sábado, 21 de janeiro de 2012

Não é a primeira, mas a última impressão a que fica





Por Hermes C. Fernandes


 
Meu passaporte está cheio de carimbos dos países por onde passei. A primeira vez em que foi carimbado foi em 1991. Este ano faz 20 anos desde que pisei pela primeira em solo americano. Aquela impressão desbotou-se com o tempo. Ainda dá pra vê-la, porém, sobrepostos a ela, há muitas outras mais recentes. Sem contar que de lá pra cá, já troquei meu passaporte duas vezes.
Todos nos preocupamos com a primeira impressão que deixamos, pois cremos que ela é a que fica. Porém, aprendemos com a própria Escritura, que no Reino de Deus esta verdade é subvertida. A última impressão é a que fica.
Permita-me tomar um exemplo das páginas sagradas:
Pedro e João haviam sido presos pelas autoridades judaicas. Acusação: subversão da ordem por haver curado um coxo à porta do templo. Após ouvi-los expor a razão que os levara a realizar aquele milagre, as autoridades ficaram maravilhadas com sua ousadia. Confira o texto:


“Então eles, vendo a ousadia de Pedro e João, e informados de que eram homens sem letras e indoutos, se maravilharam, e tinham conhecimento de que eles haviam estado com Jesus” (At.4:13).
De que Pedro estamos falando aqui? Daquele mesmo que negou Jesus por três vezes pouco mais de cinqüenta dias antes deste milagre. O mesmo pescador que acompanhou o Mestre por pelo menos três anos, mas ainda assim foi capaz de emprestar seus lábios a Satanás para dissuadi-lO da cruz. Ainda em um dos seus últimos encontros com Jesus, Pedro demonstrou-se incomodado com o destino que teria João, que parecia muito mais confortável que o seu próprio destino. Rústico, de temperamento sangüíneo, emocionalmente instável, covarde, de repente… transforma-se num poderoso orador, capaz de realizar milagres no nome de seu Mestre. Como explicar isso? Como explicar que Pedro e João, que antes pareciam rivais, agora subirem juntos ao templo para orar? Como explicar sua excepcional desenvoltura no uso das palavras, em se tratando de homens incultos? A conclusão das autoridades não podia ser outra: “Eles haviam estado com Jesus”!
A última vez que estiveram pessoalmente com Jesus foi onze dias antes deste ocorrido, quando o Senhor foi assunto ao céu. Que impressão Jesus teria deixado neles, então? Teria sido aquela a última impressão? Acredito que não!
Já tentou usar um carimbo sem antes molhá-lo na carimbeira? Pode até ficar o relevo no papel, mas aos poucos sua superfície voltará ao normal. Mas quando molhamos o carimbo, além do relevo, fica também a marca da tinta.
Pois foi justamente isso que aconteceu quando os discípulos receberam o carimbo do Espírito Santo no dia de Pentecostes. Aquela foi a última impressão! Ou melhor, a impressão definitiva. Não me surpreende o fato de que Paulo use a expressão “selo do Espírito” para aludir à tal experiência. “Selo” é o equivalente a “carimbo”.
Quem quer que receba tal impressão do Espírito, há de ser reconhecido, mesmo pelos descrentes, que tem estado com Jesus.
Só podemos expressar aquilo que antes foi impresso em nossos corações. Sem impressão, não há autêntica expressão.
Jesus, por exemplo, é chamado de “a expressão exata” de Deus (Hb.1:3). E o que Lhe dava a habilidade de expressar com exatidão o ser divino? Ele mesmo responde: “Trabalhai, não pela comida que perece, mas pela comida que permanece para a vida eterna, a qual o Filho do homem vos dará, porque Deus, o Pai, o marcou com o seu SELO” (Jo. 6:27).
Era a presença do Espírito Santo em Cristo que Lhe capacitava, não apenas a fazer os milagres que realizava, mas a expressar a vontade de Deus tanto em palavras, quanto em obras.
Jesus disse que “da abundância do coração fala a boca” (Lc.6:45). Só podemos expressar com legitimidade aquilo que está impresso em nossos corações. Se não, tudo não passará de performance barata. O carimbo é a Palavra de Deus, mas a tinta é o Espírito Santo. É a atuação conjunta entre a Palavra e o Espírito que imprimirá em nossa vida as marcas de Cristo, como disse Paulo aos Gálatas (Gl.6:17). Por isso, o mesmo apóstolo que diz “a palavra de Cristo habite em vós abundantemente” (Cl.3:16), também nos ordena a que sejamos cheios do Espírito (Ef.5:18). Não basta ter o relevo de Cristo. Temos que exibir também as Suas cores. Gosto muito daquela passagem que diz que Deus destinou a igreja para que manifestasse Sua multiforme sabedoria (Ef.3:10). No texto original lemos “multicolorida” em vez de “multiforme”. É o Espírito Santo, que uma vez derramado em nossos corações, irradia através de nossas vidas todos os espectros do amor (Rm.5:5).
O alemão Gutenberg tem sido considerado o pai da imprensa. Foi ele quem criou o processo que consistia em cunhar as letras em matrizes de cobre, com um punção de aço com letras gravadas em relevo, gerando uma espécie de molde de letras, que eram finalmente montadas em uma base de chumbo, tintadas e prensadas. Foi com esse processo que Gutenberg produziu a primeira Bíblia, impressa em latim, com uma tiragem de cerca de 300 exemplares. Sua invenção começou a Revolução da Imprensa e é amplamente considerado o evento mais importante do período moderno. Teve um papel fundamental no desenvolvimento da Renascença, Reforma e na Revolução Científica e lançou as bases materiais para a moderna economia baseada no conhecimento e a disseminação da aprendizagem em massa.
Muito antes de Gutemberg, Paulo afirmou que nós, como cristãos, somos “a carta de Cristo”, “escrita, não com tinta, mas com o Espírito do Deus vivo, não em tábuas de pedra, mas nas tábuas de carne do coração” (2 Co.3:3). A Palavra é a prensa, enquanto o Espírito é a tinta que faz de cada um de nós cartas vivas cujo remetente é Deus e os destinatários são todos os homens. A igreja é, por assim dizer, a gráfica de Deus.
Aquilo que em nós é impresso deve circular livremente entre os homens. Nossa vida deve ser lida por todos. Deve expressar o que foi impresso em nossos corações. Revelar ao mundo Aquele com quem temos estado.
Depois de interrogados pelas autoridades, Pedro e João foram expressamente proibidos de ensinar ou mesmo divulgar o nome de Jesus. Porém, sua resposta foi incisiva: “Julgai vós se é justo, diante de Deus, obedecer antes a vós do que a Deus? Pois não podemos deixar de falar do que temos visto e ouvido” (At.4:19-20). Não há como represar o fluxo das águas do Espírito. Sua voz sobrepõe-se a qualquer censura humana. Como disse Paulo: “Cri, por isso falei” (2 Co.4:13).
E à medida que falamos, somos usados para promover a primeira impressão de Cristo na vida das pessoas com quem convivemos. Por isso, sofremos a censura por parte dos inimigos da fé. Paulo conta como sofreu tal censura por parte dos judeus de sua época, os quais, segundo ele, não agradavam a Deus, e eram “contrários a todos os homens”, impedindo-lhe “de falar aos gentios para que sejam salvos” (1 Ts.2:15-16). Apesar de todas as ameaças, Paulo não se intimidou, desde que ouviu da boca do próprio Jesus, que numa revelação lhe disse: “Não temas, mas fala, e não te cales. Pois eu sou contigo, e ninguém lançará mão de ti para te fazer mal, porque tenho muito povo nesta cidade” (At.18:9-10). Nossa missão, portanto, é causar uma primeira impressão, deixando para o Espírito de Deus a incumbência de promover a impressão definitiva. Esta primeira impressão é causada tanto por nossa fala, quanto por nossa postura. Há casos em que a pessoa é ganha sem qualquer palavra (1 Pe.3:1). O que não podemos é desperdiçar a oportunidade da primeira impressão. E isso fazemos quando de alguma maneira, expressamos as profundas impressões deixadas por Cristo em nossa alma.
 
 

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