“Quem seria Platão se não tivesse existido o conflito entre a dialética de Heráclito e os paradoxos de Zeno?”
Pretende-se demonstrar no presente texto que, quando uma teologia é tencionada para um lado do elástico epistemológico, sem considerar o outro, ela se torna excessiva.
Por teologia tencionada, entende-se o conflito da dialética – conflito entre tese e antítese em prol de uma nova síntese – Por um instante, refutar uma teologia se torna fácil, mas ser sincero diante da ignorância de tal refutação, não. A teologia excessiva por outro lado, é uma exegese ilusória, que procura demonstrar que existe uma teologia correta, e outra errada.
Sem o anseio de advogar por qualquer tratado teológico, mas, por um emergentismo teológico, posso dizer que a teologia se vulgarizou nas dimensões do simbólico, levantando-se acima da causa primeira. O “vamos fingir que as teologias funcionam”, oculta o fato de que as instituições eclesiásticas cristãs contemporâneas estão perdendo espaço, e que, de fato, a maioria das pessoas já não mais acreditam nelas. Os fatos catastróficos que um dia comprometeram a teologia ortodoxa, estão à tona mais uma vez, aniquilando o que sobrou dela; o fato da ortodoxia tentar sobressair o processo evolutivo acaba comprometendo sua imagem. Existe um conto britânico muito interessante que de alguma forma, explica essa soberba teológica comprometedora de hoje:
Dois conterrâneos não se viam há mais de anos devido a tragédia da segunda guerra mundial que sucedeu-se na vida de um deles. O prejudicado pela guerra, depois de algum tempo, voltou à sua terra natal para rever a região e o velho amigo. Quando chegou na terra que um dia morou, a primeira coisa que fez foi visitar o saudoso companheiro de infância. Chegando na casa do camarada se abraçaram e, rapidamente, aquele que “aparentemente” havia-se dado bem por não ter ido à guerra, foi mostrar ao colega sua propriedade; alguns terrenos protegidos por duas diferentes cercas.
Depois de horas mostrando tudo que havia construído, e tentando sobressair-se sobre o veterano que, em silêncio pensava sobre a lógica de tudo, de forma irônica o sujeito iludido perguntou:
- E você, que fez da vida depois da guerra? O que construiu?
Sem jeito, o amigo visitante comentou de suas lutas e disse que, por sorte, adquiriu uma fazenda ao qual, se dirigisse com seu carro durante duas horas ao Norte da região que se encontravam e voltasse, possivelmente não chegaria ao final das terras que ganhara.
O amigo, agora com uma certa inveja, retrucou:
- Ah, sei como é que é, eu tive um carro desses!
Como num jogo mimético, a teologia excessiva sai procurando por um culpado, e acaba se auto condenando. Ela segue isolando cada vez mais o homem de seu território, do cenário do seu destino, de sua queda ou elevação, e sua indústria fica sobrevivendo do desejo de evitar que, o cristão, por si só, descubra sobre sua certeza comercializável. Um fato muito interessante para descrever tal situação, é o problema entre os franceses em interpretar a natureza do fenômeno social religioso de Èmile Durkheim: Crentes, no âmbito francês, tendem a ver em Durkheim um ateu que reduziu a religião ao social, enquanto os anglo-saxônicos, curiosamente, o consideram uma espécie de místico que reduziu a sociedade ao religioso. Como se não bastasse, a revista norte americana Time, no início de Março desse ano, lançou uma matéria mostrando que desde 1990, o número de pessoas sem afiliação religiosa nos Estados Unidos dobraram, colocando a Igreja num momento sociológico muito delicado diante de um ano eleitoral. Em última análise, percebe-se que, não existe mais “Teologia” – que leva em consideração os aspectos importantes que permanecem dentro de nossa existência -, mas sim, a teologia em que minha tribo considera.
Poder-se-á observar igualmente, devido aos fatores climáticos, tecnológicos, financeiros e evolutivos, que uma teologia excessiva só se mantém em pé ainda, devido à nossa situação humana infeliz, tentando dar um escape ao qual, de certa forma, é causa principal de todo conflito teológico – Por isso sempre digo: “Observe com cuidado! Possivelmente o que fazes, pode ser a causa inicial do problema que tentas combater”. Mas mesmo assim, devemos considerar a indagação: Chegará um dia ao fim tal teologia? Creio que não, mais acredito na sua emergência e necessidade. Na possibilidade de um novo lema dominante que ditará o seguinte para qualquer argumento teológico excessivo ou dialético: Se você só deseja falar sobre sua ortodoxia, crença ou fé, sem a intenção de considerar o progresso humano, a situação dos oprimidos, o problema homossexual, e as novas fronteiras que ainda aparecerão, por favor, cale-se sobre seu Deus.
Desde os tempos de Jesus, tal sobejo teológico foi bem representado pelos fariseus; sim, isso sempre existiu. Quando a experiência do cego curado por Cristo foi levada aos fariseus, eles, com suas leis, indagaram perguntando ao cego se Jesus era pecador ou não. Desapercebidamente, o eis cego, sem romper com os lados propostos – duvida e crença -, não compromete sua fé, e diz : “Eu não sei. Uma coisa sei, eu era cego e agora vejo” – Duvidou das leis apresentadas sem comprometer aquilo que não podia duvidar. Não desiquilibrou a tensão.
De um outro jeito, o apóstolo Paulo nos mostra também que a fé não pode ser abstraída entre sim/não, duvida/certeza, preto/branco e nos exorta : Não há judeu nem grego; não há escravo nem livre; não há homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus -Gálatas 3:28.
Diria o franciscano Richard Rohr sobre tudo isso: “Pessoas que sabem como quebrar as regras criativamente, também sabem porque as regras estavam lá em primeiro lugar. Eles não são meros iconoclastas ou rebeldes”.
Finalmente pode-se invocar mais um argumento, lembrando que, não temos um critério pelo qual podemos definitivamente verificar se as nossas escolhas teológicas são corretas ou não – As Escrituras já provaram sua deficiência nisso.
Temos o Cristo – a Bíblia de muitas faces -, ao qual pela fé, cremos que através dos muitos fatores da vida e do processo, sempre nos traz uma visão absolutamente diferente da nossa, aonde nos conduz a uma certa noção do divino que corresponde perfeitamente a sua sujeição: “Que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus”.
Vale também salientar o raciocínio inverso: Além de ser dialético, o homem é um ser lógico e, no que diz, ou melhor, no que conta, nas queixas, tenciona não só relatar, mas testemunhar e, em segredo – inconsciente -, deseja que a qualidade de sua teologia se transforme em força moral, geradora de leis. Não é a toa que os teólogos mais originais dos últimos tempos são originais, não por produzirem algo novo, mas apenas porque são capazes de dizer as coisas que dizem como se elas nunca antes houvessem sido ditas. Enfim, a crise teológica nada mais é que a evolução do homem na própria teologia. A única coisa que não pode acontecer é negar tal crise, negar tal aperfeiçoamento, ou sabotá-lo com nossos argumentos, construindo assim no final, uma nova prisão que há muito tempo já fomos libertados.
Portanto, desejar combater uma teologia, ou muito menos impor uma nova – essa é a força motriz de todo fundamentalismo; a farsa – , é perca de tempo. Sim, devemos estica-las, observar suas demandas, alterá-las, e desconsiderá-las se não sobreviverem a tensão – Isso já diria Hegel. Mas, nesse processo, devemos conjuntamente no progresso e no atraso do homem, procurar por rumos teológicos eficazes que possuem capacidades de melhorar a sorte do Planeta, da sociedade, e de trazer o bem à todos.
Vi no http://nelsoncostajr.com/2012/03/nao-disfarce-sua-teologia/
segunda-feira, 19 de março de 2012
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