terça-feira, 21 de setembro de 2010

0

Da subversão à brincadeira: como se resgata uma casa de oração?




O templo pode se tornar o lugar de seu maior desencontro e a comunhão mais legítima, uma violência inadiável.




Dias antes ele viera a um lugar que há muito não estava lá, aquela ‘Casa de Oração’ esquecida sob camadas de mentiras. Porque são necessárias muitas paredes para se esconder com eficiência uma grande mentira. Um grande templo para uma grande religião.



Os barulhos e os cheiros da procissão desembocando na cidade são familiares, homens e mulheres arrastando ofertas e expectativas. As músicas se revezam no embalo final dos que chegam ao lugar decisivo, à morada do Deus que não regateia seus rigores. E um Deus assim, tão inegociável, sempre cria filhos que aprendem a pechinchar à sombra de suas imperfeições.



Os olhos cansados esbugalham em rostos bronzeados pelo sol de tantos dias, andam-se muitos caminhos para se chegar a um templo. Olhares aflitos se destacam em faces ressecadas, cruzam-se desertos para que o templo cumpra seu papel. Gastam-se corpos, afetos, até a fé. O caminho que leva ao templo exaure forças, é epopéia de cansaços, senda de claudicantes. E toda fadiga termina se tornando um grande negócio.



E os que negociam já estão lá, como garantia de que o enorme esforço será triunfante. São mercadores mediando a grande utopia. Nenhuma fadiga, qualquer distância, incidente que seja pode ser tão imprevisível, tão suficientemente contingencial para assaltar a vitória do crente. O templo não pode ser comprometido com as precariedades do caminho.



O custo de um templo assim é alto, mas ninguém garante ofertas à altura de um Deus terrível sem pagar um preço elevado. A demanda é enorme, mas sempre haverá pombas, cabritos, bois e tudo o mais de que carecer o culto. Tudo para que Deus não seja frustrado pelo triste caminho que separa os humanos da glória.



O culto não para. Ninguém para. Nada pode estancar uma ordem que cumpre tão prodigioso papel: garantir um acerto glorioso com o divino. O templo realiza sua vocação à medida que sublima a vida dos imperfeitos. Tudo funciona lá dentro a despeito de tudo o que não funciona lá fora.



O barulho incessante empolga os guardiães do templo. É muito feliz a sensação de assistir à coreografia ininterrupta dos que chegam com tantas expectativas. E que partem já antecipando o dia em que voltarão. Nada é mais lindo aos olhos do sacerdote que o vai-e-vem inexorável da multitude encantada.



Mas um rito subversivo é urdido à margem do templo. E como todo rito é uma trama. Uma dramatização de anseios. Uma usina de novidades. Alguém costura o inusitado, fabrica uma revolta.



A primeira fabricação de um instrumento ultrasônico, aquele capaz de ultrapassar a barreira do som, foi um chicote. Isto porque o movimento da chicotada é mais veloz que o som por ela produzido. E o que direi agora pode ser a descrição mais profana que já se fez de um homem. Um nazareno reuniu todas as iras que a religião do templo lhe provocou em cada tira de corda costurada. Ele mesmo fez o chicote que interromperia o barulho do ajuntamento em transe. O slasch viria depois da dor. Eis o rito mais subversivo. Nada mais apropriado para acordar gente encantada que o som da idéia chegar depois do estrago já feito.



E foi assim. Um homem enfurecido ziguezagueou pelo pátio chicoteando com poucos critérios os que ainda negociavam. A princípio, imaginou-se serem soldados romanos descontentes pelas comissões. Houve quem afirmasse, enquanto corria, que era um endemoniado. O som do chicote e as mesas viradas dos cambistas fizeram a voz do reclamante se multiplicar em tantas que nem imaginamos quem pudesse ser, até o pátio em pandemônio dar lugar ao silêncio estupefato dos que ali permaneceram. E sozinho, resfolegante, restava com a arma ainda empunhada, Jesus.



O amor assusta ao fazer-se ódio. Desvela-se em tensão, revolta e ruptura. Sombrio e violento, mas amor.



Com câimbras na mão e a voz já rouca, vaticina pela última vez: vocês transformaram este lugar em um covil de ladrões. E pensar que um dia já foi uma Casa de Oração. A família, distante, desconfia de sua sanidade. Os discípulos, sem coragem de se aproximar, lembram do profeta. O zelo por sua casa me consumirá.



Dispersos os mercadores, uma gente, que ninguém vê há tanto tempo por ali, aparece vinda de todos os cantos, e nada os impede agora, são os cegos e os mancos. O chicote, quente e trêmulo, despenca teatral da mão de Jesus, tão lentamente quanto a compaixão que agora o envolve. Um Deus assim, tão improvável, sempre junta os filhos dos quais o templo se esqueceu.



As crianças, que tem no mundo um lugar de imaginação, a continuidade das histórias ouvidas antes de dormir, olham a cena e enxergam o que ninguém vê. Apenas continuam a história preferida. De um Davizinho que derrubava gigantes com uma atiradeira na mão, mas curava a tristeza de reis com harpas e poesia. Agora ele tinha um filho, que expulsa gigantes com um chicote, mas toca os doentes como Davi dedilhava sua harpa.



E começaram a se divertir com a mais nova brincadeira, e viam quem gritava mais alto: Hosana ao Filho de Davi!




Vi no http://elienaijr.wordpress.com/

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

0

O novo livro de Ricardo Gondim




quinta-feira, 9 de setembro de 2010

0

Uma igreja fora dos templos




O jovem Huw Tyler, de 23 anos, ia apressado de metrô para Camden Town, bairro de Londres, na Inglaterra, vestindo a camisa azul do Pentecost Festival e o crachá que o identificava como designer gráfico. Durante dez meses, ele trabalhou voluntariamente num imenso prospecto com o mapa dos acontecimentos pela cidade. E agora estava tudo acontecendo, em apenas um fim de semana. Depois de quase dois anos de planejamento envolvendo mais de duzentas igrejas, a capital britânica presenciou, entre os dias 10 e 12 de maio, mais de 100 eventos com um só objetivo: mostrar que a Igreja de Jesus está viva e é culturalmente relevante. No espírito de Pentecostes, o festival procurou usar todas as linguagens possíveis – música ao vivo, exposição de artes plásticas, danças, competições de esportes radicais, peças teatrais, debates e palestras, além de muita oração e adoração pelas ruas. De show de hip-hop a palestra do teólogo e cientista Alister McGrath, que participou da seqüência de eventos com uma aula na University College London para refutar as teorias ateístas de Richard Dawkins.




“A igreja deixou seus edifícios”, dizia o slogan do festival, continuamente repetido por Andy Frost, de 29 anos. Dirigente da Share Jesus International (SJI), uma entidade paraeclesiástica com cara de agência evangelística, Frost herdou de seu pai, Rob, pastor metodista falecido em novembro do ano passado, o projeto de promover eventos fora dos espaços a que a Igreja Evangélica parece ter ficado confinada na Inglaterra. Quem olha para sua cara de surfista descolado – há seis anos ele esteve no Brasil e surfou no Rio de Janeiro e na Bahia – não imagina de pronto que ele seja crente. “Queremos mudar a percepção que as pessoas têm da Igreja, quebrar os estereótipos e representar Jesus”, enumera. Ele comanda um time em que quase todos são voluntários, de várias profissões, com média de idade abaixo dos 30 anos. A ordem é exercitar a criatividade ao máximo, quebrando resistências tanto das igrejas quando da cultura secular.



Frost bateu nas portas de praticamente todo mundo. E viu a Abadia de Westminster, sede da Igreja Anglicana, dizer sim, para sua surpresa. Eles cederam espaço para uma apresentação teatral. E muitas outras denominações toparam se integrar às ações. Aos oficiais responsáveis pela segurança da cidade, de sete milhões de habitantes, o evangelista levou os planos de eventos em parques, praças e ruas importantes. Outra surpresa: a reação foi a melhor possível, e ele conseguiu quase tudo que pediu. “Em Londres temos festival hindu, festival muçulmano, festival budista; por que não um festival cristão?”, concordou um dos policiais. O rapaz conseguiu também envolver no projeto diversas instituições de ação social, como Compassion e Christian Aid. O dinheiro recolhido nos eventos pagos foi revertido a obras beneficentes. A Bible Society comprou a idéia e participou ativamente, organizando, entre outras atividades, um debate com políticos cristãos.



Oração na praça – Na sacada de um restaurante em frente à Leicester Square, palco de apresentações musicais do evento, Frost e parte de sua equipe receberam, em clima descontraído, vários jornalistas para contar o que ia acontecer. Dias depois, ele não escondia uma ponta de decepção quanto à cobertura. “Há um preconceito contra os cristãos. A mídia gosta de contar histórias ruins sobre a Igreja. Não as boas”, lamenta, lembrando dos muitos trabalhos sociais realizados pelos evangélicos britânicos que costumam ser ignorados pelos meios de comunicação. Uma entrevista sua para a BBC acabou não indo ao ar no jornal noturno. A matéria saiu para dar mais tempo a um caso de homicídio.



A resposta pode ser mesmo deixar os templos e ir para as ruas. Na saída do metrô de Leicester Square, área coalhada de teatros e turistas, o estudante de medicina David Scheepers, de 28 anos, membro de uma comunidade anglicana, distribuía panfletos e convidava o povo a assistir às apresentações de música no palco montado na praça. Andando uma quadra, já era possível ouvir músicas de louvor executadas por vários grupos evangélicos. Amazing grace ecoava enquanto as pessoas sentavam na grama da praça para ouvir, no sábado ensolarado. Os crentes oravam e aconselhavam ali mesmo. De acordo com os relatórios obtidos depois dos eventos, sete em cada dez pessoas abordadas aceitaram receber orações. “Fomos bem acolhidos. Nossa intenção inicial era interceder, mas as pessoas se aproximavam, perguntavam sobre a fé e recebiam ministração”, disse, ofegante, a seminarista batista Vicki Patman, de 30 anos, ao retornar de uma longa caminhada de evangélicos em pontos-chave da cidade.

As expressões de fé foram muitas. David Landrum, que atua oficialmente no Parlamento inglês pela Bible Society, conduziu um grupo de intercessão ao redor dos prédios da Câmara dos Lordes e da Câmara dos Comuns. “A oração pelo Parlamento acontece há cinco anos e desta vez programamos para que acontecesse junto com o Pentecost Festival”, explicou. Em meio aos turistas que miravam com suas câmeras o imponente Big Ben, Landrum pedia a Deus, com seu grupo, um reavivamento na Inglaterra. Parou também junto a um monumento em memória da Sociedade Anti-escravista, fundada em 1787 por William Wilberforce, e dali clamou a Deus por leis justas. Sua preocupação mais imediata era a discussão de uma lei, aprovada alguns dias depois, que permite experiências com embriões híbridos usando DNA humano e animal. Uma tentativa de eliminar o projeto, capitaneada por parlamentares cristãos, foi derrotada por 336 votos contra 176.



Adoração artística – Enquanto alguns se manifestavam por meio da oração, outros o faziam pela arte. A escultora Sue-Jane Mott, 40, foi uma das artistas a expor suas obras na Igreja Metodista Central Hall. O cenário tem história – foi ali, em 1946, logo após a Segunda Guerra Mundial, que aconteceu a primeira reunião da Organização das Nações Unidas. Entre as obras mais marcantes, os criativos e delicados potes de cerâmica que representam as lágrimas dos justos, em referência ao texto de Apocalipse. “Minha arte é parte do que sou e da relação que tenho com Deus. Também é adoração. Algumas vezes me inspiro nas Escrituras; outras na natureza”, explicou Sue. Longe dali, em um pub de Camden Town, o artista gráfico Ajinbayo Akinsiku, o Siku, de 43 anos, britânico de origem nigeriana, ensinava suas técnicas de quadrinhos, que seguem o estilo japonês mangá. Deixando de lado o medo de errar, ele publicou com sucesso a Bíblia mangá, uma versão em quadrinhos para as Escrituras. Siku distribuía autógrafos e incentivava os crentes a criarem livremente sua própria arte.

”Representar é bom, e se for para Deus, é dez vezes melhor”, disse, por sua vez, a atriz iniciante Emma Frank, de 18 anos. Ela participa do musical Luv Esther, uma versão teatral, com roupagem pop, para o livro bíblico de Ester. Ao seu lado, o brasileiro Ricardo Castro, 20, que também participa da peça, mostrava entusiasmo: “A apresentação causa impacto. Falamos na língua do mundo para sermos compreendidos”. O espetáculo, montado pela missão NGM, que também faz as vezes de companhia teatral, teve apresentação vinculada ao Pentecost Festival, com arrecadação destinada ao combate à Aids na África do Sul.

A maratona com os mais de 100 eventos culminou com o encontro do Dia Global de Oração, que teve a maior concentração no pequeno estádio de futebol do Millwall, ao sul da cidade. Cerca de 11 mil pessoas foram para lá, animadas pelo domingo ensolarado. Famílias inteiras curtiram muita música cristã e oraram por motivos diversos, entre palavras de incentivo de vários pastores. O recém-eleito prefeito de Londres, Boris Johnson, apareceu de surpresa e pediu intercessão pela sua administração e pelo combate à violência em Londres. Ao mesmo tempo, um telão mostrava os rostos de adolescentes ingleses mortos em decorrência da ação de gangues, traficantes de drogas e assaltantes.



Em meio à multidão, James Elton, de 24 anos, vestia uma camisa da seleção brasileira. “Presente de um amigo que resolveu ser missionário no Brasil”, explicou. “É muito bom estar aqui com toda essa gente, clamando por todas as nações”, continuou, lembrando que a campanha de intercessão acontecia simultaneamente no mundo inteiro. Cheio de esperança de um novo vigor para a Igreja inglesa, o jovem britânico não titubeou: “A oração tem poder!” É com isso que contam os organizadores do Pentecost Festival. Na sede do SJI, em meio ao time de colaboradores, Frost fazia um balanço dos acontecimentos, já de olho no ano que vem. “Contaremos com o apoio de mil igrejas e vamos fazer muito mais eventos”, antecipa. O objetivo, garante, é manter a Igreja de Cristo atuando fora dos templos. “Precisamos parar de erigir impérios e construir o Reino de Deus”, sentencia.



Treici Schwengber e Valter Gonçalves Jr, de Londres


Vi no http://solomon1.com/a/2009/03/uma-igreja-fora-dos-templos/
0

A saúde do movimento evangélico



Na adolescência, abandonei o catolicismo e fui rebatizado na Igreja Presbiteriana de Fortaleza. Desde então, migrei por várias tendências do protestantismo, que no Brasil assumiu-se como Movimento Evangélico. Fui membro da Convenção Geral das Assembléias de Deus (CGADB). Cooperei com a Associação Evangélica Brasileira (AEVB). Já falei em incontáveis congressos e conferências. Meu código genético religioso, portanto, é bem definido pelo Movimento Evangélico.




Pastoreio uma igreja com diversas comunidades locais espalhadas pelo Brasil. Caminho ao lado de parceiros e parceiras que levam a sério a vocação ministerial.



Reconheço, porém, que vez por outra peso nas tintas ao criticar o Movimento Evangélico. Não o faço como um observador frio e distante. Eu não me condenei ao ostracismo espiritual. Nunca quis tornar-me profeta auto-referenciado, sem interlocutores. Lido com gente; falo para mais de 3 mil pessoas todos os domingos. E, por mais que tente evitar, sempre que escrevo deixo as minhas impressões digitais religiosas.



Ao criticar, entendo que necessito ser cuidadoso. Não posso portar-me como o fariseu que corava de raiva quando se quebrava o til ou a vírgula da lei, mas era insensível para o abuso de princípios éticos que carcomiam a sua própria alma.



Ao criticar o Movimento Evangélico, não posso passar ao largo da iniquidade que condena milhões de brasileiros a viverem abaixo da linha da miséria. Escolado em ambientes puritanos sei como é possível ver-se sugado para o debate moralista. Eu não teria dificuldade de discursar sobre rigor sexual e arrancar bons aplausos dos que veem promiscuidade até nos desenhos animados que divertem crianças nas manhãs de sábado.



Não é difícil agradar os auditórios religiosos. Basta uma pitada de perspicácia: diante de um auditório burguês é suficiente repetir algumas doutrinas ortodoxas e todos se sentem felizes.



Insisto em escrever e falar porque o imperativo cristão não me larga. Não consigo calar diante de temas fundamentais como: justiça, solidariedade, tolerância, honestidade. O Evangelho me constrange. Sinto-me convocado a engajar-me na defesa do indefeso, na inclusão do excluído e na busca de justiça para o injustiçado. Diante desse categórico, nascem perguntas que não posso fugir: Qual a força do sistema de alienar-me? Para que lado ir na encruzilhada da Avenida Conforto com a Rua Responsabilidade?



Acomodação ética não é desvio, mas deformação. Está deformada qualquer instituição, religiosa, política ou educacional, que seja ágil para denunciar o menos importante e lenta para detectar o essencial.



Uma geração periga quando diminuem os profetas (nestes tempos, não se conhece sequer a função de um profeta – secular ou religioso). A camisa de força da mesmice vem sufocando a criatividade. O patrulhamento do conservadorismo conspira contra a liberdade de pensar. Faltam profetas.



Carecemos de homens e mulheres que não tenham medo de denunciar com o dedo em riste: Esta geração está inebriada pela doutrina do sucesso e vai se afogar na ganância e na complacência.



Minha crítica ao Movimento Evangélico começou há alguns anos, quando vi líderes indignados com questões periféricas, mas silentes diante de atrocidades. Raras vozes se levantaram contra evangélicos norte-americanos que abençoaram uma guerra absurda. O Iraque foi invadido e destruído devido a uma mentira (Onde estavam as armas de destruição em massa?). Faz-se silêncio sobre a morte de centenas de milhares.



Noto o constrangimento de alguns conservadores que não gostam de serem considerados do mesmo naipe que Benny Hinn, Kenneth Hagin, Edir Macedo ou Valdemiro Santiago. Mas eles se sentem orgulhosos de confessar a mesma doutrina que Franklin Graham, Pat Robertson, John McArthur, Chuck Colson e Max Lucado. Talvez considerem esses senhores dignos porque repetem a "doutrina verdadeira" e são de um país riquíssimo.



Por mais que seja difícil sentar ao lado de neopentecostais ávidos por lucro, acredito ser exponencialmente pior participar da roda de quem, sob o manto do conservadorismo teológico, sustenta a agenda de direita belicosa dos Estados Unidos. George W. Bush se aposentou mas a sua cartilha ainda continua a valer entre os evangélicos: lutar contra o aborto e contra os homossexuais, mas defender a pena de morte e apoiar a National Rifle Association.





Mas adesismo não destoa dentro do Movimento Evangélico. Quando os militares dominaram a política brasileira, havia um acordo tácito entre pastores e ditadores. Os ditadores deixavam os pastores pregarem e conduzirem campanhas evangelísticas e os pastores faziam vista grossa para a tortura.



Não é possível varrer para debaixo do tapete da piedade que o Movimento Evangélico brasileiro se esmera no irrelevante. Igrejas se multiplicam nas redondezas urbanas, mas não têm agenda contra preconceito racial ou de gênero. Impressionam as estatísticas sobre os avanços dos evangélicos; resta perguntar se alteram a sorte de milhões de crianças que vivem em ruas fétidas e estudam em escolas sucateadas.



Lamentavelmente, enquanto os evangélicos se reúnem em conferências para discutir e defender sua identidade, o Brasil permanece na lista dos mais injustos do planeta.



Mesmo decepcionado e muitas vezes desestimulado, continuo escrevendo, pregando e trabalhando. Sei que uma nova geração se levanta; acredito que milhões de rapazes e moças desejam ser leais ao Evangelho e anseiam por novos ventos.



Também não jogo a toalha porque acredito que se nos calarmos as pedras clamarão.



Soli Deo Gloria




Vi no http://www.ricardogondim.com.br/

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

0

A vida é a arte do encontro



Vinicius de Moraes foi quem disse a frase do título no meio do Samba da Benção, linda canção do poeta e diplomata. Ele ainda completou dizendo: “embora haja tanto desencontro pela vida”. A vida só faz algum sentido por conta de nossos encontros e desencontros.




Quando criança tudo o que se quer é o conforto do colo materno, a segurança do abraço paterno e a alegria dos momentos fraternos descontraídos. Sair correndo para abraçar o pai, a mãe ou mesmo o tio na porta da escolinha é uma celebração. A celebração do encontro. Cedo aprendemos a celebrar esses momentos mágicos e cheios de afetos que são os encontros com os que amamos.



A adolescência chega e já não se quer a presença tão próxima dos pais, agora o encontro é outro, o primeiro amor, a primeira paixão. Ah, como é esperada a hora de ir para escola para ver a garota que faz sentir um frio no estômago, os batimentos cardíacos acelerarem e a boa secar. O primeiro amor é celebrado num mundo que se revela pleno de sentimentos. Mas como há tantos desencontros pela vida, na maioria das vezes aquele primeiro amor se desfaz e o mundo desaba. Mas outros virão.



Amigos, os encontros que duram a vida inteira. Como são raros, mas como são preciosos. O bom amigo não cobra a sua presença, mas parece estar sempre presente. Sabe se ausentar quando necessário e sabe estar presente quando se precisa dele. Mesmo quando se distanciam e ficam anos sem se falarem pessoalmente, quando se vêem os verdadeiros amigos celebram, sem cobranças, e continuam a conversa de onde tinham parado da última vez que se viram. É uma pena que haja distanciamentos, que amigos se afastem, e, às vezes, virem até inimigos.



E quando achamos uma pessoa a quem amamos e que nos ama também e percebemos que queremos estar com aquela pessoa todos os dias, a vida inteira? Que coisa fantástica. Daí a vida é só encontro. Nem sempre dá certo, mas vale à pena tentar.



Em meio a todos os encontros e desencontros, há Um que deseja se encontrar conosco, mas insistimos em pegar rotas outras. Ainda bem que Ele está em todos os caminhos. Bom é ter sensibilidade para perceber no sorriso carinhoso da criança, no olhar embevecido do apaixonado, no abraço afetuoso do pai e no colo sempre disponível da mãe, além de um momento especial com as pessoas que amamos, um encontro com Aquele que nos ama. Deus é amor. Se nossos encontros são celebrações de amor, também são reveladores da sutil presença dEle.



Eu sei, às vezes parece que Ele é quem se afastou de nós. Até o crucificado perguntou o porquê do abandono. Mas são momentos em que é necessário estar só. Acredite, eles são necessários. Bom é saber que chegará o dia em que nosso encontro com Ele será definitivo e não haverá mais desencontros.



Até lá, vamos fazendo nossa vida ter sentido nos aprimorando na arte do encontro.



Márcio Rosa da Silva


Vi no http://marciorosa.wordpress.com/
0

O pão seco de uma religiosidade egoísta



Quando Jesus multiplicou o pão e alimentou uma multidão, ele olhava para além da fome física. Havia uma fome naquela multidão que só seria saciada com um outro tipo de pão. É uma fome que todos nós temos, mas não é apenas do pão que perece, não é apenas de comida, nem uma sede só de bebida. É mais. É como aquela saudade de tudo o que ainda não vi, como cantou Renato Russo. É como uma ânsia pelo transcendente que não se explica, apenas se sente. É como aquele sentimento tão bem poetizado por Agostinho, o Santo: “Fizeste-nos para Ti e inquieto está o nosso coração enquanto não repousar em Ti”.




A questão é: as pessoas querem realmente o pão que sacia essa fome? Ou será que buscam soluções que não passam de um arremedo formado por uma religiosidade medieval? Será que em vez de buscarem o Pão da Vida, querem mesmo é um naco de um pãozinho seco que é oferecido facilmente, mas que não alimenta a alma nem dá sentido a vida, apenas mata a fome por um instante e depois se quer mais.



Em outras palavras, será que as pessoas querem mesmo Jesus e sua mensagem, ou querem um deus que resolva seus problemas e as ajude a se darem bem sem muito esforço?



A parte mais visível, mais midiática, da igreja brasileira conseguiu vender um cristianismo medieval pré-reforma. Naquela época as pessoas pagavam para terem um lugar no céu, para conseguirem o favor divino, acreditavam em relíquias, etc. Pois hoje há uma multidão que lota auditórios disposta a pagar para conseguir um emprego sem muita dificuldade, para passar no concurso sem muito estudo, para ter uma doença curada sem nenhum tratamento. Estão dispostos a pagar o que for necessário para serem considerados filhos preferidos de Deus.



Não querem saber do Deus de amor, mas querem muito saber do deus de milagres, ainda que se tenha que pagar por eles. Mercantilizaram a fé. O produto maior desse comércio diabólico é deus. Não Deus, o Deus de Jesus, o Deus dos Evangelhos, mas um deus, um deusinho caprichoso, que aceita suborno para abençoar seus filhos. O Deus de Jesus não aceita suborno!



Deus não tem filhos preferidos. Deus nos ama a todos igualmente, com a mesma intensidade, com o mesmo amor. Porque vou exigir que Ele dê mais atenção para mim, então? Oração não é convencer a Deus do que é o melhor a fazer. Oração é derramar-se diante de Deus, para ser transformado por Ele, e não para transformá-lo. Oração é uma conversa entre um filho e um Pai, de maneira desinteressada, em que o filho se contenta em simplesmente ter a presença discreta do Pai.



A proposta de vida que Jesus traz não é a de uma religiosidade mágica que livrará as pessoas das agruras a todos impostas. Ele reprova aqueles que o seguem por causa do pão. Fica insatisfeito com isso. Seu discurso é que se alimentem do Pão da Vida que desceu do céu. Que tenham comunhão com ele e com sua mensagem, que tenham o seu caráter, o caráter de Cristo. Isso seria se alimentar do Pão da Vida.



Infelizmente é grande a multidão que, em vez do Pão da Vida, prefere o pão seco de uma religiosidade egoísta, que de cristã só tem o nome.



Márcio Rosa da Silva


Vi no http://marciorosa.wordpress.com/
0

E Deus com isso?




Acho que não há dúvida que “tudo” é permitido por Deus. É fácil conferirmos isso através das notícias sobre a violência urbana, e sobre as mais diversas catástrofes naturais. De fato, não vemos nenhum movimento sobrenatural de Deus impedindo de forma concreta esse ou aquele fato. Sequestros, estupros, terror, morte covarde de crianças, jovens e adultos já nos sobejam nos noticiários.




Outra coisa que podemos afirmar que nem todo mal é mal em si. Sabemos que a tsunami foi um horror (mal) porque no seu trajeto muitos foram vítimas humanas. Uma enchente de um rio que levou centenas de casas e fez muitas vítimas assim ocorreu, não porque a enchente em si é um mal, mas por causa dos vitimados. Da mesma forma os tremores de terra acontecem, não por causa do homem, mas por causa das placas tectônicas. Isso nada tem a ver com o que é bom ou mal, a não ser quando sofremos.



E Deus com isso? Há algumas nuances observáveis nessa argumentação. Deus não deve ser responsável pela catástrofe como mal lançado contra os humanos maus, pois seria injustiça contra os “bons” que sofrerão de graça. Não creio que Deus mate a granel.



A presença do mal como sofrimento pode também ser vista como liberdade humana, logo amor de Deus. Deus “permite” tudo porque nos deixa livres para viver nossas escolhas. Há aqueles que escolhem a facilidade de moradia perto de vulcões pela beleza do lugar, aqueles que foram morar (escolha ou falta dela?) perto do açude ou rio para servir ao patrão entre o curral e a casa grande, aqueles que por um motivo ou outro moram em lugares com frequência de catástrofes, e ainda aqueles que em nome da fé derrubam aviões. E Deus permite? Sim, quem pode afirmar que não? Ele permite e sofre com tudo isso, basta lembrar que ele não agüentou nem ver seu filho sofrendo na cruz (Por que me desamparaste?), – identidade de nossos sofrimentos que, afinal, ele os levou sobre si.



Por outro lado, é claro que não duvido de seu poder, mas duvido que esse poder não seja expresso nas raias do amor. Porque, quem sabe esse todo-poderio não seja apenas mais sofrimento em nome de sua soberana escolha de amar, por isso nos deixar viver nossos dilemas enquanto nos convida a cuidar de nosso planeta?



Josué Oliveira Gomes.

Pastor na Igreja Betesda em Maceió
 
 
Vi no http://teologiaarminiana.blogspot.com/