quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Aprendendo com os Inimigos



Em algum momento durante nossa transição da Guerra Fria contra o comunismo a uma cruzada perpétua contra a ideia evasiva chamada “terror”, nossa compreensão popular sobre as palavras de Jesus — “Ame os seus inimigos” (Mt 5.44) — também mudou. Um mandamento que tinha sido escrito como ideia bem-intencionada de idealistas se tornou uma condenação um tanto cínica e farisaica de uma guerra que muitos americanos agora recusam ser sua. Assim, nós temos uma frase de pára-choque: “Quando Jesus disse ‘Ame seus inimigos’ ele provavelmente não quis dizer mate-os”. Suficientemente verdadeiro, mas como a antiga leitura desdenhosa das palavras de Jesus, este realismo cínico exige a pergunta: “O que um líder popular de um movimento popular na Palestina ocupada possivelmente queria dizer quando ele falou para as vítimas de violência direta e sistêmica que deveriam amar seus inimigos?

Num Ocidente cada vez mais pós-cristão, muitos têm decidido que preferem buscar seu caminho sem Jesus e outros fanáticos religiosos. Com tanta matança acontecendo em nome de Deus, eu posso entender essa decisão. Mas a igreja pode estar tendo uma real oportunidade aqui para usar sua vida no mundo para mostrar o que quer dizer ler Jesus como um estrategista — alguém que sabia como liderar um movimento subversivo cheio de esperança numa situação onde ele e seu povo não estavam no comando e não poderiam expulsar os romanos. Se vamos fazer isto, então, temos que amar nossos inimigos, pelo menos para aprender com eles. Afinal, a Al Qaeda sabe mais sobre imaginação estratégica que qualquer dos nossos seminários.

A hegemonia da cristandade tem paralisado nossa imaginação quando se trata de se mover das boas novas do bom reinado de Deus para viver a nova vida. Nós ouvimos as boas novas e estamos felizes. Mas quando tentamos organizar a nova vida, nos encontramos com discordâncias frustrantes e cansativas. Não podemos encontrar consenso sobre as melhores estratégias para reorganizar a sociedade e somos tentados a pensar que a principal coisa se colocando no nosso caminho é aquele grupo de outros cristãos que não subscreverão nosso plano.

Talvez o que nós mais necessitemos são algumas lições de nossos inimigos. Embora sua mensagem seja equivocada e perigosa, estou impressionado pela habilidade da Al Qaeda de mover as pessoas das notícias para uma nova vida. Os membros da Al Qaeda não sabem a distinção entre um crente e um seguidor. Aceitar a visão de mundo da Al Qaeda requer que as pessoas dêem suas vidas inteiras dia após dia, mesmo até a morte. Algumas vezes as notícias sobre Al Qaeda soam dramaticamente similares as que os romanos diziam sobre as primeiras comunidades cristãs.

Considere “liderança”: Osama bin Laden é claramente o líder espiritual e o cérebro estratégico da missão da Al Qaeda. Ele descreve o mundo de uma maneira que conecta pessoas comuns num movimento global. Mas tendo feito isto, ele não é necessário para a sobrevivência do movimento. A administração é descentralizada. Novos líderes são empoderados através do discipulado. Matar bin Laden ou qualquer outro líder reconhecido da Al Qaeda apenas convencerá ainda mais os fiéis de que a mensagem é verdadeira. Como Tertuliano disse dos cristãos no segundo século, “o sangue dos mártires é a semente da igreja”.

Esta autoridade descentralizada e centrada numa narrativa sobre o mundo requer um tipo diferente de estrutura organizacional. Você não precisa de um prédio, de funcionários contratados e de um plano estratégico para começar uma nova célula da Al Qaeda. Estes grupos subversivos de fiéis autênticos se reúnem porque o modo de ler o mundo da Al Qaeda faz sentido para suas vidas. Eles não querem estar sozinhos na sua luta contra poderes muito maiores; então, eles se reúnem com outros para compartilhar a sobrevivência no meio da pobreza e fortalecer uns aos outros a fim de encontrar maneiras de subverter o mundo como ele é. Ainda que haja, sem dúvida, negociações estratégicas sobre onde investir dinheiro ou como espalhar melhor a mensagem, a Al Qaeda não precisa de um plano geral para se expandir. Ela se espalha como a erva no campo enquanto as pessoas se reúnem em torno da sua visão.

Embora Al Qaeda seja profundamente desconfiada de tudo o que é ocidental, é importante observar como a organização usa a tecnologia. Colocando de modo simples, seus seguidores parecem ter a capacidade de usar a tecnologia sem deixar que a tecnologia os domine. Telefones celulares, Internet e aviões são todas ferramentas potenciais para eles. Mas elas não definem suas vidas, mesmo a dos membros mais ricos da Al Qaeda. Que bin Laden possa gravar vídeos e colocá-los na Internet sem revelar sua localização é uma prova disso. Me lembra de um fórum em que participei num monastério beneditino no qual o abade compartilhou suas preocupações sobre como a tecnologia pode assumir o controle de nossas vidas. Um convidado no auditório protestou: “Mas não podemos ficar na Idade das Trevas”. “Claro que não”, disse o abade, buscando embaixo de suas vestes de monge para tirar um telefone celular de seu bolso. “Mas podemos mostrar ao mundo como usar isto e ainda ouvir a Deus?”

Prestando atenção no modo como os membros da Al Qaeda usam a tecnologia ajuda-nos a compreender o modo como interagem com um mundo onde não estão no controle. Eles sabem que não podem tomar Washington ou Londres. Mas eles também sabem que não precisam fazê-lo. Entrando desapercebidamente pelas frestas, eles atacam e iludem, apenas para desaparecer antes que as armas tenham tido tempo de apontar suas miras sobre eles. Isto é, certamente, uma maneira vagarosa de vencer. Mas é também uma maneira que não pode ser erradicada. A única maneira de desmantelar a Al Qaeda de uma vez por todas é se livrar de todos que estão conectados com ela.

Deixe-me esclarecer: Eu não estou dizendo que se você não pode com eles, junte-se a eles. Al Qaeda é nossa inimiga. Mas Jesus disse que devemos amar nossos inimigos. Mesmo se este amor não os conquista para o nosso lado, o tipo de atenção que o amor demanda pode nos ajudar a aprender mesmo das pessoas que nos odeiam. Eles podem nos ensinar algo sobre como Deus está nos chamando para viver no mundo. Especialmente agora, quando nosso lugar social é tão longe do de Jesus, é bom ouvir cuidadosamente aqueles que vivem num contexto muito mais próximo daquele da Palestina do primeiro século.

Aqueles que dirigem as grandes instituições eclesiais na América estão dolorosamente conscientes que nós temos de encontrar um caminho melhor. Os pastores estão indo embora, congregações estão desaparecendo e as novas gerações se importam cada vez menos com a igreja convencional. Ao mesmo tempo, há um aumento no ativismo religioso nesse país. Os jovens estão famintos por comunidade, e muitos deles estão conectando-se às tradições antigas da igreja. Nas ruínas aparentes da Cristandade, um novo monasticismo está emergindo. O que é mais surpreendente, talvez, é que sua organização se parece mais com a da Al Qaeda que com qualquer modelo denominacional.

Na história da igreja, a renovação tem vindo quase sempre das margens. Raramente as instituições têm a imaginação para se verem transformadas. Mas aqueles que atuam desapercebidamente, seduzidos pelas notícias que os forçam para uma nova vida, podem fazer experiências com novas formas de fidelidade. Estas pequenas células nem sempre entendem mas elas podem se tornar lugares onde a igreja inteira pode aprender de novo a imaginação estratégica de Jesus. Quem sabe? Sozinho, o mandamento de Jesus de “amar os inimigos” pode ser suficiente para nos salvar.

Por Jonathan Wilson-Hartgrove

Publicado originalmente em: http://collegevilleinstitute.org/Bearinglearning


(Tradução Flávio Conrado)


Vi no http://www.novosdialogos.com/blog.asp?id=13

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