Só agora, muito mais velho, é que venho perdendo o medo de viver. Estranho, não?
Perco o medo de dizer não. Antigamente, negociei vários momentos preciosos que poderia passar ao lado de pessoas queridas porque temia magoar quem cobrava minha presença. Aconteceu que comecei a levar pontapés no traseiro exatamente daquelas pessoas para quem eu me desdobrava em não magoar. Decidi que serei mais franco, mais honesto quanto ao meu tempo.
Perco o medo de ser eu mesmo. Outrora, escondia-me do olhar dos religiosos que se escandalizavam se eu vestisse uma bermuda ou andasse de chinelas. Adiei por anos a decisão de parar de me enforcar com gravatas e me derreter dentro de paletós, “porque seria inadmissível que um pastor usasse a Escrivaninha Sagrada sem a indumentária própria” – Que horror!
As concessões ridículas foram muitas: a tradução da Bíblia tinha que ser a mais antiga; no culto, devia encaixar uns dois cânticos do hinário “para não magoar os mais tradicionais”; era obrigado a proibir que mulheres vestissem calça comprida, “porque só a próxima geração suportaria tamanha mudança nos costumes”. Aconteceu que meus olhos se abriram. Vi a hipocrisia dos religiosos que se engasgavam com farelos e engoliam tijolos. Portanto, para mim chega de fazer concessão aos falsos moralismos dos colegas de Anás de Caifás.
Perco o medo do olhar sisudo dos xerifes da fé. Há pouco tempo eu ficava consternado em saber que um professor de seminário envenenava seus alunos contra mim e que o “mainstream” evangélico me enxerga como um herege. Fui sistematicamente caçado por alguns notórios e queridos teólogos que me consideraram pernicioso para a fé.
Confesso que me abati tremendamente, mas quando soube que um deles afirmou que considerava a guerra do Iraque uma bênção “porque abriria portas para a evangelização do mundo Árabe”, pensei: “Êpa! Quer dizer que perguntar, provocar tensão conceitual, é uma apostasia inominável? O que dizer então de quem se posiciona ao lado do facínora que bombardeou inocentes”?
Dá um tempo, por favor. Sim, é verdade. Critico a literatura comercial do Max Lucado, o americanismo obturado do Pat Robertson e o fundamentalismo do tipo “fogo-enxofre” do John McArthur. Mas nada do que já escreveram ou disseram foi tão abjeto quanto a defesa ostensiva que prestaram ao presidente George W. Bush, quando ele precisou de apoio para destruir uma nação inteira. Quero só saber se os fundamentalistas brasileiros terão coragem de cobrar um “mea culpa” dessa turma.
Perco o medo de afirmar meu gosto musical, minha liberdade etílica, meus passatempos irracionais (correr maratonas, por exemplo), meus êxtases artísticos, minha repulsa a banana e meu medo de barata. Acredito que um homem já coroa pode dar-se ao luxo de viver com mais leveza, e é isso o que venho fazendo. Até porque, foi para a liberdade que Cristo me libertou.
Soli Deo Gloria.
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