sexta-feira, 2 de setembro de 2011

As milhares de faces de um Deus invisível e desconhecido





A grande maioria das pessoas chamadas a descrever Deus, seja no ocidente ou no oriente, invariavelmente, começam por mencionar o caráter uno dele. Em outras palavras todos procuram determinar a existência de um Deus único.

Culturas mais primitivas cultuavam vários deuses ao mesmo tempo e ainda temos alguns exemplos disso, nos dias de hoje.

Então somos adeptos do monoteísmo e nossas principais religiões buscam uniformizar e extrair uma descrição capaz de uniformizar a imagem do dono do universo.

Nos últimos dias, fomos premiados com uma descrição impressionante de Deus por nosso amigo Paulo Brabo, um dos melhores blogueiros disponíveis, segundo consenso geral, e muito admirado pela comunidade religiosa de verve cristã. Creio que, quando a sua imagem de Deus é essa, dificilmente você manterá uma relação do tipo pedir-e-dar-se-vos-a. Muito mais provável que você queira ter com ele a mesma relação que o diabo do Brabo imaginou naquele momento, ou seja, de salvador de Deus e não o contrário, como é mais comum.

Se pensarmos melhor, o Brabo não tem o privilégio de imaginar ou conceber uma imagem única de Deus. Em breve, a comunidade pertencente à Igreja Presbiteriana do Brasil e adeptos estará recebendo o conhecido pregador John Piper para reafirmações da concepção calvinista do Deus dessa comunidade, sempre repleta de fatalismos e predestinações. Nas últimas décadas, Billy Gramm foi o mais importante descritor de Deus na embalagem batista onde habitualmente há verdadeiros tsunamis de água para todos os lados. Kenneth Hagin despontou, ao mesmo tempo, como o grande expoente de um Deus cheio de prosperidade para dar e vender. Lembro de Rick Warren e seu Deus cheio de propósitos mercantilistas, de Phillip Yancey com seu Deus insurgente, Brennan Manning e o Deus maltrapilho dele ou ainda o Henry Nouwen que enxergou um Deus extraordinariamente indulgente no pai do Filho Pródigo. Assim por diante, cada denominação ou segmento do Deus evangélico, católico, muçulmano, judeu, etc., apresentará sua própria pintura de Deus.

Seguramente o fenômeno não para por aí. Com toda certeza, cada uma das pessoas adeptas dessas religiões e/ou seitas também possuirão, cada uma, sua própria versão da imagem do divino. Podemos ir além e afirmar, sem medo de errar, que se houver nesse planeta alguns bilhões de criaturas confessoras de sua crendice em Deus, teremos igual número de descrições ou criações de deuses.

Nesse balaio ainda podemos incluir as várias imagens bíblicas de Deus, com destaque para o Deus Pai de Jesus, o Deus mais rancoroso de Paulo, o Deus invisível mas audível de Elias, o Deus feito de luz intensa capaz de cegar de Moisés e o Deus rei e tirano da maioria do pessoal do Antigo Testamento. Sem falar nas descrições que os personagens faziam dos deuses dos outros povos, geralmente inimigos, como Ezequias orou: “Ele criam em deuses que deuses não eram, eram deuses de pedra e pau”

Boa essa ajuda de Ezequias ao nosso tema, afinal se há uma certeza, pelo menos uma, nisso tudo, é o fato de que Deus é uma concepção individual existente na mente de cada pessoa. Sendo assim, embora a maioria se de bem falando com um Deus que está dentro de si, seja lá onde for, muitos preferem criar uma representação exterior dessa invenção. Refiro-me a esses deuses lembrados por Ezequias e a tantos outros conhecidos, seja em forma de astros e estrelas, de árvores, de animais e um monte de cacarecos usados para esse fim. Com isso devem sentir-se menos ridículos quando falam com seu Deus.

Quando Moisés desceu daquele morro trazendo nas mãos sua obra prima, se podem lembrar-se, duas placas cuidadosamente esculpidas a partir de algum tipo de pedra, semelhante a um tipo de pedra sabão, tão a gosto de nosso escultor maior, o Aleijadinho. Nelas entalhou seus dez mandamentos. Para sua grande surpresa, encontrou o povo que deixara esperando na sala de espera de seu monte, cultuando o Deus que eles próprios cunharam enquanto aguardavam o zangado líder da matilha. Criaram Deus na forma de um bezerro de ouro.

Não podemos esquecer que dois quartos da humanidade dos nossos dias imagina Deus como um ser obeso e inerte, sentado com cara de oriental sábio e pensativo. Outro quarto concebe um Deus altamente vingativo, na base de olho por olho e dente por dente. Mas todos esses também, dentro de suas unanimidades, possuem a mais completa diversidade de deuses possível e imaginável, porque cada um concebe seu Deus à sua maneira.

Confesso que não consigo mais ouvir ninguém falar sobre Deus sem pensar que ali está alguém fazendo sua própria descrição de um Deus que só ele conhece. Pois está dentro dele mesmo e não há como coloca-lo para fora, a não ser em espasmos criativos como fez o Brabo, os inimigos de Ezequias, os índios, as tribos africanas e todos os demais que deram forma a seus deuses. Sei que pode parecer pretensão, mas até eu tenho a minha versão interna de Deus, pior, ela foi se modificando com o passar dos anos. Imagino que isso também deve acontece com o Deus de cada um, o que pode multiplicar exponencialmente a quantidade de deuses existentes.

Isso não deve dar a você, ou quem quer que seja, ensejo para imaginar bobagens do tipo: ele não crê mais em Deus. Como já disse antes, estou contaminado eternamente com a ideia de que há um Deus. A diferença reside no fato de que, para mim, ninguém conhece ou conheceu a Deus, exceto Moisés e Elias com suas visões parciais e reduzidas do Criador e Jesus que antes de encarnar, já era filho dele. O resto e tudo que se diz, escreve, desenha, pinta, esculpe e sei lá quantas outras formas de representa-lo, não passam concepções humanas de um ser imaginário. Ele existe, mas ninguém o conhece e, portanto, será capaz de representa-lo, descrever-lhe ou explica-lo, muito menos.

Imagino que estou alimentando potencialmente o apetite dos meus amigos preferidos, os psicólogos, sempre ávidos por mais motivos teológicos capazes de justificar sua atividade desnecessária e rentável. Entretanto, criamos nossos próprios deuses por não conhecermos o Deus original e, principalmente porque temos medo do que pode acontecer conosco, com nossos semelhantes, sobretudo os mais próximos, com nosso planeta tão maltratado e com o resto do universo. Especialmente se Deus não existir, afinal e estivermos todos equivocados quanto a esse detalhe.



Por Lou Mello






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