sábado, 3 de setembro de 2011

Love Wins, de Rob Bell






BELL, Rob. Love Wins: At the heart of life’s big questions. London: Collins, 2011, 198 páginas.



Rob Bell é um dos mais populares pastores da atualidade nos Estados Unidos da América. Foi classificado pela revista Time, neste ano de 2011, como uma das pessoas mais influentes do mundo. Fundador da Mars Hill Bible Church, em Grandville – Michigan, Bell ficou conhecido mundialmente pela série de vídeos Nooma, com a qual fala de questões ligadas ao cotidiano, da perspectiva da espiritualidade cristã.



Love Wins [O amor vence] é o mais recente – e certamente mais polêmico – livro de Rob Bell. A obra foi mais falada antes de ir para as gráficas do que depois de seu lançamento. Seu vídeo de divulgação levou pastores a reagirem negativa e precipitadamente em algumas redes sociais, gerando uma grande polêmica sobre a [não]ortodoxia do autor, potencializando o número de vendas e levando Rob Bell para as principais revistas e emissoras de TV dos EUA.



Love Wins, como o sub-título da edição americana anuncia, fala sobre céu, inferno e o destino de todas as pessoas que já passaram pela terra. Com uma proposta de trazer de volta à mesa a discussão sobre estes que são assuntos centrais para a fé cristã, Bell fez ver que — para muitos — alguns temas são dogmaticamente intocáveis. [Re]Pensá-los é romper com a ortodoxia (qual?), assumir-se herege e ser digno de fogueira.



O livro começa com a reapresentação de diversas perguntas clássicas, tais como: “Deus pune pessoas por milhares de anos pelas coisas que elas fizeram em sua vida?”, “Se só alguns vão para o céu, como estas pessoas são escolhidas? Aleatoriamente?”, “As pessoas são salvas pela fé em Jesus? Qual Jesus?”. Bell provoca o leitor a repensar questões aparentemente já respondidas e fechadas, fazendo-o enxergar a importância de questionar assuntos muitas vezes equivocadamente dogmatizados ao longo da história.



Usando a analogia do pensador cristão Francis Schaeffer, é possível afirmar que Bell se propõe, no início do livro, a “destelhar a casa” de seus leitores para mostrar algumas possibilidades além daquilo que, por diversas razões, eles julgam ser verdade. Suas diversas perguntas instigam tanto os leitores que já têm uma pronta resposta para cada uma delas, bem como os que ainda não haviam pensado sobre o assunto.



A partir do segundo capítulo da obra, começam, então, as elucubrações concernentes aos dois grandes temas do livro: céu e inferno. O ponto de partida de Bell é a necessidade de se enxergar estas duas realidades como algo mais do que lugares físicos inaugurados em um futuro escatológico. Com razão, o autor argumenta que — geralmente — quem se preocupa muito com um céu ou inferno por vir se esquece da real presença deles entre nós. Em reação a essa tendência natural de se enxergar estas realidades sob uma ótica excessivamente futura e transcendente, o autor se empenha em mostrar quão presente e imanentes céu e inferno são.



Ainda que Rob Bell não tenha se proposto a fazer de Love Wins um livro com ênfases exegéticas, é nítida a influência do teólogo britânico N. T. Wright sobre ele em sua aproximação dos textos sagrados — em especial neotestamentários — nos capítulos 2 e 3 da obra. Segundo o autor, alguns termos bíblicos precisam ser revistos, já que costumam ser interpretados mais a partir de pressupostos teológicos e filosóficos do que exegéticos. Céu e inferno estão entre eles.



No quarto capítulo do livro, Bell aborda o suposto paradoxo revelado no desejo de Deus de salvar todos os homens, fazendo-os chegar ao conhecimento da verdade (1 Timóteo 2) e no fato de que muitos não encontrarão a salvação. “Deus consegue obter tudo o que deseja?”, é a pergunta do autor. Através da análise de diversas passagens bíblicas, Bell defende: “Deus, no fim, não consegue obter tudo o que deseja, já que alguns voltarão, se arrependerão e crerão, ao passo que outros não” (Bell, 2011, 103). Sua explicação para isso se dá nos seguintes termos: “Deus precisa respeitar nossa liberdade última de escolher, mesmo que isso seja um risco à nossa relação. Se, em algum momento, Deus invade o coração humano, então ele viola a essência fundamental do que é o amor” (Bell, 2011, 103-104). Na leitura de Bell, a liberdade que o amor demanda explica a não obtenção, por Deus, de tudo o que ele quer.



Nos capítulos 5 e 6, Bell discorre sobre a importância da cruz como símbolo eterno do convite de Deus para que sejamos parte da nova criação. Morte e ressurreição se apresentam como o caminho para a vida. E o convite para a redenção e obtenção da vida tem uma abrangência maior do que nossa mente é capaz de contabilizar.



Os dois últimos capítulos do livro tratam da necessidade e urgência de se repensar a experiência que cada um — no presente momento — vive com o céu e/ou inferno. Ao afirmar que o fim é aqui, Bell não se apresenta como um existencialista descrente no futuro. Tampouco elimina a tão cristã esperança escatológica. Antes, reforça que a realidade futura de cada indivíduo é fruto das escolhas presentes pelo céu e/ou inferno.



Sobre o tão sugerido universalismo de Rob Bell, o livro pouco fala. Mostrando que a compreensão da salvação de todos os homens é uma tese sustentada por cristãos desde os primeiros séculos desta era, o autor se limita a dizer que não cabe ao homem dizer quem vai para este inferno futuramente inaugurado. É mais importante, ele sugere, cuidar de quem está vivendo o inferno estabelecido no presente, uma vez que o que Deus tem para os homens não é algo a começar, mas que já está entre nós.



Honestamente, lendo o livro pouco pensei no dito universalismo do autor. Em se tratando de heterodoxia, chamou-me mais a atenção a ideia de um Deus de amor de braços atados e limitado pela liberdade do que alguma possível parte — que eu mesmo não encontrei — que dê a entender que todos, no final, serão salvos por Deus. Gosto de quem se propõe a pensar e não me vejo no direito de dizer quem está dentro e quem está fora. Ortodoxia orgulhosa, a mim, escandaliza mais do que heterodoxia generosa.



Não foi o livro do ano, mas me fez refletir sobre muito do que foi escrito e gerado a partir de sua existência. No final, ele tem razão: o amor vence — dê a você isso o direito de pensar o que quiser a respeito de quem escreveu e de quem, concordando ou discordando, leu.


Por Daniel Guanaes é pastor presbiteriano e doutorando em Teologia pela Universidade de Aberdeen, Escócia.



Vi no http://www.novosdialogos.com/artigo.asp?id=669

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