quinta-feira, 16 de abril de 2009

James Arminius e a Liberdade Cristã


Good News Magazine

O Sínodo de Dort marcou um momento crítico na história da Cristandade ocidental. O propósito do Sínodo era resolver uma disputa teológica – a graça de Deus estava disponível a todos ou apenas a alguns poucos escolhidos?

Do lado dos eleitos estava João Calvino, um brilhante porém problemático francês que estabeleceria sua fama teológica nas cidades suíças de Basel e Genebra. Do lado da livre graça de Deus estava James Arminius, um pastor holandês de igual brilho que seu rival autoritário porém abençoado com uma disposição mais tolerável. Quando o Sínodo foi organizado, 1618-1619, ambos Calvino e Arminius estavam mortos, mas a controvérsia tinha crescido.

Quatrocentos anos mais tarde, é difícil compreender que uma grande convocação de chefes de estado e líderes sacerdotes e estudiosos seria organizada para resolver uma questão teológica. Você consegue? Esta não era uma reunião para decidir alguma questão urgente envolvendo tratados de paz ou políticas econômicas ou a política de algum regime antigo, mas uma questão teológica! Tal incredulidade confunde a mente da modernidade. Parece distante e irrelevante numa época como a nossa.

Quando menciono o Sínodo de Dort e a controvérsia sobre a teologia arminiana em conversas com amigos, seculares ou cristãos, observo duas reações. A primeira é de confusão, “Você disse o Sínodo de Dork?” A segunda, “Você quer dizer armeniano, não?”

Permitam-me explicar. Quando era adolescente, a Igreja do Nazareno desempenhou um papel significante na minha vida. Foi nessa denominação que primeiro eu completamente compreendi que Cristo morreu por todos. Os nazarenos, que romperam com a Igreja Metodista no início do século 20, eram totalmente comprometidos com as crenças wesleyanas. Os fundadores da Igreja do Nazareno, muitos dos quais são sacerdotes metodistas famosos, viu o Metodismo ser levado pela onda crescente do liberalismo teológico; eles viram não apenas os ensinos de João Wesley minimizados, mas a teologia de James Arminius esquecida. Os nazarenos, socialmente e teologicamente conservadores, permaneceram fiéis a Wesley, mas deveu-se a Arminius sua maior lealdade. O que é compreensível – Wesley era arminiano.

Eu era aluno de uma escola secundária quando primeiramente me encontrei com o Dr. H. Orton Wiley, então presidente do Colégio Pasadena (nazareno). Ele era o mais importante teólogo na Igreja do Nazareno, alguém cuja credibilidade como erudito se estendia até o mais vasto mundo do pensamento teoólogico. Era evidente que o Dr. Wiley era um homem gentil, mas até eu, um mero jovem imaturo, também percebi que ele era uma pessoa de inteligência transcendente. Apesar de meus contatos com ele terem sido limitados, ele me ajudou a entender a importância de James Arminius para a igreja cristã. O outro estudioso nazareno com quem me encontrei foi o Dr. Carl Bangs, que mais tarde lecionou no St. Paul’s School of Theology em Kansas City, um seminário da Igreja Metodista Unida. O Dr. Bangs era considerado uma das principais autoridades sobre Arminius, e escreveu um livro criticamente aclamado sobre ele. Seu grande interesse sobre Arminius causou-me uma duradoura impressão.

Mas como frequentemente acontece quando se é jovem, uma atração ou fascinação por pessoas e suas idéias raramente permanece. Você mantém o pensamento ocupado com ela, mas então você começa a fazer outra coisa. Assim foi com Arminius e eu. O que me leva a um livreto publicado pela Abingdon que eu comprei muitos anos atrás. É uma coleção de palestras sobre a vida de Arminius pronunciadas em um simpósio na Holanda, que se reuniu para celebrar sua vida. Pela maior parte do tempo o livro permaneceu em minha estante. Eu o pegaria em certas ocasiões, leria algumas páginas, e imediatamente o esqueceria. Eu finalmente decidi que era tempo de ou ler o livro ou dá-lo a alguém que o leria. Eu o li, e comecei a ver Arminius de maneiras que antes não tinha apreciado.

Para melhor entender Arminius, entrei no site Google, o notável motor de busca da Internet. Digitei o nome de Arminius. Aproximadamente 12.000 referências apareceram!

James Arminius nasceu em Oudewater, uma pequena cidade perto de Utrecht na Holanda, no ano de 1559. Seu pai morreu quando ele era uma criança. Sua viúva mãe tomaria conta de Arminius, seu irmão e sua irmã, mas as circunstâncias de sua vida eram extremamente difíceis. Felizmente, Arminius caiu sob os cuidados de um homem rico que viu nele grande potencial. Enquanto distante de casa para estudar, uma tragédia atingiu sua família. Sua mãe, irmão e irmã foram massacrados pelos espanhóis, as vítimas inocentes de mais uma guerra continental que destruiu sua cidade natal. Arminius se recuperaria desta terrível desgraça e continuaria seus estudos. Casou-se com a filha de um dos homens mais influentes da Holanda e se tornou ministro em Amsterdã, onde sua pregação era extremamente popular. Treze anos depois ele receberia a oferta de uma cadeira no corpo docente da Universidade de Leiden. Havia uma grande ironia nisto. Leiden era uma fortaleza calvinista. Mas foi aqui que sua fama e notoriedade ascenderia, seus seguidores cresceriam, a controvérsia se intensificaria – e até houve ameaça de guerra civil.

Conhecer Arminius é conhecer a liberdade que celebramos em Jesus Cristo, pois sua teologia é uma teologia de liberação. Ela eleva cada um no mesmo nível. Ela diz que não importa quem você é, você tem uma posição igual aos olhos de Deus. Rei ou plebeu, não importa. Deus ama você da mesma forma. Quando Cristo morreu na cruz, ele morreu por você. A história da redenção é sobre o mundo todo – sobre cada homem, cada mulher, e cada criança; ou como o famoso hino expressa, “Onde o sol, suas sucessivas passagens.”

A idéia de Santo Agostinho de que a graça de Deus é somente para os eleitos, que houve alguns predestinados para salvação antes do tempo começar, capturou a mente e pensamento de Calvino. Era uma doutrina que dividia mãe de pai, irmão de irmã, amigo de amigo. Era uma doutrina que tinha dominado muito do pensamento cristão, e suas consequências foram vastas – policitamente, socialmente, moralmente e teologicamente. Martinho Lutero sacudiu as fundações do mundo cristão, mas Calvino tomaria a idéia de Lutero de que a salvação vem pela fé e não pelas obras, e a transformaria em uma visão estreita que colocaria vizinho contra vizinho – e finalmente queimaria Servetus na estaca.

Neste mundo deprimido, o mundo conforme Calvino o via, um mundo dos eternamente benditos e dos eternamente desgraçados, surgiu Arminius, que disse, mais ou menos, “Só um minuto, Dr. Calvino, acho que você se enganou. Você, por sua teologia, reduziu a morte de nosso Senhor na cruz a um drama dos redimidos por distribuição; você diz à metade do mundo que ele não tem importância, que o inferno é seu único futuro, e não há nada que pode ser feito – nada! Você, Dr. Calvino, tomou Jo 3.16 e o afirmou por seus ensinos como uma ‘perversão do Evangelho’”.

Você consegue imaginar o efeito de tal idéia radical? Que a graça de Deus era para todos, aparecendo em uma época onde havia uma grande divisão entre as pessoas – príncipe e camponês, rico e pobre, os que têm e os que não têm. As consequências de tão dramática doutrina, ensinada por Arminius nas aulas do seminário, pregada dos púlpitos, e proclamada em longos ensaios e jornais teológicos na Holanda, foram imediatas. Um desafio se levantou contra a doutrina da eleição de Calvino. Deixar a idéia da livre graça de Arminius sem resposta poderia abalar as fundações políticas, sociais e religiosas da Europa Ocidental. Era uma heresia e tinham que lidar com ela.

Dessa forma chegamos ao Sínodo de Dort, organizado na cidade holandesa de Dordrecht. Os delegados do Sínodo vieram do outro lado da Europa, onde uma grande preocupação tinha surgido sobre a “heresia” de Arminius e os perigos que ela representava. O Rei Tiago I da Inglaterra – que deu história à Bíblia do Rei Tiago – selecionou os maiores eruditos da Igreja Anglicana para estar presentes no Sínodo, onde eles logo assumiriam um papel principal. Em longas e muitas vezes rancorosas sessões, por aproximadamente dois anos, os delegados ouviram os argumentos pró e contra Calvino e Arminius. No final eles resolveram afirmar a posição de Calvino sobre a eleição e rejeitar a alegação de Arminius da livre graça de Deus. Como resultado dessa decisão, começou uma campanha contra os seguidores de Arminius. Ministros que adotaram as idéias de Arminius perderam seus púlpitos. Aos operários que aceitaram a opinião de Arminius sobre a salvação foram negados que trabalhassem para o estado. Alguns arminianos perderam suas vidas; martirizados porque ousaram crer que Cristo morreu por eles.

Durante esta perseguição, alguns discípulos de Arminius deixaram o Continente e se estabeleceram no município de Lincolnshire, na Inglaterra. Foi aí em 1703 que John Wesley nasceu, na casa de uma paróquia em Epworth. No devido tempo Wesley seria influenciado pela teologia de Arminius.

Ele posteriormente escreveria um famoso ensaio sobre a pergunta, “O que É um Arminiano? Respondida por um Amante da Graça Livre”. Nesse ensaio Wesley escreveu:

“Mas há uma diferença inegável entre os calvinistas e os arminianos… Os calvinistas defendem, primeiro, que Deus absolutamente decretou, desde toda a eternidade, salvar tais e tais pessoas, e ninguém mais; e que Cristo morreu por estas, e ninguém mais. Os arminianos defendem que Deus decretou, desde toda a eternidade, no tocante a tudo que está escrito na Palavra, ‘aquele que crer será salvo: aquele que não crer será condenado’: e, por isso, ‘Cristo morreu por todos’”.

“Os calvinistas defendem, em segundo lugar, que a graça salvadora de Deus é absolutamente irresistível; que ninguém é capaz de resisti-la, mais do que resistir à ação inesperada do relâmpago. Os arminianos defendem que, embora possa haver alguns momentos em que a graça de Deus aja irresistivelmente, todavia, no geral, qualquer um pode resistir, e isso para sua eterna ruína, a graça segundo a qual foi a vontade de Deus que ele devesse ter sido eternamente salvo.”

“Os calvinistas defendem, em terceiro lugar, que um verdadeiro crente em Cristo não pode possivelmente cair da graça. Os arminianos defendem que um verdadeiro crente pode ‘fazer naufrágio da fé e de uma boa consciência’; que ele pode cair, não apenas de modo vil, mas finalmente, de modo a perecer para sempre.”

Wesley ficou preocupado com as injúrias que separavam calvinistas de arminianos, pois elas o dividiam de, entre outros, seu amigo e colega, George Whitefield. Ele instruiu seus seguidores a não falar mal de João Calvino em público (conselho que eu desavergonhadamente tenho ignorado). Não posso deixar de me perguntar, entretanto, se um Wesley contemporâneo adotaria uma visão tão tolerante de alguém cuja mesma teologia, se verdadeira, poderia significar que nem Arminius ou o próprio Wesley estaria qualificado para a graça redentora de Deus? Se eles foram impedidos, que chance tenho eu ou você? Me parece que as opiniões de Arminius sobre a liberdade teológica me ajudou a criar um mundo que aprecia o ideal da igualdade, assim como da liberdade religiosa e política.

Me esforcei aqui para afirmar minhas crenças arminianas, colocar em contexto a grandeza deste homem, o qual muitos poucos membros da Metodista Unida conhecem. (Quando foi a última vez que algum ministro da Metodista Unida que você conhece mencionou o nome de James Arminius?) Arminius tem sido gigante em minha vida e pensamento. Sua influência está presente de formas que eu mal consigo compreender. Quero encorajar você a aprender mais sobre esse simpático homem da Holanda, que ousou crer, contra o pensamento dominante de sua época, que Cristo morreu por todos.

George Mitrovich, membro da Metodista Unida, é presidente do The City Club of San Diego e do The Denver Forum, dois dos principais fóruns públicos da América.

Tradução: Paulo Cesar Antunes

2 comentários:

André Amaral disse...

Oi, obrigado por linkar meu blog.

André Amaral

http://teologiasimples.blogspot.com

Rogério Brilhante Gonçalves disse...

Meu caro e sincero arminiano,

As consideradas duras palavras calvinistas retratam apenas as duras verdades da Palavra de Deus. Você citou que a doutrina calvinista "dividia mãe de pai, irmão de irmã, amigo de amigo". Essa, de fato, é a doutrina de Cristo, veja Mateus 10.34-39.

De forma resumida solicito que você analise a doutrina arminiana sob o ponto de vista de Deus e não do homem. Quando a salvação fica condicionada a uma decisão do homem a soberania de Deus é banida. Quando Cristo morre por toda a humanidade e muitos se perdem, seu sacrifício foi em vão para os que se perderam.
Recomendo tirar o foco de Calvino e olhar para a doutrina do Apóstolo Paulo. Todas as suas cartas demonstram que Deus escolhe seus filhos, a começar pelo próprio Paulo. Ele não buscou a Deus e sim o inverso. Deus agiu nele de forma irresistível. Em Romanos 8.28-39 ele trata de eleição e perseverança dos santos. Em Romanos 9.6-18 ele fala da soberania de Deus na salvação. Em Efésios 2.1-10 ele fala da nossa condição de mortos que, única e exclusivamente, pela ação graciosa de Deus nos dá vida. A fé não é produzida por nós, nos é dada por Deus. Até o arrependimento! (At. 5.31;11.18;2Tm. 2.25).
Deixo-lhe essas poucas palavras para reflexão, no desejo que você chegue, assim como eu, ao entendimento das doutrinas entituladas calvinistas.

Rogério Brilhante
Igreja Batista Emanuel Reformada de Petrolândia-PE