O metrô sacudia nossos corpos de um lado para outro como se programado para aquele ritmo. O barulho das rodas, nos trilhos, obedecia uma métrica quase musical. Vendo as pessoas bailando no vai e vem contínuo, inquietei-me com o silêncio humano.
Ninguém falava, ninguém ria, ninguém conversava. Procurei convencer-me que uma fadiga os entorpecia. Mas seria a desesperança?
Antigamente as filas dos bancos, das repartições públicas, dos guichês para compra de qualquer bilhete, se transformavam em fóruns de cidadania. Repetiam-se frases do tipo: “Por isso é que o Brasil não vai pra frente!”; “Que absurdo!”; “Até quando vamos agüentar calados?”; “Temos que fazer alguma coisa!”.
Em um processo lento, não de repente, como queria o poeta, calou-se o tal murmúrio; as pessoas se calam porque chegam à conclusão que falar não revolve nada - gasta-se energia para protestar e economizar-se é um recurso de sobrevivência. Instintivamente, sabem reservar seus gritos para um tempo quando houver possibilidade de esperança.
O Brasil está se calando. E o silêncio vem da centenária percepção de que o grito da maioria nunca foi ouvido pela minoria rica e poderosa. Essa quietude se transforma em depressão coletiva; o povo do tamborim, da cuíca, que bate samba numa caixa de fósforos, espirituoso e brincalhão, perde, infelizmente, seu lado moleque. Como lutadores de boxe cansados, baixam a guarda.
Enfraquecidas as resistências, reina uma estranha bonança e essa calmaria produz o caos social, que tanto mata. Os miseráveis já haviam se calado, agora a classe média também emudece. No Brasil não existem “panelaços”, palanques onde tribunos eloqüentes ficam roucos; são poucas as passeatas reivindicatórias. Sobram marchas (que mais se parecem carnaval fora de época), “showmícios” com sindicatos distribuindo prêmios através de sorteios. Porém, impõe-se o fatalismo perturbador dos pusilânimes.
Espero que, enquanto permanece quieta, “a brava gente brasileira” recobre sua antiga força criativa, restaure resistências e volte ao ringue pela dignidade nacional. Acredito que meu povo, uma dia, deixará de ser ordeiro e pacífico. Um dia acordaremos que essa paz só pertence aos covardes. Os verdadeiramente vivos não se conformam com a serenidade dos cemitérios; eles têm fome e sede de justiça.
- Deus, devolve-nos a indignação dos metrôs,dos ônibus e das filas, e faze-nos renascer para a esperança.
Soli Deo Gloria.
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