliança Cristã Evangélica Brasileira. Assim preserva-se aquilo que se teve de original no movimento, como uma ou outra atualização:

  1. insistirem que a Bíblia é inerrante;
  2. acreditarem que foi Deus que criou o mundo e não a evolução;
  3. afirmarem que o casamento é entre um homem e uma mulher;
  4. declararem que só Jesus Cristo salva e que o Cristianismo é a única religião verdadeira;
  5. acreditarem na necessidade da Igreja;
  6. se recusarem a negar qualquer das posições acima.

Assim como outros barcos nesse oceano o Evangelicalismo preserva através da Aliança seu valor histórico cultural. Assim como outros barcos eles navegam como barcos fantasmas ancorados em seu passado institucional. Mas será essa a proposta de vanguarda para quem quer ir mais além?


Pode-se vislumbrar na linha do horizonte algo novo. O que seria esse novo?


O novo paradigma que vem substituindo o velho pode ser intuído, e extraído, da voz de Ricardo Gondim, pastor que até então foi a cara mais representativa do movimento frente à opinião pública, e que recentemente chegou a seu próprio tempo de partir e deixar o arraial. Para Gondim:

  1. O Evangelicalismo está condenado a ser um negócio, uma empresa, vendida às regras capitalistas e do Marketing – Em contraponto a igreja tem o chamado para ser simplesmente uma comunidade fraterna de fé.
  2. O Evangelicalismo está condenado a fomentar o jogo de poder e político tanto interna como externamente – Em contraponto a igreja deve ser a voz profética que não só condena como vive o oposto desse jogo.
  3. O Evangelicalismo é então denunciado por outros setores da sociedade, religiosos ou seculares, por seu charlatanismo e truques de manipulação em nome de Deus – Em contraponto a igreja deveria em nome de Deus ser a agência que promove a justiça, a alegria e a paz.
  4. O Evangelicalismo (fundado originalmente no ultra calvinismo) assume valores deterministas e mutilam as infinitas perspectivas de compreensão da vida, apresentando uma suposta “cosmovisão” pronta e acabada. O tom apologético assume cores inquisitórias – Em contraponto a igreja deve ser o lugar onde a liberdade oxigena os diálogos, os pensamentos, as mentes os espíritos.

O movimento evangélico naufraga por ser um negócio econômico, por seduzir e ser seduzido pelo poder político, por ser objeto de ridículo ao manipular o povo e por colocar viseiras no rebanho. (Não importa se o nome “evangélico” foi sequestrado de seu significado original, ele já fez morada e mandou recado que não voltará mais.)


Resta-nos abraçarmos e catalisarmos o processo de chegada dessa comunidade de fé, que liberta os espíritos e prosseguirmos nossa navegação, se é que desejamos ser salvos.


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Salvos pela poesia!

O que seria de nós sem o socorro dos poetas? O poeta canta o rotineiro e para nós tem o frescor de inédito. Com o poeta vamos de mãos dadas ao mundo familiar e parece que estamos ali pela primeira vez. Ficamos embasbacados perguntando “como não vimos isso antes”? As experiências vulgares do dia a dia, ridículas, ingênuas e bobas, quando ditas pelo poeta têm poder de Vida!

O poeta salva as palavras gastas pelo uso e tempo; dá novo sentido às palavras maltratadas. Ele tem habilidade de fazer uma palavra significar o seu antônimo! A licença poética foi inventada por causa do poeta: uma maneira que encontraram de conviver com a sua liberdade. O poeta cria neologismo porque o seu vocabulário é maior do que a linguagem.

Levamos um verdadeiro drible se lemos apenas as letras do poeta. Quando ele diz uma coisa pode estar querendo dizer outra coisa – este é o conselho de Gilberto Gil em “Metáfora”:

Uma lata existe para conter algo

Mas quando o poeta diz: "Lata"

Pode estar querendo dizer o incontível

Uma meta existe para ser um alvo

Mas quando o poeta diz: "Meta"

Pode estar querendo dizer o inatingível

Por isso, não se meta a exigir do poeta

Que determine o conteúdo em sua lata

Na lata do poeta tudonada cabe

Pois ao poeta cabe fazer

Com que na lata venha caber

O incabível

Deixe a meta do poeta, não discuta

Deixe a sua meta fora da disputa

Meta dentro e fora, lata absoluta

Deixe-a simplesmente metáfora

A poesia não são palavras, são imagens. A poesia não é a letra, mas as entreletras, não são as vozes são as entrevozes; não é o som, é a série harmônica.

Fazendo amor com as palavras, o poeta desenha uma cena, uma sensação, um aroma, uma textura. Com as palavras o poeta cria uma esperança e lembra as nossas saudades. O poeta usa as palavras para dizer a Palavra que nunca foi dita; e ele não diz, apenas sugere, é já é muito bom! A sua estética nos faz sofrer de beleza; e, apenas vislumbrar aquilo para que aponta, já nos faz suspirar!

Deus é poeta! Livre de normas, instituições, leis e teologia, Deus solta o verbo. Ou melhor: encarna o verbo. Sua poesia é gente – Jesus – tão maravilhosamente inclassificável! E quando Jesus fala (preste muita atenção!) pode estar falando do avesso, pode estar sugerindo outra coisa. Certamente, não está sugerindo um vocabulário para virar doutrinas, rezas, jargões ou palavras mágicas. Jesus está sugerindo mundos, cenas e imagens. Ele não quer sua voz poética presa num papel, impressa e lida; mas livre, ecoando, reverberando, vibrando em nosso corpo.

Jesus nos socorre pela beleza e não pela letra; através das perguntas e não das respostas; Jesus nos redime através de parábolas e não de dogmas; Jesus salva a nossa existência usando trocadilhos e não fórmulas; Jesus nos lembra do essencial usando metáforas e não doutrinas.

O que nos redime não é a apreensão da verdade absoluta (quem conseguirá?), mas sim o Verbo Encarnado. Em Jesus a teologia é aberta, é beleza, assombro e poesia.

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ESTRANHO ÍNTIMO MEU

Experimentar Deus é algo um tanto complexo. Como que alguém pode interagir com o Eterno Mistério? Como ser interlocutor do Invisível, daquele que nos escapa às palavras, daquele que está para além de nossas ideias ao seu respeito? Com que Deus nos encontramos quando oramos? Nós nos encontramos com Deus ou com nossas representações de Deus?


Fico admirado com a “intimidade” melosa de alguns religiosos com o seu deus, que para mim se assemelha mais a uma blasfêmia. Chega-se diante de um Deus que se conhece a priori. Chega-se diante de um Deus que já foi formatado, sistematizado, categorizado, como se Deus fosse um fenômeno que pudéssemos capturar. Por isso em alguns meios religiosos, a apreensão da “Verdade” é idolatrada!


A grande confiança está nas representações que se tem de Deus. Os encontros com Deus são ancorados nas ideias que se tem ao seu respeito, e assim acaba-se chegando diante de um ídolo. Sobre a parábola do fariseu e publicano, Rubem Alves diz “o fariseu ajoelhou-se diante do Deus verdadeiro e orou a um ídolo. O publicano ajoelhou-se diante de um ídolo, e orou ao Deus verdadeiro”.


Qual o lugar das representações, das imagens de Deus? Qual o lugar da teologia? As ideias que temos a respeito de Deus são importantes para o diálogo entre nós; são símbolos e signos que viabilizam os relacionamentos. As representações que temos de Deus modelam a nossa moral e ética e desenham a nossa cosmovisão. Mas as nossas representações de Deus não são Deus. A nossa teologia é importante para a nós, mas ela não é Deus.


É óbvio que sempre teremos que lidar com imagens de Deus, e que elas sejam cada vez mais geradoras de humanidade. Dizer que Deus é o Mistério não deve cessar as nossas conversas. Lembro-me de Leonardo Boff quando diz que Deus não é o limite de nossa razão, mas o ilimitado de nossa razão. As imagens sobre Deus sempre teremos, no entanto, precisamos ser iconoclastas; as representações de Deus devem ser derrubadas vez por outra. Vez por outra precisamos suspender as nossas ideias sobre Deus, principalmente quando se fala em oração.


Penso que na oração, chegamos sempre diante do Estranho; daquele que eu não sei quem é. Eu chego sempre diante do Outro. Nós estamos diante do “Não sei!”, do Imponderável, como diz Jean-Yves Leloup, do “Nada do Tudo cuja Causa é Ele”.


Eu me simpatizo com a teologia de Gilberto Gil em sua canção “Se eu quiser falar com Deus”: Se eu quiser falar com Deus/ Tenho que me aventurar/ Tenho que subir aos céus/ Sem cordas pra segurar.


Penso que seja assim. Se eu quiser falar com Deus eu preciso derrubar as imagens de Deus, desvencilhar-me dessa confiança na ortodoxia tão cara aos fundamentalistas; soltar as cordas de uma piedade que “capturou” Deus como fenômeno. Eu preciso soltar a âncora vaidosa do tecnicismo, do pragmatismo, do cientificismo e do racionalismo. Em entrevista a Revista Cult, Mateus Nachtergaele disse algo que achei genial: “acreditar em Deus é matar Deus. Você não tem que acreditar naquilo que existe. O que é é. Ponto.” Para lembrar de Gianni Vattimo, eu preciso considerar frágil e débil minhas verdades sobre Deus.

Eu posso me permitir à aventura de adorar a Deus em espírito. “Em espírito” não é “em transe”. Não! “Em espírito” é como vento, como um pássaro selvagem que voa, voa livre de qualquer confiança em verdades.


Isso não nos lança num desespero? Sim, maravilhoso desespero e estranhamento, pois é um salto no escuro, é subir sem cordas para segurar, é velejar na contingência do oceano, é se aventurar nas profundezas do abismo. Mas e daí, se é Nele que “nós vivemos, nos movemos e existimos”? O nosso vazio, ânsia, busca acontecem em Deus, e não a parte de Deus.


Quem garante o Encontro não são minhas verdades a respeito de Deus, quem garante o encontro é a graça de Deus. O chão, o ar, o oceano, o abismo onde nos aventuramos em oração e adoração são a graça de Deus. O Encontro é possível porque o Sagrado, transparente a tudo e a todos, nos busca.


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Os anos que me restam





Os anos me revestiram de uma impenitente obstinação. Persisto. Não me intimido no pavor de ser jogado na direção do imponderável. A experiência de lidar, constantemente, com alegrias e decepções, tristezas e triunfos me deixou com uma estranha sensação: nada pode espantar-me.


Paradoxalmente, insisto na teimosia e abandono o desafio de mover montanhas.


Por anos, esqueci de contar os meus dias. Desperdicei tempo. Engajado, tentei construir castelos improváveis. Perdi-me no ativismo. Abracei mais projetos do que podia – muitos não passavam de fuga. Dei passos maiores do que as pernas. Na correria, evitei monologar. Quebrei espelhos para não ficar cara a cara comigo mesmo. Devaneios onipotentes serviram para desancorar a jangada do porto de minha realidade. Delirei com utopias messiânicas. Desenraizei-me.


Hoje, com poucas folhas no calendário, tento redobrar cada instante. Redescubro o ócio. Reaprendo a rotina. Desejo reencontrar-me no des-sufoco. O dia sem espalhafato me basta. Quero viver, simplesmente viver. Sim, consciente dos obstáculos e sem quixotismo, ser, simplesmente ser. Mesmo consciente de que alguma tragédia possa rondar a minha casa, proponho a mim mesmo perder a pressa.


Consternado, noto um vazio embaçando os olhos de antigos companheiros. Vazio tenebroso. Entristecido por vê-los roubados de si mesmos, tatuo na pele um mandamento: viva com intensidade. Não quero perder a alma. Marco a ferro o imperativo de amar a beleza, a justiça, o bem.


A idade abre os meus olhos. Noto ventanias assobiando pelas frestas do castelo que outrora considerei inexpugnável. Eu, adolescente afoito, cedo para o homem da esperança cauta. Eu estava preso, só não queria admitir. A construção de um personagem me consumiu – custou-me caro. Hoje, escancaro janelas e portas. Declaro-me devassável. Perco o medo de fragilizar-me. Já não me tranco para o vento impetuoso que espalha o pó das vaidades.


Entre o desempenho e a contemplação, prefiro apaziguar os olhos. Aprendo a valsar. Sereno, espalho o bálsamo que sara feridas. A pausa tem poder de cura.


O Eclesiastes avisa: existe tempo para tudo. Sim, há tempo, inclusive, de fechar olhos e ouvidos. Tempo de ir para o escuro e esperar o feitiço do ódio desaparecer. Do silêncio, arrancar forças que esvaziam antigos messianismos – todos travestidos de piedade.


Chego a ouvir o barulho do meu rancor, disfarçado de religiosidade, perdendo força. A minha paz precisa dessa fonte de bonança. Desejo a sensibilidade de escutar um ribeiro, que se espreme entre pedras. Procuro, entre vários barulhos, o murmúrio dessas águas despretensiosas. Entro na época própria de declarar: já não me empolgo com o rugir das marés. Prefiro as suaves sinfonias. Em mim, a violenta rebentação dos oceanos cede espaço para a sinfonia dos regatos.


Sim, permiti que se grudassem abatimentos e azedumes no coração. Ainda carrego um bornal com pedregulhos ásperos – metáfora de memórias que cortam. Não as coleciono com orgulho. As quinas afiadas de meu passado dolorido carecem de um tempo moroso, que me permita burilar todas as pedras. Cansado de sentir os cardos da desilusão, também necessito descobrir a terapia de passear em jardins. Já me falaram de pessoas curadas pela beleza das flores e pelo cheiro da mata.


Quem sabe eu reaprenda a sentar em cadeiras de balanço e saiba cultivar uma quietude capaz de fazer-me coincidir comigo mesmo. Prometo: hei de deitar-me, sereno, como fazia nos tempos de menino; vou balançar na rede e deixar o ranger dos ganchos aquietar o sono.


Guardo saudades melancólicas. Visitado por uma nostalgia triste, recuso perder quem eu amo. Eis porque me esforço tanto para passar um cadeado na amargura e desvencilhar-me do narcisismo tolo de querer salvar o mundo. Devo proteger as únicas riquezas que me restam: meus queridos. (Aviso raposas e chacais: – Vocês não destruirão as minhas vinhas; não permitirei que vocês invadam o território onde protejo a minha matilha).


Disponho de menos tempo do que já vivi. Pretendo degustar cada dia com a delicadeza que ele merece. Os anos que me restam podem ser poucos, mas não serão banais.


Soli Deo Gloria


Vi no http://www.ricardogondim.com.br/50anos/os-anos-que-me-restam/
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Tributo ao simples





“Bem aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra”


Palavras morrem, deixam de comunicar, perdem o sentido. Certas virtudes têm a mesma sorte. Caem em desuso. O passar dos anos as joga no ostracismo. Reviravoltas culturais, econômicas, ideológicas fazem com que certos valores, outrora considerados nobres, pareçam irrelevantes. Falar de mansidão, por exemplo, soa piegas hoje em dia. Em algum mosteiro talvez um futuro candidato à beatificação ainda considere o projeto de ser manso. Quem mais, no mundo, ambiciona o anonimato? Humildade lembra demagogia. Ser simples? Uma fraqueza!


Em “Humano, demasiado humano”, Nietzsche conta a história de um homem medroso e covarde. Faltava-lhe a intrepidez de contradizer os companheiros de partido. “Tinha mais medo da opinião de seus camaradas que da morte. Era um lamentável espírito fraco”. Seus camaradas perceberam então que a covardia dele seria útil. Primeiro o trataram como herói e por fim, mártir. Mas ele permanecia um fraco. Interiormente dizia não enquanto repetia o que os outros desejavam. Mesmo no cadafalso, a instantes de morrer, não deixou de repetir o sim dos pusilânimes. “Ao lado dele, estava um dos seus velhos camaradas, que o tiranizava tanto pela palavra e o olhar, que ele sofreu a morte de maneira mais decente e, desde então, é homenageado como mártir e grande personalidade”. Uma possível lição dessa história é que quem pensa com liberdade, mas adequa o discurso por conveniência, não é humilde, apenas um coitado. Até o absurdo do martírio legitima falsos conceitos de humildade.


Mansidão é, entre as virtudes brandas, uma das mais aviltadas. Fraudada, chancela subserviência. Todo vassalo adora passar por manso. Tomado pelo espírito de rebanho, prefere andar de cabeça baixa. Cai-lhe bem merecer pena. Detalhe: sua voz branda esconde um ego gigantesco. Ele só pensa em preservar-se. Cordato, repete frases testadas, pois precisa dar-se bem com os donos do poder. Na candura, encarna o pacato dissimulado. Que “não inventa nada, não cria, não empurra, não rompe, não engendra; mas em contrapartida, custodia zelosamente a armadura de automatismos, pré-juízos e dogmas acumulados durante séculos…” (José Ingenieros).


O falso humilde consegue ser modesto. Para quem usa a humildade como degrau, pudor se torna imprescindível. Alguns sossegados metem medo. Quem se acostumou às águas serenas nunca vai propor tese alguma que balance a jangada. Assim, munido de semblante plácido, ele deixa o ambiente pronto para obviedades. Melhor desfrutar das opiniões alheias – quanto mais antigas melhores – do que condenar-se ao tumulto que assola os inquietos. Supostos humildes nunca desaprovam o poder político nem ousam denunciar qualquer blasfêmia social.


Nietzsche afirmou em “Gaia Ciência:


Existe, frequentemente, em suma, uma espécie de humildade receosa, que, quando nos aflige, nos torna para sempre impróprios para as disciplinas do conhecimento. Porque, no momento em que o homem que a transporta descobre uma coisa que o choca, dá meia volta, seja como for, e diz consigo: “Enganaste-te! Onde é que tinhas a cabeça? Isso não pode ser verdade!” De forma que em vez de examinar mais de perto e de ouvir com mais atenção, desata a fugir completamente aterrado, evita encontrar aquilo que o choca e procura esquecê-lo o mais depressa possível. Porque eis o que diz a sua lei: “Não quero dizer nada que contradiga a opinião corrente. Serei eu feito para descobrir novas verdades? Já há demasiadas antigas”.


A verdadeira simplicidade é, antes de tudo, corajosa; destemida, embora não considere nunca as armas do violento. O simples sabe a força que se esconde na singeleza. Quem se vale de armas malignas para impor a vontade se torna igual ao maligno que as empunha. A espiral da barbárie acontece quando mansos passam a recitar a cartilha que ensina combater violência com mais violência.


As maiores ameaças à humanidade nascem da sedução do poder. Poder, – Atenção: anjos, senhoras e senhores – é sempre uma ameaça. Nele está o veneno da arrogância. Guerras e injustiça se universalizaram porque o mundo enfiou o pé na lógica de que a sobrevivência da espécie depende da subjugação do outro pela força.


Selvageria difere do amor. No centro do universo não predomina a barbárie. Deus é amor. O ato criador primeiro, o fiat lux, só pode ser concebido na gratuidade. E quem cria (ou procria) renuncia à potência. Simone Weil afirmou: “Se Deus almejasse afirmar-se a partir da potência, nada existiria senão ele próprio”. Deus precisou abrir espaço para o imperfeito, “se retirar”, como escreveu a filosofa francesa. Em seu passo para trás, na kenosis, o Pai possibilita a história – os processos de humanização.


Fragilidade vem de Deus. Ela suscita docilidade, docilidade cria diálogo e diálogo faz amigos. Deus quer amigos, apenas. Toda altivez é solitária. Só a humildade escancara os salões da convivência. Empáfia, insensível, míope e surda, não passa de eufemismo para inferno.


O simples pede: “me ensine, eu quero crescer”; já o soberbo retruca: “Nada me resta para aprender”. O manso se mostra flexível porque se reconhece limitado. A rigidez do poderoso o infantiliza; ensimesmado, ele embrutece, enquanto o singelo se habilita para a vida.


Simplicidade e contentamento vivem sob o mesmo teto. O simples não se encanta com o assobio da opulência, ele só quer navegar, despretensiosamente, vida a fora. Não liga se não conseguir assento entre os altivos. Indiferente a cetros, coroas e castelos, sabe valorizar o instante.
 E assim, disposto a perder a vida, herda a terra.


Soli Deo Gloria


Vi no http://www.ricardogondim.com.br/estudos/tributo-ao-simples/
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Revista Veja Entrevista William Lane Craig


Revista Veja Entrevista William Lane Craig[1]




“É possível acreditar em Deus usando a razão”, afirma William Lane Craig

O filósofo e teólogo defende o cristianismo, a ressurreição de Jesus e a veracidade da Bíblia a partir de construção lógica e racional, e se destaca em debates com pensadores ateus

Quando o escritor britânico Christopher Hitchens, um dos maiores defensores do ateísmo, travou um longo debate nos Estados Unidos, em abril de 2009, com o filósofo e teólogo William Lane Craig sobre a existência de Deus, seus colegas ateus ficaram tensos. Momentos antes de subir ao palco, Hitchens – que morreu em dezembro de 2011, aos 62 anos – falou a jornalistas sobre a expectativa de enfrentar Craig.

“Posso dizer que meus colegas ateus o levam bem a sério”, disse. “Ele é considerado um adversário muito duro, rigoroso, culto e formidável”, continuou. “Normalmente as pessoas não me dizem ‘boa sorte’ ou ‘não nos decepcione’ antes de um debate – mas hoje, é o tipo de coisa que estão me dizendo”. Difícil saber se houve um vencedor do debate. O certo é que Craig se destaca pela elegância com que apresenta seus argumentos, mesmo quando submetido ao fogo cerrado.

O teólogo evangélico é considerado um dos maiores defensores da doutrina cristã na atualidade. Craig, que vive em Atlanta (EUA) com a esposa, sustenta que a existência de Deus e a ressurreição de Jesus, por exemplo, não são apenas questões de fé, mas passíveis de prova lógica e racional. Em seu currículo de debates estão o famoso químico e autor britânico Peter Atkins e o neurocientista americano Sam Harris (veja lista com vídeos legendados de Craig). Basta uma rápida procura no Youtube para encontrar uma vastidão de debates travados entre Craig e diversos estudiosos. Richard Dawkins, um dos maiores críticos do teísmo, ainda se recusa a discutir com Craig sobre a existência de Deus.

Em artigo publicado no jornal inglês The Guardian, Dawkins afirma que Craig faz apologia ao genocídio, por defender passagens da Bíblia que justificam a morte de homens, mulheres e crianças por meio de ordens divinas. “Vocês apertariam a mão de um homem que escreve esse tipo de coisa? Vocês compartilhariam o mesmo palco que ele? Eu não, eu me recuso”, escreveu. Na entrevista abaixo, Craig fala sobre o assunto.

Autor de diversos livros – entre eles Em Guarda – Defenda a fé cristã com razão e precisão (Ed. Vida Nova), lançado no fim de 2011 no Brasil, – Craig é doutor em filosofia pela Universidade de Birmingham, na Inglaterra, e em teologia pela Universidade de Munique, Alemanha. O filósofo esteve no Brasil para o 8º Congresso de Teologia da Editora Vida Nova, em Águas de Lindóia, entre 13 e 16 de março. Durante o simpósio, Craig deu palestras e dedicou a última apresentação a atacar, ponto a ponto, os argumentos de Richard Dawkins sobre a inexistência de Deus.

Por que deveríamos acreditar em Deus?


Porque os argumentos e evidências que apontam para a Sua existência são mais plausíveis do que aqueles que apontam para a negação. Vários argumentos dão força à ideia de que Deus existe. Ele é a melhor explicação para a existência de tudo a partir de um momento no passado finito, e também para o ajuste preciso do universo, levando ao surgimento de vida inteligente. Deus também é a melhor explicação para a existência de deveres e valores morais objetivos no mundo. Com isso, quero dizer valores e deveres que existem independentemente da opinião humana.

Se Deus é bondade e justiça, por que ele não criou um universo perfeito onde todas as pessoas vivem felizes?


Acho que esse é o desejo de Deus. É o que a Bíblia ensina. O fato de que o desejo de Deus não é realizado implica que os seres humanos possuem livre-arbítrio. Não concordo com os teólogos que dizem que Deus determina quem é salvo ou não. Parece-me que os próprios humanos determinam isso. A única razão pela qual algumas pessoas não são salvas é porque elas próprias rejeitam livremente a vontade de Deus de salvá-las.

Alguns cientistas argumentam que o livre-arbítrio não existe. Se esse for o caso, as pessoas poderiam ser julgadas por Deus?


Não, elas não poderiam. Acredito que esses autores estão errados. É difícil entender como a concepção do determinismo pode ser racional. Se acreditarmos que tudo é determinado, então até a crença no determinismo foi determinada. Nesse contexto, não se chega a essa conclusão por reflexão racional. Ela seria tão natural e inevitável como um dente que nasce ou uma árvore que dá galhos. Penso que o determinismo, racionalmente, não passa de absurdo. Não é possível acreditar racionalmente nele. Portanto, a atitude racional é negá-lo e acreditar que existe o livre-arbítrio.

O senhor defende em seu site uma passagem do Velho Testamento em que Deus ordena a destruição da cidade de Canaã, inclusive autorizando o genocídio, argumentando que os inocentes mortos nesse massacre seriam salvos pela graça divina. Esse não é um argumento perigosamente próximo daqueles usados por terroristas motivados pela religião?


A teoria ética desses terroristas não está errada. Isso, contudo, não quer dizer que eles estão certos. O problema é a crença deles no deus errado. O verdadeiro Deus não ordena atos terroristas e, portanto, eles estariam cometendo uma atrocidade moral. Quero dizer que se Deus decide tirar a vida de uma pessoa inocente, especialmente uma criança, a Sua graça se estende a ela.

Se o terrorista é cristão o ato terrorista motivado pela religião é justificável, por ele acreditar no Deus ‘certo’?


Não é suficiente acreditar no deus certo. É preciso garantir que os comandos divinos estão sendo corretamente interpretados. Não acho que Deus dê esse tipo de comando hoje em dia. Os casos do Velho Testamento, como a conquista de Canaã, não representam a vontade normal de Deus.

O sr. está querendo dizer que Deus também está sujeito a variações de humor? Não é plausível esperar que pelo menos Ele seja consistente?


Penso que Deus pode fazer exceções aos comandos morais que dá. O principal exemplo no Velho Testamento é a ordem que ele dá a Abraão para sacrificar seu filho Isaque. Se Abraão tivesse feito isso por iniciativa própria, isso seria uma abominação. O Deus do Velho Testamento condena o sacrifício infantil. Essa foi uma das razões que o levou a ordenar a destruição das nações pagãs ao redor de Israel. Elas estavam sacrificando crianças aos seus deuses. E, no entanto, Deus dá essa ordem extraordinária a Abraão: sacrificar o próprio filho Isaque. Isso serviu para verificar a obediência e fé dele. Mas isso é a exceção que prova a regra. Não é a forma normal com que Deus conduz os assuntos humanos. Mas porque Deus é Deus, Ele tem a possibilidade de abrir exceções em alguns casos extremos, como esse.

O sr. disse que não é suficiente ter o deus certo, é preciso fazer a interpretação correta dos comandos divinos. Como garantir que a sua interpretação é objetivamente correta?


As coisas que digo são baseadas no que Deus nos deu a conhecer sobre si mesmo e em preceitos registrados na Bíblia, que é a palavra d’Ele. Refiro-me a determinações sobre a vida humana, como “não matarás”. Deus condena o sacrifício de crianças, Seu desejo é que amemos uns ao outros. Essa é a Sua moral geral. Seria apenas em casos excepcionalmente extremos, como o de Abraão e Isaque, que Deus mudaria isso. Se eu achar que Deus me comandou a fazer algo que é contra o Seu desejo moral geral, revelado na escritura, o mais provável é que eu tenha entendido errado. Temos a revelação do desejo moral de Deus e é assim que devemos nos comportar.

O sr. deposita grande parte da sua argumentação no conteúdo da Bíblia. Contudo, ela foi escrita por homens em um período restrito, em uma área restrita do mundo, em uma língua restrita, para um grupo específico de pessoas. Que evidência se tem de que a Bíblia é a palavra de um ser sobrenatural?


A razão pela qual acreditamos na Bíblia e sua validade é porque acreditamos em Cristo. Ele considerava as escrituras hebraicas como a palavra de Deus. Seus ensinamentos são extensões do que é ensinado no Velho Testamento. Os ensinamentos de Jesus são direcionados à era da Igreja, que o sucederia. A questão, então, se torna a seguinte: temos boas razões para acreditar em Jesus? Ele é quem ele diz ser, a revelação de Deus? Acredito que sim. A ressurreição dos mortos, por exemplo, mostra que ele era quem afirmava.

Existem provas que confirmem a ressurreição de Jesus?


Temos boas bases históricas. A palavra ‘prova’ pode ser enganosa porque muitos a associam com matemática. Certamente, não temos prova matemática de qualquer coisa que tenha acontecido na história do homem. Não temos provas, nesse sentido, de que Júlio César foi assassinado no senado romano, por exemplo, mas temos boas bases históricas para isso. Meu argumento é que se você considera os documentos do Novo Testamento como fontes da história antiga, – como os historiadores gregos Tácito, Heródoto ou Tucídides – o evangelho aparece como uma fonte histórica muito confiável para a vida de Jesus de Nazaré. A maioria dos historiadores do Novo Testamento concorda com os fatos fundamentais que balizam a inferência sobre a ressurreição de Cristo. Coisas como a sua execução sob autoridade romana, a descoberta das tumbas vazias por um grupo de mulheres no domingo depois da crucificação e o relato de vários indivíduos e grupos sobre os aparecimentos de Jesus vivo após sua execução. Com isso, nos resta a seguinte pergunta: qual é a melhor explicação para essa sequência de acontecimentos? Penso que a melhor explicação é aquela que os discípulos originais deram – Deus fez Jesus renascer dos mortos. Não podemos falar de uma prova, mas podemos levantar boas bases históricas para dizer que a ressurreição é a melhor explicação para os fatos. E como temos boas razões para acreditar que Cristo era quem dizia ser, portanto temos boas razões para acreditar que seus ensinamentos eram verdade. Sendo assim, podemos ver que a Bíblia não foi criação contingente de um tempo, de um lugar e de certas pessoas, mas é a palavra de Deus para a humanidade.

Os textos da Bíblia passaram por diversas revisões ao longo do tempo. Como podemos ter certeza de que as informações às quais temos acesso hoje são as mesmas escritas há 2.000 anos? Além disso, como lidar com o fato de que informações podem ser perdidas durante a tradução?


Você tem razão quanto a variedade de revisões e traduções. Por isso, é imperativo voltar às línguas originais nas quais esses textos foram escritos. Hoje, os críticos textuais comparam diferentes manuscritos antigos de modo a reconstruir o que os originais diziam. O Novo Testamento é o livro mais atestado da história antiga, seja em termos de manuscritos encontrados ou em termos de quão próximos eles estão da data original de escrita. Os textos já foram reconstruídos com 99% de precisão em relação aos originais. As incertezas que restam são trivialidades. Por exemplo, na Primeira Epístola de João, ele diz: “Estas coisas vos escrevemos, para que o vosso gozo se cumpra”. Mas alguns manuscritos dizem: “Estas coisas vos escrevemos, para que o nosso gozo se cumpra”. Não temos certeza se o texto original diz ‘vosso’ ou ‘nosso’. Isso ilustra como esse 1% de incerteza é trivial. Alguém que realmente queira entender os textos deverá aprender grego, a língua original em que o Novo Testamento foi escrito. Contudo, as pessoas também podem comprar diferentes traduções e compará-las para perceber como o texto se comporta em diferentes versões.

É possível explicar a existência de Deus apenas com a razão? Qual o papel da ciência na explicação das causas do universo?


A razão é muito mais ampla do que a ciência. A ciência é uma exploração do mundo físico e natural. A razão, por outro lado, inclui elementos como a lógica, a matemática, a metafísica, a ética, a psicologia e assim por diante. Parte da cegueira de cientistas naturalistas, como Richard Dawkins, é que eles são culpados de algo chamado ‘cientismo’. Como se a ciência fosse a única fonte da verdade. Não acho que podemos explicar Deus em sua plenitude, mas a razão é suficiente para justificar a conclusão de que um criador transcendente do universo existe e é a fonte absoluta de bondade moral.

Por que o cristianismo deveria ser mais importante do que outras religiões que ensinam as mesmas questões fundamentais, como o amor e a caridade?


As pessoas não entendem o que é o cristianismo. É por isso que alguns ficam tão ofendidos quando se prega que Jesus é a única forma de salvação. Elas pensam que ser cristão é seguir os ensinamentos éticos de Jesus, como amar ao próximo como a si mesmo. É claro que não é preciso acreditar em Jesus para se fazer isso. Isso não é o cristianismo. O evangelho diz que somos moralmente culpados perante Deus. Espiritualmente, somos separados d’Ele. É por isso que precisamos experimentar Seu perdão e graça. Para isso, é preciso ter um substituto que pague a pena dos nossos pecados. Jesus ofereceu a própria vida como sacrifício por nós. Ao aceitar o que ele fez em nosso nome, podemos ter o perdão de Deus e a limpeza moral. A partir disso, nossa relação com Deus pode ser restaurada. Isso evidencia por que acreditar em Cristo é tão importante. Repudiá-lo é rejeitar a graça de Deus e permanecer espiritualmente separado d’Ele. Se você morre nessa condição, você ficará eternamente separado de Deus. Outras religiões não ensinam a mesma coisa.

A crença em Deus é necessária para trazer qualidade de vida e felicidade?


Penso que a crença em Deus ajuda, mas não é necessária. Ela pode lhe dar uma fundação para valores morais, propósito de vida e esperança para o futuro. Contudo, se você quiser viver inconsistentemente, é possível ser um ateu feliz, contanto que não se pense nas implicações do ateísmo. Em última análise, o ateísmo prega que não existem valores morais objetivos, que tudo é uma ilusão, que não há propósito e significado para a vida e que somos um subproduto do acaso.

Por que importa se acreditamos no deus do cristianismo ou na ‘mãe natureza’ se na prática as pessoas podem seguir, fundamentalmente, os mesmos ensinamentos?


Deveríamos acreditar em uma mentira se isso for bom para a sociedade? As pessoas devem acreditar em uma falsa teoria, só por causa dos benefícios sociais? Eu acho que não. Isso seria uma alucinação. Algumas pessoas passam a acreditar na religião por esse motivo. Já que a religião traz benefícios para a sociedade, mesmo que o indivíduo pense que ela não passa de um ‘conto de fadas’, ele passa a acreditar. Digo que não. Se você acha que a religião é um conto de fadas, não acredite. Mas se o cristianismo é a verdade – como penso que é – temos que acreditar nele independente das consequências. É o que as pessoas racionais fazem, elas acreditam na verdade. A via contrária é o pragmatismo. “Isso Funciona?”, perguntam elas. “Não importa se é verdade, quero saber se funciona”. Não estou preocupado se na Suécia alguns são felizes sem acreditar em Deus ou se há alguma vantagem em acreditar n’Ele. Como filósofo, estou interessado no que é verdade e me parece que a existência desse ser transcendente que criou e projetou o universo, fonte dos valores morais, é a verdade.



[1] Perfil. Nome: William Lane Craig. Profissão: Filósofo, teólogo e professor universitário na Universidade de Biola, Califórnia. Nascimento: 23 de agosto de 1949. Livros destacados: Apologética Contemporânea – A veracidade da Fé Cristã; Em Guarda, Defenda a fé cristã com razão e precisão; ambos publicados no Brasil pela editora Vida Nova. Principal contribuição para a filosofia: Craig foi responsável por reformular o Argumento Cosmológico Kalam (variação do argumento cosmológico que defende a existência de uma primeira causa para o universo) nos seguintes termos: 1) Tudo que começa a existir tem uma causa de existência. 2) O universo começou a existir. 3) Portanto, o universo tem uma causa para sua existência. Informações pessoais: William Lane Craig é conhecido pelo trabalho na filosofia do tempo e na filosofia da religião, especificamente sobre a existência de Deus e na defesa do teísmo cristão. Escreveu e editou mais de 30 livros, é doutor em filosofia e teologia em universidades inglesa e alemã e desde 1996 é pesquisador e professor de filosofia na Universidade de Biola, na Califórnia. Atualmente vive em Atlanta, nos EUA, com a esposa. Craig pratica exercícios regularmente como forma de combater a APM (Atrofia Peronial Muscular) uma doença degenerativa do sistema nervoso que lhe causou atrofiamento dos nervos das mãos e pernas. Especialista em debates desde o ensino médio, o filósofo passa a maior parte do tempo estudando.



sábado, 24 de março de 2012

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A Razão De Tomé




Há na opinião popular, mais conhecida como senso comum, a crença na incredulidade de Tomé.

 
À primeira vista quando se pensa em Tomé, pensa-se que ele não creu na ressurreição, antes duvidou e assim Jesus o advertiu de que jamais deveria duvidar, antes, ser um crente.

 
Com isto associa-se de pronto que o contrário de fé é dúvida. Duvidar, neste caso, é igual a descrer. Considero importante lembrar que o Movimento da Fé enfatizou este senso comum e praticamente afunilou os raciocínios para que de maneira geral se confundisse fé com confissão positiva. Não é preciso muito para convencer qualquer crente de que a fé cristã não é confissão positiva, mas no dia-a-dia, muito se pratica o pensamento positivo como se fosse fé.


Voltando ao nosso personagem, Tomé o Dídimo.


Jesus ressuscitou, apareceu para os discípulos que, deslumbrados, entre alegria e medo, testemunharam o inacreditável, porém Tomé não estava presente e, mesmo conhecendo bem seus amigos, disse que isto seria impossível, que não daria nenhum crédito ao testemunho se não pudesse constatar pessoalmente, de forma concreta que de fato, aquele personagem que aparecera aos seus amigos, era Jesus de Nazaré.

 
Nas palavras da NVI o registro ficou:

 
Os outros discípulos lhe disseram: "Vimos o Senhor!" Mas ele lhes disse: "Se eu não vir as marcas dos pregos nas suas mãos, não colocar o meu dedo onde estavam os pregos e não puser a minha mão no seu lado, não crerei" (João 20:25ss)


Noutra feita, de igual forma, Jesus apareceu, porém desta vez Tomé estava presente e antes mesmo de se pronunciar Jesus se antecipou e convidou-o a tocar em suas feridas e constatar por si mesmo e concretamente que aquele que estava diante de todos e falando é o mesmo que fora assassinado cruelmente.

 
Tomé rapidamente desistiu de exigir as provas, se jogou ao chão, e adorou a Jesus.

 
Por sua vez Jesus lhe lançou um segundo convite: ... “Pare de duvidar e creia".


Apesar de a narrativa problematizar a dúvida, podemos ter um olhar mais acurado e nos perguntarmos se o problema seria a dúvida em si mesma, ou o tipo de dúvida que Tomé apresentou. Dito de outra forma: O pré-requisito exigido por Tomé para crer não serve para a fé.


Vejamos com mais detalhes.


Se você, amigo leitor, disser para mim que meu falecido pai deixou uma fortuna depositada num banco qualquer em meu nome, não basta eu dizer ao gerente, vim buscar meu dinheiro. Faz-se necessário verificar todos os registros que comprovem que há uma conta naquele banco aberta em meu nome e o quanto de dinheiro lá estaria depositado.

 
Sem as provas, ninguém, nem o presidente do banco me dariam um real sequer.

 
Isto significa o seguinte: tanto eu como o banco precisamos de provas para dar crédito àquilo que se diz ser verdadeiro.

 
Mas depois de verificar todos os comprovantes, ver a conta e o extrato, não é preciso crer, os fatos dizem o que é.

 
Acreditar naquilo que se tem comprovações factíveis, concretas e irrefutáveis não é fé, mas constatação. Tomé queria constatar concretamente a ressurreição, e Jesus lhe ensina que crer está para além da idéia de constatar fatos.


Não preciso ter fé para acreditar que estou neste exato momento escrevendo este texto, porque afinal, estou escrevendo este texto. Não é preciso ter fé para constatar que hoje podemos viajar longas distancias por vias aéreas.


Quando falamos de verdade de fé, a apreciação não é o toque, a vista, a comprovação científica, mas sim uma apreensão de alma, espiritual, um jeito de sei que sei, mas não sei como sei.


Jesus estaria dizendo a Tomé que a ressurreição foi real, que ele poderia checar com seus instrumentos de verificação, mas que esta exigência de provas para crer, diante do que de fato significa fé, não era fé.

 
Se Tomé entendesse isto seria mais bem-aventurado, mas enquanto ele exigisse comprovações, certezas empíricas para aceitar, ele ainda não havia experimentado o que de fato é fé.


Não podemos falar de verdades profundas com averiguações rasas. Ao medir uma curta distância posso fazê-lo com o metro, mas ao medir as distâncias estelares preciso usar a luz.

 
Assim, ao avaliar as coisas que existem no mundo material posso e consigo fazê-lo empiricamente, mas ao avaliar as coisas espirituais ou divinas estes métodos são inadequados, incapazes e inviáveis.


Se você quiser se aproximar de Deus, não exija provas de que Ele existe, porque quem quer se aproximar de Deus precisa crer. Sem fé é impossível uma relação genuína com Deus.

 
Tomé não foi um incrédulo por que não creu na ressurreição, mas sim porque considerou que a ressurreição e outros elementos espirituais para terem sua validade precisam de comprovações empíricas.


A fé, subjetiva, depende de abstração, tal qual Nicodemos que não conseguia entender que apesar de Jesus falar em nascer de novo, não estava falando de nascer de novo. Mas a linguagem de Jesus era apenas uma maneira de fazer com que aquilo que Nicodemos sabia fosse o meio para que ele apreendesse aquilo que não alcançava, mas desejava – uma verdade espiritual.


Em outras palavras, Tomé entendia que só poderia crer naquilo que ele pudesse provar. Jesus o corrige para que cresse. Simples assim? É uma loucura doida, dizer que a salvação é crer e ponto. Mas assim se faz a fé.


Eliel Batista


Vi no http://www.elielbatista.com/2012/03/razao-de-tome.html
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Deus salve a cultura!

Perdi muito tempo em minha vida assistindo pregações que apontavam a tecnologia e os meios de comunicação como o anticristo ou como sinais da temível “nova era” que nunca chegou. Primeiro a TV, depois a música e então a Internet. Tudo foi precipitadamente demonizado, aumentando ainda mais o abismo cultural do cristão em meio a um mundo em constante mudança.


Esta análise não é sobre os meios de comunicação em si, mas sobre como há um desafio ainda desconhecido de uma geração a respeito de como pode (e deve) um cristão interagir intensamente com a cultura que o cerca sem que seja corrompido por ela. Isto por que desconectar-se do mundo e da cultura é o mesmo que cometer suicídio ou mudar-se pra um convento afastado da civilização. Se não consumirmos/produzirmos cultura, nos afastamos das pessoas e perdemos a capacidade de traduzir as verdades eternas do Reino na linguagem que as pessoas compreendem.



Mas o ponto é: o que há de errado com a produção cultural contemporânea? Por que somos sutilmente corrompidos pelo desejo de espiar a vida alheia nos inúmeros reality shows? Por que assistimos novelas que mexem com nosso senso de justiça ao nos fazerem muitas vezes torcer pelo divórcio, pelo assassinato ou pelo bandido da história?


Quando li nos sites de notícias que alguns “crentes” estariam na nova edição do Big Brother, não esbocei a menor sensação de esperança. Quando vi a Globo transmitir um Festival Gospel produzido no Rio de Janeiro às custas dos cofres públicos, não fiquei nem um pouco animado. Quando cantores góspeis cantaram lado a lado com as “coleguinhas” semi-nuas no Caldeirão do Huck, percebi que tudo realmente não passa de mais do mesmo. Interesses comerciais continuam tentando manipular a opinião do cristão de modo a consolidar mais um mercado consumidor obediente e não crítico. E enquanto isso alguns de nós comemoram como se houvesse algum mérito em ter espaço na mídia.


Se seus olhos e sua alma pertencem à este modelo de produção cultural, sinto muito por você.
A verdade é que deste tipo de “cultura” eu quero distância. Creio sim que deveríamos participar do BBB, de shows e de programas de auditório. Mas como cristão autêntico, penso que se eu tiver uma chance de sair em rede nacional, não irei desperdiçar isto de maneira alguma. Quero ser como Michael Moore em 2002, quando recebeu o Oscar de melhor Documentário (Tiros em Columbine) e com toda a ousadia proclamou desaforos no microfone a respeito da política estadunidense e de seu então presidente George Bush. É claro que desde então Moore nunca mais será indicado a nenhum tipo de premiação, ainda que produza verdadeiras relíquias cinematográficas. Mas ele foi autêntico e ousado. Como nós que adoramos nos denominar “profetas” deveríamos ser.


Selecionar o que consumimos é prudente e com certeza faz toda a diferença em nosso caráter. Mas isto não está restrito a regras do tipo “não veja TV”. Cada um deve discernir diretamente da parte de Deus quais são os limites considerados seguros para si. E se ultrapassar tais limites (ou exigir que outros se guiem pelos seus limites pessoais), então estará em pecado.


Maravilhoso será o dia em que formos capazes de influenciar os meios de comunicação pelos nossos valores inflexíveis. Que sejamos o povo do equilíbrio e da coerência, de modo que a mídia nos TEMA pelo motivo correto. Maravilhoso será quando soubermos aproveitar todas as oportunidades para relacionar a fé redentora em Cristo à cultura compreensível a este mundo. Que a ponte entre o Reino de Deus e The Matrix, entre a Redenção e Pulp Fiction, entre o discipulado e Clube da Luta… que tudo isto seja algo natural para nós, contribuindo de maneira não passiva.


Deus salve a cultura! E que Deus nos salve de nos corrompermos com as coisas tão belas que Ele mesmo nos permitiu criar.


Artigo escrito por Ariovaldo Jr
para a Revista Expresso Cristão


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Quando

Quando eu me converti a Cristo, me sentia um lixo diante da visível santidade (segundo o que eu compreendia a respeito disso) de meus companheiros. Era como se houvesse uma percepção de que eu não era digno de fazer parte daquele grupo. A paciência de meus mestres (amigos de verdade) foi não apenas em ensinar princípios, mas principalmente em reafirmar o quanto Deus tem um gosto estranho e duvidoso por aqueles que “não são”.


Os anos se passaram e aprendi a admirar grandes homens de Deus. Ou quase. A comparação com a minha própria vida era inevitável e eu continuava me sentindo a escória da humanidade. Então o tempo acabou revelando que uma grande parte dos grandes homens que admirei sustentavam apenas uma aparência moralmente respeitável.


Neste meio termo passei a meditar sobre a necessidade de ser autêntico e transparente mesmo que isto represente ser uma porcaria longe do padrão de Deus. Por pior que sejamos, quando há sinceridade, Deus interfere e forja nosso novo caráter na chama dolorosa de seu amor. É, o amor dói.


17 anos se passaram. Altos e baixos de montão na minha “carreira”. Alguns baixos foram tão profundos que ainda tenho medo de dormir com a luz apagada. Mas uma coisa posso afirmar com toda a certeza: sou uma porcaria em constante manutenção. Ainda que me arrastando, estou caminhando PRA FRENTE. E por isso não tenho saudades de “QUANDO” nenhum do meu passado.


Vi no http://www.ariovaldo.com.br/2012/quando/

segunda-feira, 19 de março de 2012

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"Homossexuais deveriam ser executados", diz teólogo




Hermes Fernandes
"...minha posição não é apenas que os homossexuais não devem se casar, mas que o homossexualismo é um crime, assim como o assassinato ou roubo, de forma que mesmo antes de considerar a união civil, devemos considerar o punir ou não aos homossexuais, com as possíveis punições, abrangendo desde a prisão à execução." Vincent Cheung

Jamais imaginei que em pleno século XXI ouviria algo assim vindo de um teólogo protestante. E quanto ao conceito de graça, aonde foi parar?


São posturas assim que aumentam o abismo entre a igreja cristã e a comunidade gay, impossibilitando qualquer diálogo respeitoso, e o pior de tudo, dificultando a conversão de homossexuais à fé cristã.


Será que Jesus se aliaria a um grupo que pregasse morte aos gays?


Isso me remete ao episódio em que dois dos Seus discípulos sugeriram que se orasse para que Deus enviasse fogo do céu e consumisse o povo de uma aldeia samaritana que não os acolhera. A resposta de Jesus foi surpreendente:

"Vós não sabeis de que espírito sois. Porque o Filho do homem não veio para destruir as almas dos homens, mas para salvá-las. E foram para outra aldeia." Lucas 9:55-56

Não importa se lá atrás um profeta foi atendido ao pedir fogo do céu para consumir seus oponentes. Vivemos agora sob a égide da graça.


Vincent Cheung nasceu em Hong Kong em 16 de setembro de 1976, reside atualmente em Boston (EUA) e é autor de mais de trinta livros e centenas de palestras sobre assuntos como teologia, filosofia, apologética e espiritualidade. Sua influência é crescente entre teólogos e seminaristas brasileiros reformados e conservadores.


Confira o texto completo de Vincent Cheung aqui.


Para expor melhor o que penso sobre isso, resolvi republicar um texto de minha autoria, intitulado "Cristãos em defesa dos homossexuais."


Ei-lo, abaixo:


Cristãos em Defesa dos Homossexuais


Ficou escandalizado com o título do artigo?


Pois muito mais escandalizados ficaram os detratores daquela mulher pega em flagrante adultério, quando desarmados pela pergunta de Jesus.


Que Deus é contrário ao adultério, não pode haver qualquer dúvida. Ele corrompe relações, destrói lares, e de quebra, destroça a alma. Jamais encontraremos Jesus dizendo uma só palavra em apoio a este tão danoso pecado. Entretanto, lá estava Ele, se entromentendo em questão alheia, em defesa de uma adúltera.


Seu argumento foi imbatível: Quem não tivesse pecado, que se atrevesse a atirar a primeira pedra. Não duvido que alguns dos que se dispunham a executá-la sumariamente, haviam tido caso com ela. Talvez, o que os motivasse fosse uma espécie de “queima de arquivo”. Outros sequer a conheciam, mas em nome da moral e dos bons costumes, carregaram-se de pedras. Todos, porém, tinham algo em comum: o pecado. Nem todos eram adúlteros, mas alguns eram corruptos, outros difamadores, alguns mentirosos, outros dissimuladores, e por aí vai… Jesus os desmonta!


Mas será que valia a pena expor-se daquela maneira por uma despudorada?


A bem da verdade, Jesus nunca se preocupou com a opinião pública. Se fosse hoje, alguém o classificaria de liberal, ou qualquer outra categoria humana. Do ponto de vista do marketing, defender aquela mulher era cometer suicídio. Sua popularidade cairia. Sua moral seria questionada. Sua imagem maculada.


Às favas com a imagem! Muito maior valor tinha aquela vida!


E se fosse hoje? Se Jesus flagrasse um homossexual prestes a ser linchado, Ele igualmente o defenderia?

Os ‘puritanos’ dirão que não!


Bicha tem mesmo é que morrer!” Dá pra acreditar que já ouvi isso da boca de gente que diz servir a Deus?


Defendemos o direito dos fetos à vida, mas somos insensíveis ao ponto de não defendermos o mesmo direito para os homossexuais. Em vez disso, preferimos nos entrincheirar contra a comunidade gay, apontando o seu pecado, e nos fazendo o seu inimigo número 1. Há, inclusive, razões políticas para isso. Boa parte dos deputados que formam a bancada evangélica foi eleita em cima da “ameaça” do que eles chama de ditadura homossexual.


Enquanto isso, o número de homossexuais assassinados em nossas cidades cresce drasticamente. Será que um ativista gay pararia pra ouvir nossa mensagem, enquanto nos posicionamos contra suas reivindicações?


Não estou aqui afirmando que tais reivindicações sejam justas ou não. Caberá à sociedade com um todo julgá-las.


Mas talvez, se fizéssemos manifestações que denunciassem a violência sofrida por eles, ganharíamos seu coração, e assim, eles se disporiam a nos ouvir.


Semelhante àquela mulher adúltera, os homossexuais já têm muitos acusadores. Que nos posionemos ao lado de Jesus para defendê-los, em vez de ao lado de seus detradores para persegui-los!


Não estou, com isso, endossando seu estilo de vida. Assim como Jesus não endossou o adultério. Pecado é pecado, e ponto. Não há o que negociar. Porém, quem estabeleceu uma hierarquia para os pecados foi a religião, não Jesus. A prática homossexual é tão pecaminosa quanto mentir ao declarar seu imposto de renda. Antes de apedrejá-los, pense nisso.


O que os gays precisam é de alguém que os ame, os acolha, em vez de acusá-los e rechaçá-los.


Creiam-me. Não estou aqui buscando ser politicamente correto, nem tentando fazer proselitismo.


Possivelmente este artigo desagradará tanto a gregos, quanto a troianos. Porém, minha consciência se tranquiliza por saber que estou saindo em defesa da vida, e não de uma prática ou de uma agenda política.





Não posso me calar enquanto a cada dois dias um homossexual é assassinado no Brasil por conta de sua opção sexual. Ora, se a prática homossexual é pecado, a homofobia também o é.