quinta-feira, 10 de novembro de 2011
SEM IGREJA OU COM IGREJA?
Apesar do IBOPE recentemente ter apresentado uma pesquisa de que a igreja ainda é uma das instituições mais bem cotadas no quesito de confiança social, acredito que haja hoje em dia uma desconfiança crescente em relação a Igrejas Evangélicas e certo ceticismo em relação aos sacerdotes das mesmas.
Porém, quando falo de desconfiança não o faço a partir da mesma base da pesquisa, mas de impressões internas, nascidas de encontros e diálogos religiosos.
Não pretendo que este texto tenha validade científica, apenas reflito.
A população pode dar um crédito positivo, mas parece que cada vez mais os próprios crentes não confiam em suas instituições.
Não há uma desistência da fé, mas há um abandono e aversão às instituições.
Não acredito que a causa do desencanto com a igreja seja teológica. A teologia, como justificativa para o afastamento é usada como uma espécie de racionalização da dor.
A natureza da causa é mais de cunho emocional, fruto de relacionamentos conflituosos, mas como é comum buscar racionalizar as dores como um meio de alívio, teologiza-se.
Evidentemente, este afastamento causado por um alto índice de insatisfação traz consigo sentimentos negativos.
Temos como exemplo midiático o da Carol Celico, esposa do jogador Kaká, que falou sobre seu desligamento da igreja: “Olhando as atitudes dos meus líderes, percebi situações em que a palavra não condizia com a atitude”. (1) E num talk show disse "a igreja de Cristo está em qualquer um (...) hoje minha igreja é minha casa". (2)
Neste exemplo, está implícita uma dor (frustração) e a justificativa teológica que autentica o afastamento não da instituição que causou a dor, mas das instituições.
Não culpo ninguém e seria injusto culpar alguém ferido, pelos seus sentimentos negativos em relação à uma igreja e seus líderes, principalmente aquelas pessoas que abusadas e extorquidas sentiram-imbecilizadas e encontram-se feridas e empobrecidas.
Chamo a atenção para o perigo das generalizações e seus preconceitos.
Segundo Gordon Willard Allport (1954) – em “A natureza do preconceito”, o preconceito existe como resultado das frustrações das pessoas que em determinadas circunstâncias, podem se transformar em raiva e hostilidade.
Portanto, uma pessoa num ambiente pretensamente cristão sendo abusada em sua boa fé, e inibida por esta mesma fé em demonstrar esta raiva e hostilidade, pode na tentativa de não cometer pecado contra o próximo, projetar para a instituição e, para diluir mais ainda a possibilidade do pecado, projetá-las por meio de uma generalização – todas as instituições são com esta.
Desta maneira, cabem estigmas do tipo: “todo pastor é aproveitador e as igrejas são negócios”.
O fato de ter sido abusado, o que é grave, não deve furtar a capacidade de respeitar as individualidades e de conhecer as coisas como realmente são.
Uma classe ou um grupo não fazem um indivíduo. Não podemos esquecer que apesar de existirem aqueles que consideram a igreja como uma instituição falida, semelhante discurso já se fez e faz a respeito do casamento.
Talvez pudéssemos dizer que o modelo existente não comporta mais, mas não necessariamente que a instituição enquanto tal, não deva existir.
Para ilustrar que somos convenientemente seletivos nas generalizações, podemos comparar esta questão com o trânsito automobilístico.
A cada 40 minutos uma pessoa morre num acidente numa rodovia e a cada hora 17 são feridas. (3)
Apesar deste número alarmante não existe uma generalização e nem preconceito contra os motoristas e seus automóveis, do tipo: "todo motorista é perigoso" ou "automóvel não presta".
Isto, talvez, porque em cada família há pelo menos um que dirige não necessariamente habilitado, mas dirige. Obviamente que quando se está implicado na situação a própria pessoa rejeita generalizações: - "existem motoristas e motoristas".
Compreendo que uma adolescente, filha de um pai violento que tenha sido abusada, interprete que os homens não valham nada, mas o fato de compreender não me leva concordar com tal afirmação.
Por outro lado, é verdade, não consigo compreender porque uma pessoa em nome de Deus abusa daqueles que confiaram suas vidas às suas mãos.
Infelizmente muito do que se vê na TV, audível nas rádios e as experiências negativas experimentadas por alguns em algumas igrejas sugestionam a uma boa probabilidade de estigmatizar, isto é, a rotular pastores e suas igrejas.
Mas estes sentimentos negativos, a insatisfação e a frustração apontam uma tendência que, a meu ver, pode se tornar um grande problema.
Quando somos feridos e não temos como exigir justiça tendemos a nos afastar daquilo que nos feriu.
O preconceito, normalmente estereotipado, é uma forma de se estabelecer um tipo de distanciamento ressaltando aquilo que é negativo e predispondo-se a sentir, pensar e comportar-se a partir do negativo.
E mais ainda, influenciar outros na tentativa de preveni-los do possível perigo.
Há uma generalização que paira no ar em se pensar pastores e igrejas dentro de uma categoria ou características negativas do tipo: inútil, desnecessário, interesseiro, mercantilista e de abuso.
Não custa lembrar aos sem igreja, que cada vez mais aumentam em número, de que este tipo de generalização levou à prática de crimes de discriminação étnica, tanto de escravatura como de genocídio, como foi o caso dos africanos, dos índios, dos ciganos ou dos judeus. E sempre com o discurso de se desejar um mundo melhor.
Evidentemente que neste ponto da história a raiva ou hostilidade concretizada em atitudes altamente destrutivas são impensáveis, porém, não impossíveis.
Há que se cuidar.
Ao ler diversas frases e ouvir diversas expressões que rotulam genericamente pastores e igrejas percebo conteúdos que formulam uma discriminação.
O porta-voz do tema coloca-se em uma condição superior. Há sempre um “que” de que aquele que ainda está filiado a uma igreja seria inferior a ele que se livrou das tais.
Assim como o gênero masculino se considerou superior ao feminino e o branco superior ao negro, aqueles que desistiram das igrejas correm o perigo de transmitirem um pensamento de que aqueles ainda participam de igrejas são “fracos e inferiores”.
Não é para menos, já que a história religiosa revela que a cristianização do império ou a imperialização do cristianismo fez com que a fé fosse beligerante e os sem igreja seriam o pior tipo de pessoa, filhos do demônio. Porém, não é preciso inverter os polos.
Quem é vítima de preconceito, de estigmatização deve sempre lembrar que pisotear o outro, considerá-lo inferior é terrível.
Não quero com isto defender os maus, nem acobertar os erros, mas desejo apenas que a Paz reine, a liberdade de pertencer ou não a uma igreja seja fruto da experiência de cada um e não de um estigma, preconceito ou generalização.
A história da fé religiosa é igual a qualquer outro aspecto da história, têm suas feridas e curas, saúde e doença, bons e maus.
O papel de qualquer um ou melhor, de todos, deve ser o de escrever a parte dos bons.
Nem toda igreja é Igreja e nem todo pastor é Pastor, mas isto somente a vivência e convivência podem demonstrar.
Há sim, é sempre bom lembrar que nem todo o sem-igreja é sem-igreja.
Por Eliel Batista
Vi no http://www.elielbatista.com/2011/11/sem-igreja-ou-com-igreja.html
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