sexta-feira, 2 de maio de 2008

O fermento dos fariseus.

Ricardo Gondim.

Os fariseus também sofrem preconceito. Não devemos fazer generalizações ou discriminar nem quando tratamos do farisaísmo. É verdade que eles se contaminaram com um fermento sutil, que Jesus de Nazaré chamava de hipocrisia, mas não merecem ser execrados inteiramente; os fariseus não eram completamente maus.

Primeiro, é preciso entender o sentido da palavra hipocrisia; no contexto dos fariseus, significa falsidade, dissimulação, mera representação, incoerência. Um hipócrita religioso, então, seria alguém que prega, mas não vive; um santarrão público; um pecador nos bastidores. Mas existe outra possibilidade, que acredito mais próxima do Evangelho. A hipocrisia dos fariseus era, na verdade, inversa. Eles eram bons quando se distanciavam do exercício da religião, mas, péssimos quando se investiam de suas funções oficiais; eram perversos nos conclaves, jóias em casa.

Como Jesus lidou com os fariseus em ambientes distintos, basta observar o comportamento deles para notar a diferença. Em almoços, nas conversas em “off”, os fariseus eram afáveis, curiosos e abertos para conceitos novos – Nicodemus, por exemplo. Mas no instante em que se sentavam para deliberar sobre religião viravam pessoas horrorosas. Jesus não evitava encontrá-los fora dos templos, mas não comparecia às suas reuniões oficiais – não dava! O vovô Anás não devia ser tão ruim, mas Anás, chefe do templo, se revelou um facínora capaz de conspirar a morte de um homem bom.

Se a hipocrisia revelada pelo farisaísmo naquele tempo era o oposto do que se imagina, o mesmo continua a acontecer. Conheço pastores bem legais quando se acompanham dos filhos e dos netos. Já viajei com alguns e testemunho que foram companhias agradabilíssimas. Mais tarde, porém, eles me apavoraram. Reencontrei-os na direção de “plenárias deliberativas” e tremi. Desfigurados pelo título, pelo paletó e a gravata e pela empáfia do cargo, mostraram-se implacáveis, legalistas e maquiavélicos. Não se pareciam em nada com meus antigos colegas de viagem.

A religião adoece porque lida com três forças avassaladoras: poder, dinheiro e fama. E o seu perigo aumenta quando o nome de Deus é reivindicado para autenticar as ações. Facilmente um sacerdote pode usar a Bíblia ou o respaldo da instituição para escudar escolhas nefastas. Que tentação!

Quando tomado por essa falsa onipotência, o religioso derruba quem estiver no meio do caminho; consciente da verdade como revelação divina, elimina quem julgar nocivo; imbuído de missão sagrada de conquistar o mundo, arrasa possíveis inimigos. Nessa trilha, o líder religioso vai se desfigurando, desfigurando, até tornar-se um iníquo.

Paulo advertiu a Timóteo que os “últimos dias” seriam difíceis (2Tm 3.1); previu os sacerdotes com a “forma de piedade, mas negando-lhe o poder”. Disse, inclusive que seriam inescrupulosos a ponto de entrarem “sorrateiramente nas casas para seduzir mulheres incautas”; donos de um perfil tão pernicioso se pareceriam com bandidos comuns (como um pastor pode caber numa lista dessas?).

“Sabe, porém, isto: Nos últimos dias sobrevirão tempos difíceis; pois os homens (leia-se, "os líderes religiosos") serão egoístas, avarentos, jactanciosos, arrogantes, blasfemadores, desobedientes aos pais, ingratos, irreverentes, desafeiçoados, implacáveis, caluniadores, sem domínio de si, cruéis, inimigos do bem, traidores, atrevidos, enfatuados, antes amigos dos prazeres que amigos de Deus”.

O maior desafio de um líder religioso não é só viver o que prega, mas converter sua religião ao que vive em sua vida particular; deixar que a sua humanidade transborde para os espaços eclesiásticos; de colarinho clerical continuar tão humano quando vestia bermuda.

Soli Deo Gloria.

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