Hermes C. Fernandes
Nunca liguei muito pra grifes. Recentemente, num shopping outlet aqui de Orlando (Prime), enquanto degustava um café gelado no Starbucks, esperando minha esposa e filhos que faziam compras, fiquei observando as pessoas desfilarem com suas roupas e calçados de grifes famosas. De fato, neste shopping é possível comprar boas roupas por ótimo preço.
Muito antigamente, não havia etiquetas. As roupas eram feitas sob medida por costureiras e alfaiates anônimos. Mais tarde, criou-se a etiqueta para identificar o fabricante, porém esta ficava escondida do lado avesso. Ainda mais tarde, algumas calças jeans começaram a exibir sua marca discretamente, costurada do lado externo do bolso. Agora, tenho a impressão que as pessoas usam a etiqueta, e não a roupa. As pessoas fazem questão de exibi-la, porque tornou-se sinônimo de status. O que elas não percebem é que estão fazendo propaganda dessas marcas, sem receber nada por isso.
É claro que para que uma marca se destaque no mercado, tem que satisfazer seus clientes com produtos de qualidade. Aos poucos vai conquistando credibilidade junto ao mercado, e às vezes, chega a valer mais do que seus produtos. A marca “coca-cola”, por exemplo, é uma das mais valiosas do mundo, ultrapassando em valor os seus produtos.
Não há nada de errado em querer usar um produto de grife famosa. O problema é quando isso passa a nos definir.
Não sou o que uso, o que como, o que visto, nem mesmo os lugares que frequento.
Então, o que nos definiria?
Muitos dos que seguiam a Jesus, seguiram antes a João Batista. E desde que este apresentou seu primo da Galiléia como “o Cordeiro de Deus”, o número de seus seguidores caiu drasticamente. Questionado acerca disso, João respondeu: “Convém que Ele cresça, e eu diminua”. Mesmo acusado de ter cometido suicídio ministerial, João estava convicto de que cumprira sua missão, e que agora deveria sair de cena para ceder lugar ao tão esperado Messias.
Certo dia, depois de responder a alguns enviados de João acerca de Sua identidade e missão, Jesus dirigiu-se à multidão, e perguntou: “Que fostes ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento?” (Mt.11:7). Diferente de Jesus que desenvolveu um ministério urbano, João escolheu o deserto como cenário de sua missão. Seu ministério contrariava todas estratégias apontadas pelo marketing para que se alcance êxito. A começar pela localização. Quem, em sã consciência, faria de uma região inóspita seu QG? Mas o fato é que João conseguiu arrastar uma multidão para o deserto. E isso, sem apelar à perfomances miraculosas ou a sermões populescos.
Aquele profeta excêntrico não era definido pelo ambiente.
Jesus prossegue com suas perguntas à multidão:
“Sim, que fostes ver? Um homem ricamente vestido? Os que trajam ricamente estão nos palácios dos reis” (v.8).
Somos informados em outras passagens que João se vestia como um homem das cavernas. Em vez de linho, pele de camelo. Bem diferente de Jesus, que trajava uma túnica que foi disputada pelos soldados romanos que o crucificaram. Porém, nenhum dos dois era definido por aquilo que vestia. Jesus se vestia para a cidade. João, para o deserto. Nenhum estava preocupado em impressionar quem quer que fosse. Embora as portas dos palácios sempre estivessem abertas para recebê-lo, mesmo que sua mensagem fosse, às vezes, ofensiva ao rei, o Batista se sentia mais à vontade no deserto.
Jesus prossegue:
“Mas, então que fostes ver? Um profeta? Sim, vos digo eu, e muito mais do que profeta. João é aquele de quem está escrito: Adiante da tua face envio o meu anjo, que preparará diante de ti o teu caminho” (vv.9-10).
Eis o que o definia: o propósito de sua existência. Sua missão era preparar o caminho para Cristo. Ao cumpri-la, João declarou: “Agora, minha alegria está completa”. Quanta satisfação há em cumprirmos nossa missão! É isso que nos torna pessoas realizadas. Engana-se quem imagina que a sensação de realização dependa da aquisição de bens materiais. Muito mais do que a sensação que temos quando adentramos um carro zero e inalamos aquele cheiro de estofado novo, muito mais do que quando fazemos aquela tão sonhada viagem, muito mais do que quando pára aquele caminhão em frente à nossa casa pra descarregar os móveis novos, é a sensação sublime de havermos cumprindo nossa missão.
Somos, portanto, definidos pela nossa vocação. Somos aquilo para o qual fomos enviados ao mundo. Nem mais, nem menos.
Um pouco mais adiante no texto, Jesus diz:
“Mas, com quem compararei esta geração? É semelhante a meninos que se assentam nas praças e gritam aos seus companheiros: Tocamo-vos flauta, e não dançastes; cantamo-vos lamentações, e não chorastes. Pois veio João, não comendo nem bebendo, e dizem: Tem demônio. Veio o Filho do homem, comendo e bebendo, e dizem: Eis aí um homem comilão e beberrão, amigo de cobradores de impostos e pecadores” (vv.16-19a).
Definitivamente, João e Jesus tinham estilos completamente diferentes. João se alimentava de mel e gafanhotos. A dieta de Jesus era basicamente pão, peixe e vinho. João parecia um eremita, preferindo a solicitude do deserto. Jesus vivia cercado de gente, e nem sempre gente da melhor estirpe. Porém, nenhum dos dois era definido pela companhia, pelos ambientes que frequentavam, ou mesmo pelo estilo. Se o adágio popular que diz “diga-me com quem andas, e direi quem tu és” estiver certo, teremos que presumir que Jesus não era lá estas coisas…
Jesus não se deixava definir nem pela maneira como as pessoas O recebiam. Suas opiniões não O afetavam. Chegaram mesmo a acusá-lO de estar possuído de demônios. Mas Jesus não dançava conforme a música que tocavam. Seu compromisso era com a agenda do Reino de Deus, e não com as expectativas humanas. Se dependesse de alguns de Seus discípulos, Jesus teria Se aproveitado da enorme popularidade que alcançara em Jerusalém para tomar o poder, organizar um exército e banir de lá os romanos. Porém, Sua mensagem era tão subversiva que não servia a qualquer interesse político, quer das castas sacerdotais, ou das classes populares.
Que digam o que quiserem sobre nós. Que nos julguem pela embalagem, pela maneira como nos vestimos ou pelo carro que dirigimos, ou mesmo pelos amigos que temos. Não importa! Nada disso poderá distrair-nos de nossa missão. Como João, creio que fomos enviados a preparar caminho para as próximas gerações, e sobretudo, preparar o caminho para Cristo.
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